Um Bando Sobrenatural

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Passei a manhã toda na cama do Scott, no quarto bagunçado dele, preenchido com seu cheiro indescritível e sem coragem para levantar e pegar do chão a peça de roupa dele que eu havia jogado ali, imaginando que ele possuía audição e olfato sobrenaturais, sabia o que eu tinha aprontado e como me sentia em sua presença. Nunca havia ficado tanto tempo despreocupado em um mesmo lugar, mas algo em Scott e até em Liam me davam certa segurança. Ele havia enfrentado dois lobisomens para me salvar, sendo um deles um perigoso alfa assassino. Queria ir até ele e perguntar, conversar, discutir, mas não conseguia me mover com medo que aquele quarto maravilhoso, cheiroso e seguro desaparecesse e eu me colocasse de novo em fuga descontrolada e sem destino certo. Pouco depois que o relógio marcou meio dia, Liam e outro garoto vieram até o quarto me chamar para almoçar. Não sabiam quem eu era, o que eu era e mesmo assim me tratavam bem. Coisa de família – pensei. Será que eu os estava condenando como fizera com meus pais e irmãos de nascimento?

O outro garoto se chama Corey. Ele é branco, pequeno, tímido, rosto bonito e corpo malhado, sem músculos. Estava usando um casaco azul sobre a camiseta branca e calça preta com duas listras verticais brancas. Eles eram incrivelmente gentis e mediam muito bem as palavras, evitando fazer muitas perguntas e me assustar ainda mais. Não sei se foi pela falta da presença intimidadora e atraente do Scott, mas eu estava mais falante e seguro, a respiração e os batimentos cardíacos controlados.

– Eu não achei a minha mochila – respondi ao chamado para ir almoçar – então estou sem camisa para poder usar à mesa.

– A gente não se importa – disse Corey sorrindo para mim, um sorriso que me fazia sorrir também.

– A mãe do Scott fez o almoço, não sei se ela vai gostar – disse Liam sério. – Toma aqui – ele tirou a própria camisa e me entregou – eu tenho outra lá no carro – falou respondendo a pergunta que imaginou que eu faria, mas o que estava em minha mente no momento era outra coisa.

Vesti a camisa devagar, aproveitando para sentir o cheiro do Liam nela, perfume barato muito agradável misturado com o suor de seu corpo. Ele foi na frente para pegar a outra camisa e eu desci a escada ao lado de Corey.

– O que aconteceu com você? – Ele perguntou com cuidado, cheio de dedos.

– Muita coisa – respondi pensativo – estavam querendo me matar ontem à noite.

– É o Scott nos disse isso. Você pode me falar mais?

Parei na metade da escada e encarei Corey nos olhos. Coloquei a mão direita aberta sobre seu peito, em cima do coração e perguntei para ele:

– Não querendo ser rude, mas porque você se importa? Porque vocês todos se importam?

– Nós protegemos quem não pode se proteger – ele falou. Vi a sinceridade em seus olhos, era difícil mentir para mim nessa situação. Era mais que verdade, aquela frase era o lema dele e seu grupo, sejam eles quem fossem, os amigos do meu salvador.

Sorri sem jeito e continuei descendo as escadas. Ele colocou o braço direito sobre meus ombros em um abraço lateral e sorriu para mim, me acompanhando na descida.

– Relaxa – disse Corey ainda sorrindo – aqui você está seguro.

Aquela casa, aquelas pessoas, tudo estava ficando cada vez mais interessante. Eu sabia agora que Corey não era "humano". Ele não era um lobisomem como Scott e eu não sabia o que Liam era, mas tinha certeza que ele, Corey, podia ficar invisível, talvez um dom natural como o meu, que me permitia entre outras coisas, reconhecer o sobrenatural nos outros.

Nos sentamos à mesa na cozinha da casa do Scott e fiquei conhecendo sua mãe, Melissa, uma senhora branca e magra, enfermeira, de olhar cansado e bondoso, longos cabelos ondulados presos às costas.

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