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Cansado e em movimento, resfolegante, com rasgos nas roupas causados pelos galhos e arbustos daquele lugar, corro com todas as forças que ainda me restam, na tentativa de não ser alcançado. Meus perseguidores são seres cruéis e se conseguirem chegar até mim antes que encontre um lugar seguro, não vou passar dessa noite. Lembrando de quando o avião aterrissou e desembarquei, ainda de manhã – agora era noite escura e sem lua – recordo que eles estavam entre as pessoas do aeroporto, me esperando, me seguindo, provavelmente a mando da mesma pessoa de sempre, se é que dá para dizer que aquilo é uma pessoa.
Faz tempo que estou nessa vida, fugindo de um lugar para outro. Não é tão fácil quanto parece na televisão, mas depois de um tempo você até se acostuma. Desisti do meu país de origem quando percebi que, por causa da corrupção sempre presente e aceita na sociedade, eu seria muito mais facilmente encontrado e morto por lá. Já estive na Europa – como eu disse, estou fugindo faz tempo – e resolvi voltar para a América, pois a única língua que falo além da minha natal, é o inglês. Estou divagando, eu sei, mas isso me ajuda com o cansaço e a dor do corte no ombro. Está escuro e frio, estou suando de tanto correr e apesar de controlar o medo, coisa que aprendi durante tantas fugas, acredito que dessa vez não vou conseguir escapar. Não sei porque escolhi essa cidadezinha entre tantas outras, acho que ela me atraiu no mapa. Olhando esse bosque escuro e denso, com as luzes da cidade não tão distantes, percebo que sonhei com esse lugar várias vezes. Meu destino está em Beacon Hills uma vez que sonhei tanto estar aqui, para vir morrer no local. Minha audição é péssima e minha capacidade de não fazer barulho simplesmente não existe. Tenho pouca idade e sonhos bobos como todo mundo. Minhas habilidades, além de falar duas línguas, são na sua maioria coisa de cdf. Sempre fui bom com estudos, nunca tive alguém na minha vida – é, sou virgem e daí? – e escondo um grande segredo. Talvez dois, apesar de não serem ambos igualmente perigosos.
Tudo aconteceu muito rápido quando, perdido em pensamentos, tentando controlar o medo e vencer o cansaço, me encostei em uma grande árvore desejando que pudesse aguentar mais dez minutos e alcançar a zona urbana, onde a polícia me ajudaria a ficar vivo, pelo menos por mais um tempo. No exato momento em que vi aqueles olhos vermelhos reluzindo por entre as folhas, do outro lado, dois rugidos intensos, altos, quase demoníacos fizeram meu coração gelar, com a certeza de que haviam me alcançado. Outro baque por trás e dessa vez as garras deles cortaram minhas costas do ombro direito até a cintura esquerda e tudo girou ficando mais escuro aos poucos. A última lembrança de minha vida de fugas, seria o vulto imponente e ousado que saltou detrás dos arbustos onde eu vi aqueles olhos. Belos olhos vermelhos de mais um que viera provavelmente também para dar fim à minha vida.
Não sei por quanto tempo fiquei inconsciente e, ao despertar, mantive os olhos fechados, me preparando para o que viria a seguir: O céu? O inferno? Purgatório? – Será que existiam essas coisas e lugares? – Sempre fui descrente quando se trata de religião, mas aprendi que o sobrenatural existe no mundo e é por isso que eu fujo, há vários anos, tentando sempre me manter vivo. Quando completei doze, presenciei uma cena sinistra no cerrado do local onde morava. Aquelas coisas, seja lá o que eram, mataram um inocente diante de mim, não muito longe de onde eu estava parado observando o ato medonho. Me perseguiram e mataram minha família. Não sei como não me alcançaram e eliminaram também, mas eu nunca parei de correr e fugir. Ouço vozes ao longe, sinto cheiros agradáveis, familiares, mas ainda não abro os olhos nem consigo entender o que dizem, parece uma discussão acalorada. Algo me diz que é sobre mim. Temendo que sejam demônios no inferno disputando minha alma condenada, abro os olhos e me vejo em um quarto comum de adolescente: posters nas paredes, miniaturas, um grande guarda roupas todo cheio de coisas nas portas, uma porta de madeira e uma vidraça fechada com os vidros embaçados e a cortina aberta. É bem cedo e estou sem minha camisa, deitado em uma cama de casal muito agradável, sobre lençóis macios com o cheiro intenso de alguém. O mesmo odor vem dos sapatos na beira da cama e nas roupas abandonadas aqui e ali por todo o quarto. Quando me sento, minha mão direita repousa sobre uma peça de roupa largada na cama – uma cueca branca usada, provavelmente do proprietário do quarto e meu salvador – o dono daqueles incríveis olhos vermelhos.
