Merecimento

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Passei o resto do dia sumido e sozinho, deixando Elliot com Scott, ajudado pelo trio Emma, Chloe e Manon e ele ia ficar muito ocupado, tendo que cuidar ainda de Isaac e Mani que se entendiam cada vez menos, parecendo dois irmãos briguentos. Me cansei um pouco com tudo que estive fazendo e evitei conversar muito com meu alfa naquela tarde e início de noite, mesmo por telefone e ele achou muito estranho, já que meus assistentes ficaram com ele na zona urbana da pequena cidade onde nasci. Deu bastante trabalho e tive que fazer vários saltos, então quando voltei para o hotel, todos já haviam se recolhido e Mani dormia no tapete aos pés da nossa cama, se recusando a ficar no colchão e a se distanciar de Scott. Meu alfa me esperava cheio de pedidos de explicações, mas eu estava tão cansado que nem consegui falar direito. Disse que conversaríamos quando saísse do banho, mas apaguei de toalha na cama logo depois de me lavar e quando abri os olhos, já era quase de manhã e Scott me prendia em seu abraço, inclusive com a perna sobre mim, como se para não me deixar levantar sem acordá-lo.

Talvez isso funcionasse com qualquer outra pessoa, mas não com o milagreiro aqui. Saltei para o banheiro e ele continuou dormindo. Vesti as roupas cuidadosamente, que havia deixado lá com antecedência e sai do hotel utilizando a luz amarela, entrando em contato com Emma logo depois e acordando a garota muito cedo.

– Eitaaa – ela respondeu toda feliz – caiu da cama é? O gostosão não conseguiu te cansar dessa vez?

– Escuta sua doida – respondi rindo e revirando os olhos embora ela não pudesse ver aquilo – vou te mandar uma mensagem com detalhes do hotel fazenda para onde estou indo, quero que traga tudo para cá, inclusive e principalmente o "gostosão" e meus dois bebês, acha que consegue?

– Organizar tudo é meu superpoder, xá comigo, Gabriel!

Resolvi caminhar – cerca de um quilômetro e meio – até o hotel fazenda, para espairecer, manter o corpo funcionando bem e não me render a ansiedade de ficar lá esperando e conferindo tudo ou dando explicações para as pessoas que já aguardavam no local. Algumas coisas naquela cidade minúscula ainda permaneciam iguais e reavivavam partes esquecidas de minha memória. Uma coisa boa de lugares assim é que tudo demora um pouco para se transformar e infelizmente, a parte natural, o meio ambiente, é a primeira vítima do progresso desenfreado. Tentei não me abater, não podia ficar triste hoje e acabei encontrando um velho sentado na beira da rodovia, ele estava cansado e resfolegante, como se a sede o estivesse castigando. Para a sorte dele, sempre ando com uma garrafinha de água quando decido caminhar e ofereci ao homem, que aceitou com um sorriso de poucos dentes, pele enrugada e meio escurecida, cabelos brancos e roupas comuns bem gastas.

– Obrigado, Gabriel – ele respondeu devolvendo a garrafa pela metade e eu me sentei no chão ao lado dele, tentando lembrar se o conhecia do tempo que morei ali na infância.

– Desculpa, eu não me lembro do senhor – falei sem graça – fui embora muito cedo daqui.

– Sim, eu ainda me lembro. Pobre Nina. Que bom que você sobreviveu, meu menino. Achei que não o veria de novo nessa vida.

– Porque eu tenho a impressão de que o senhor estava me esperando?

– Porque eu estava. Sonhei que passaria por aqui hoje.

– Estou tentando fazer o que minha mãe queria. Proteger o cerrado e o lobo guará.

– Muito nobre da sua parte, meu menino, mas sabe que isso vai ser bem desgastante, não?

– Sim, mas já estou me acostumando a lidar com gente ruim quase o tempo todo.

– Isso me lembra uma história, mas você é um menino ocupado, não deve de ter tempo a perder com isso.

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