Os Lobos do Norte

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Depois de arrumado e pronto para viajar, Adalrik Hrolf era um homem bem impressionante. Jovem, de olhar triste, carregava no rosto os traços escandinavos de sua terra natal, com bigode e barba rala e amarelados, cabelo muito loiro liso e curto, olhos profundamente azuis, com vigor renovado no jeito de observar o mundo. Eu podia sentir nele a esperança intensa de viver outra vez. Conversamos por quase uma hora e embora já tivesse lido quase tudo em suas memórias residuais, deixei que me contasse o que o levou a se tornar um ômega e sair pelo mundo sem território e alcateia. O antigo bando do rapaz possuía um jovem que podia fazer chover e isso despertou a cobiça de um figurão que colecionava criaturas sobrenaturais. Muito rico, o homem cujo nome Adalrik não soube dizer e nunca encontrou pessoalmente, empreendeu uma caçada muito intensa, matando todos os betas de sua alcateia e quase matando o próprio alfa. Eles raptaram o jovem com o espírito da água no corpo e deixaram-no achando que estivesse morto. Desgostoso da vida, acabou virando um nômade e nunca mais fez outro beta nem tentou se integrar a outros grupos nem fazer novos amigos.

– Sinto muito por tudo o que teve que passar – falei enquanto arrumávamos as coisas antes do salto para a Groenlândia – mas você não tem que desistir da vida, há tanto para se viver ainda.

– Agradeço por ter me ajudado – ele falou com sotaque muito engraçado – já havia desistido de lutar e esperava que Raissa me desse o que queria.

– Há coisas muito mais importantes para se proteger do que algumas vidas perdidas. Eu preciso muito de um alfa em Tasiusaq e como você é dinamarquês, deve se entender perfeitamente com os ômegas de lá, que perderam seu alfa recentemente.

– Quantos e como eles são? – Perguntou curioso.

– Cinco, todos bem jovens. Brincalhões no início, você pode ter alguma dificuldade para ser aceito.

– Não se preocupe – ele respondeu e pela primeira vez o vi sorrir – eu sei lidar com betas jovens e impetuosos. – Falando desse jeito, parecia que ele era bem velho, mas seu rosto não dizia ter mais que duas décadas e meia de vida.

A chegada foi bem tranquila, a vila estava parada, mas saltamos até perto do Nemeton e ele ficou encantado com a árvore sagrada de que tanto ouviu falar, mas nunca tinha visto de perto. Tocou, experimentou a terra e disse que sentia algo forte ali, como se fosse sua obrigação de algum jeito manter o Nemeton seguro. Percebi a verdade e a felicidade nele em ter um novo objetivo e Jorgen veio de seu acampamento, dessa vez sozinho, para nos encontrar.

– Salve, filho do sol – disse o ancião – seja bem vindo de volta. Viu como nossa árvore cresceu? Estou impressionado.

– Eu vi e estou bastante satisfeito – respondi – ainda não é hora de renovar o ritual, mas eu encontrei uma coisa rara que vai ajudar muito vocês.

– Prazer – falou Adalrik estendendo a mão que Jorgen pegou e apertou com vigor – eu sou um alfa sem bando e juro dar minha vida pela árvore sagrada. Sinto como se tivesse nascido para isso.

– Fico feliz em ouvir essas palavras – Jorgen respondeu sorrindo cordial – mas é bom você ver primeiro o problema que vai enfrentar. Essa molecada sobrenatural daqui não é fácil.

Acompanhados pelo ancião, entramos na vila e fomos até a casa principal disfarçada de humilde residência, onde dois outros anciões moravam e seus filhos foram os primeiros a sair. Em pouco tempo, todos os cinco betas – George, Knut, Axel, Jens e Soren – se reuniram e olhavam com desdém para Adalrik, enquanto trocavam olhares cúmplices e sorriam. Todos os outros foram muito amigáveis e simpáticos. Andamos até uma área aberta com bancos e mesas, onde eram feitas reuniões a céu aberto quando o tempo estava bom – eu, o alfa e os cinco betas – para conversar sobre o que vim fazer ali.

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