A discussão continua lá embaixo e sem querer descer para enfrentar esse novo desconhecido, permaneço sentado na cama, imóvel, controlando os batimentos acelerados do coração. Me dando conta de que estou sozinho ali, ouço passos e atiro a peça de roupa no chão quando a maçaneta gira e dois garotos entram no quarto trocando um olhar cúmplice que no momento eu não consegui entender o que significava. Coloco bruscamente os pés no chão e o antebraço no colo, para esconder deles o que me aconteceu antes de entrarem, é embaraçoso. Mais embaraçoso ainda foi perceber a figura dos dois ali parados na minha frente – nunca tinha visto dois moleques como eles, com cara de homem e ao mesmo tempo tão jovens, foi a primeira impressão que eu tive.
– Você tá legal? – pergunta o mais velho.
De cabelo preto curto bagunçado, regata cinza, braços fortes, rosto levemente torto pra esquerda, pele clara com uma corzinha de sol, tatuagem de dois círculos pretos no bíceps esquerdo, olhos escuros cuja cor eu não consegui definir na hora, abdome aparentemente definido pela silhueta na regata, pernas fortes e pés grandes no tênis preto, pois eu me forcei a desviar a visão para baixo, evitando ficar olhando para o volume do garoto. Sua voz jovem e preocupada só fez meu coração disparar ainda mais.
– Vai pegar água para ele Liam – disse o mesmo rapaz em tom autoritário e o outro o obedeceu prontamente, saindo em seguida. Fiquei feliz de não precisar encarar o outro também. Eu era bom em controlar meu medo, meu passo na fuga, meu cansaço e até meu dinheiro de viagem, mas nunca fui entendido sobre essas coisas do corpo.
– Você está seguro – ele disse pausadamente, imaginando que eu não entendia e que talvez fosse estrangeiro. – Consegue me entender? Diz alguma coisa!
– Eu estou bem – as palavras finalmente saíram – não se preocupe.
– Você se lembra do que aconteceu? – Ele perguntou sorrindo e percebi que seu rosto bonito fazia covinhas quando sorria. – Porque estava fugindo? A propósito, me chamo Scott. Scott McCall.
Olhei em seus olhos negros. Esse garoto era um lobisomem, eu podia ler isso em seu olhar, mas não queria me matar, o que era bem incomum. Achei que todos os monstros fossem assassinos.
– R. Meu nome é R. Eu não uso sobrenome desde que perdi toda minha família.
Ele abaixou as vistas como se pudesse sentir minha tristeza. Abaixei a cabeça também lembrando o que perdi. Vivendo sempre em fuga, tive poucas oportunidades de lembrar do passado e sofrer pelo que me tiraram.
– Eu sinto muito – ele disse com um largo sorriso aumentando as covinhas – você está seguro aqui R.
Liam me trouxe o copo de água fria com açúcar. Tomei com avidez e só então percebi como estava desidratado. Me lembrei dos cortes nas costas e eles me encararam, provavelmente imaginando porque as feridas sumiram.
Não tinha certeza se Liam também era lobisomem ou se sabia sobre o outro. Ele era mais branco e mais jovem que Scott, seu cabelo mais liso e um pouco mais longo. Tinha grandes olhos azuis e apesar de usar camisa de manga longa sobre uma camiseta branca, seus músculos se destacavam nelas. Seu abdome definido e sua calça escura davam um tom de masculinidade perfeito ao rapaz. Evitei mais uma vez me concentrar onde não deveria e virei os olhos para a janela. Eu devia parecer bem abatido e triste, pois não insistiram, embora a curiosidade de ambos fosse palpável.
– Deita aí – disse Scott com calma, mas senti um tom forte de comando em sua voz – e descansa mais um pouco. Estamos no andar de baixo se precisar, você está seguro. – Senti ainda um calor que aquecia meu coração, como uma forte chama ali dentro, que eu nunca sentira antes e não podia dizer exatamente o que era, mas sei que era algo bom.
Eles saíram do quarto deixando a porta cerrada e falando baixo. Eu estava desnorteado por muitas coisas naquele momento e acabei deitando na cama de novo. Fiquei olhando para o teto feliz, imaginando que alguém no mundo se importava comigo, mesmo que por pouco tempo e só até eles saberem o motivo de minha fuga. Não fugia apenas porque monstros mataram todos que eu conhecia.
Esse era apenas um dos meus segredos sombrios.
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Olhos Místicos
FanfictionPosto diariamente essa história nesse link, não é plágio!! https://www.spiritfanfiction.com/historia/olhos-misticos-18678243 Um jovem com dons misteriosos em fuga pela sua vida, acaba parando em Beacon Hills e sendo salvo por Scott McCall e seu band...