Olhos Místicos

Cem Vezes

Um grito alto o bastante para rasgar o véu da morte me fez despertar, deitado naquela cama macia, naquele mesmo quarto onde uma vez me senti seguro depois de tanto tempo. Corri até a janela tentando ignorar o berço vazio em um canto e vi uma cena de tirar o fôlego: Zana, Gena, Vivian, Donna, Megan e Lydia, formando um círculo de mãos dadas, gritavam em uníssono, voltando suas vozes para o centro do círculo abaixo, onde Thomas, o ômega "perdido" estava de quatro e tapando os ouvidos, atingido pela poderosa combinação capaz de fender a própria terra. Por um momento, achei que o rapaz estava morto e não intentei ajudar, pois sabia que nosso bando banshee não o atacaria sem razão. O ômega conseguiu erguer a cabeça e gritou de volta e o som que emitiu foi cem vezes mais forte, lançando as mulheres longe, fazendo seus corpos se chocarem contra carros ali parados, postes, árvores e paredes de casas. Lydia foi a única delas que se levantou, dolorida e sangrando pelos olhos, ouvidos, nariz e boca, mal se mantendo de pé enquanto Thomas se erguia sorridente, indo em sua direção de forma triunfal. Peguei minha espada curta ao lado do guarda roupas e tentei não surtar por estar de volta entre os vivos no meio de uma luta mortal.

Saltei ao lado da ruiva e segurei seu cotovelo curando seu corpo ferido de morte.

– Gabriel! – Ela falou e gritou ao mesmo tempo, machucando meus ouvidos.

– Ora, você! – Thomas cruzou os braços sorrindo – que surpresa boa.

Olhei em volta para a destruição na rua da casa dos McCall. Casas semi destruídas, carros amassados, em chamas ou tombados e grandes nacos de asfalto retirados de alguma forma sinistra. Vários corpos caídos de membros do bando e, por algum motivo, nenhum humano comum ou morador das redondezas, como se o lugar tivesse sido evacuado antes do confronto. Apesar de reconhecer alguns que nem deveriam estar entre os feridos – como Theo e Derek – suspirei menos apavorado por não ver meu alfa entre eles, nem meus dois filhos.

– Foge daqui Gabriel – Lydia disse chorosa – ele é muito perigoso. Eu vi muitas mortes hoje, nenhuma certa, mas ele é capaz de matar qualquer um de nós!

– Eu não vou matar o milagreiro! – Thomas disse feliz enquanto eu encarava seu olhar sádico – esse poder delicioso – falou olhando para os próprios braços que emitiam luz amarela – será meu enquanto você for mantido prisioneiro!

Me afastei andando de costas enquanto o rapaz se aproximava e eu lia seus olhos, percebendo que não era apenas um lobisomem ômega diante de nós, aquele era Félix, o irmão de Angus, a entidade aprisionada pelos Nemetons e que se libertara alguns anos no passado. Sem ter para onde fugir e temendo o que ele era capaz de fazer, eu e a banshee alfa acabamos encurralados contra a parede de uma casa vizinha.

– Se afasta deles, agora – falou a voz rugida de Scott atrás de Thomas e quando meu olhar se encontrou com o dele, seus belos olhos azuis se tornaram imediatamente rubros e luminosos.

A forma de Thomas se alterou pouco, ganhando mais musculatura e olhos avermelhados e ele se virou ainda sorrindo para encarar o alfa genuíno.

– Até que enfim nos encontramos, herdeiro de meu irmão e eu poderei matá-lo finalmente através de você!

– Não sei quem é você ou o que quer, mas quero que vá embora agora ou aguente as consequências! – Scott esbravejou confiante.

– Cem vezes alfa! – Bradou Thomas sorrindo – isso é muito poder!

Meu alfa cortou o peito do rapaz no primeiro ataque, mas ele bloqueou os subsequentes. Cada impacto de pulso e punho contra bíceps e antebraço pareciam pesados como uma bola de demolição trabalhando. Lutavam equiparados em velocidade e força, mas percebi que Félix apenas estava se divertindo e temi pela vida de meu parceiro, me preparando para salvá-lo caso fosse necessário. Sentia dentro de mim a força do sol que agora brilhava sobre nós e lá no fundo, o poder da noite doado pelo falecido deus lua. Com uma sequência de socos poderosa nos peitos e no rosto, Scott foi ao chão, mas se levantou para lutar de novo. Várias vezes foi derrubado e eu percebi que o adversário era poderoso demais para ser vencido dessa maneira. Saltei ao lado de meu alfa e me abaixei segurando seu pulso, acelerando sua cura com meu toque.