⎯Prólogo.

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Milênios atrás, sob a luz tênue de uma lua cheia, duas figuras caminhavam lado a lado em um campo desolado, onde o tempo parecia ter parado. Estavam sob uma enorme montanha, próximas a um templo abandonado enquanto admiravam o brilho singular das estrelas que iluminavam a noite escura.
Áurea era uma jovem mulher que vivia em um vilarejo próximo à Roma. Tinha recebido a benção de Afrodite e ganhado uma beleza inigualável e um olhar que podia tanto curar quanto destruir. Seus cabelos dourados brilhavam como uma coroa de luz e seus olhos azuis poderiam ser comparados a uma safira brilhante. Ao seu lado estava Selene, uma guerreira incansável e protetora. Ela usava um peitoral de prata, tinha olhos tão escuros quanto a noite e cachos negros selvagens. Era uma líder nata, conhecia por todos por sua sagacidade e egoísmo, mas havia uma suavidade em sua aura que só Áurea poderia perceber, algo bom que era despertado apenas por sua alma gêmea.

Elas pararam à beira de um penhasco, onde o vento uivava como um presságio. Lá embaixo, as ondas batiam furiosamente contra as rochas, lembrando-as do poder incontrolável do destino. Áurea observava o horizonte, onde a escuridão parecia se fundir com o céu. Seu coração estava pesado, carregando a previsão de um futuro que ela temia, mas não podia evitar.
Achava aquilo injusto. Haviam recebido uma profecia, carregavam em seus pulsos a marca de Afrodite. Eram almas gêmeas, mas sabiam que o destino não seria gentil com elas. Os deuses não tinham sido gentis ao conectar suas almas. O silêncio sempre tinha sido confortável, dessa vez soava quase ensurdecedor.

—Meu amor... —chamou Áurea, sua voz quase sussurrada pelo vento. —Você acredita em finais felizes?

A pergunta parecia inocente, mas Selene sabia que ela carregava um peso maior do que qualquer outra, sentia aquele peso afundando em seu peito e gerando um nó em sua garganta.
Ela se aproximou, deixando que a brisa fria passasse por ela enquanto fixava os olhos em Áurea.

—Eu acredito em nós —respondeu com um tom carregado de convicção e firmeza. —Se há algo em que o destino não pode interferir, é naquilo que construímos juntas. Nosso amor é uma forma incontrolável... Nem mortais e nem os deuses podem ousar interferir.

Áurea fechou os olhos por um momento, absorvendo as palavras de sua amada. Sentiu o carinho em sua bochecha e mais do que nunca quis acreditar naquilo, queria se agarrar àquela certeza, mas os pesadelos que as assombravam não permitiam que ela tivesse paz.

—E se o preço da nossa união for maior do que podemos pagar? —murmurou, sua voz tingida de uma tristeza capaz de romper as barreiras da própria alma. —E se não conseguimos nos salvar? E se tivermos que abrir mão de tudo... Tenho medo de te perder. Não posso te perder.

Selene não hesitou, sua mão livre encontrou a de Áurea, apertando-a com uma força que transmitia carinho e determinação.

—Você não me perderá, minha princesa —proferiu com uma doçura rara, algo que ela oferecia apenas para sua alma gêmea. —Mesmo que o mundo desabe ao nosso redor, mesmo que deuses e monstros tentem nos separar, eu estarei ao seu lado. A única coisa que poderia nos destruir é o medo, e eu não tenho medo de lutar por nós.

O olhar de Áurea encontrou o de Selene, e por um instante, o mundo ao redor parecia se silenciar. Não havia batalha, não havia profecia ou deuses, apenas as duas, conectadas por um laço que transcendia o tempo e o espaço. A profundidade de seus sentimentos era algo que nem mesmo a eternidade poderia descrever. Foi uma história eternizada e lembrada mesmo quando os séculos se passaram.
A loira sorriu, mas era um sorriso doloroso com uma lágrima que não conseguiu segurar.

—Você é tudo o que eu tenho... —diz, sua fala falhando ligeiramente. —Eu não posso te perder.

Selene balançou a cabeça, um gesto contido, mas cheio de significado.

—Não vai. Eu prometo —assentiu com confiança. —Eu enfrentaria tudo por você. Sacrificaria tudo para garantir que você continue sendo minha. Não importa o que... —as palavras ficaram presas em sua garganta por um instante. —O que aquele Oráculo patético dizia.

Áurea desviou o olhar, fitando a escuridão que se estendia além do penhasco. A profecia cruel que tinham recebido pesava sobre ela como uma sombra implacável: as almas gêmeas poderiam ser conduzidas à ruína ou à ascensão por um ser de olhos dourados, que roubaria suas almas e a esconderia em um sofrimento profundo. A perspectiva do destino, em sua forma enigmática e ameaçadora, pairava sobre elas, e Áurea sentia o peso das palavras proféticas como uma carga insuportável. O futuro, com suas promessas incertas e seus perigos iminentes, parecia aguardar pacientemente, prestes a revelar-se em toda sua complexidade e crueldade.
Não sabiam o que aquilo significaria, só que não era nada bom. Muitas profecias diziam sobre ruínas e ascensão, e a maioria sempre terminava em lágrimas, sangue e finais devastadores. Podia contar nos dedos os contos de amor que tinham um final genuinamente feliz.
Elas ficaram em silêncio por alguns instantes, apenas sentindo a presença uma da outra. O vento continuava a uivar, e a lua, testemunha silenciosa do amor delas, derramava sua luz prateada sobre o penhasco, como se tentasse proteger aquele momento de qualquer escuridão que se aproximasse.

—Eu faria qualquer coisa para te proteger, Áurea —ela quebrou o silêncio. —Mesmo se isso significasse abrir mão de mim mesma. Porque, no fim, você é tudo o que importa.

Selene encostou sua testa sobre a de Áurea, fechando os olhos e suspirando. Aquela situação era uma tortura, era doloroso demais para que conseguissem suportar.

—Eu lutaria contra qualquer um que tentasse te levar de mim... Sejam deuses, mortais ou monstros. Moveria céus e terra por você, Selene.

As duas se olharam mais uma vez, e sem que precisassem dizer mais nada, entenderam tudo o que estava em jogo. Sabiam que a jornada seria longa e dolorosa, mas naquele momento, ali, sob a lua cheia, elas sabiam que nada poderia quebrar o que tinham. Mesmo que o destino as obrigasse a enfrentar o impensável.

Selene segurou o queixo de Áurea entre os dedos e aproximou seu rosto, pressionando seus lábios gentilmente contra os da sua alma gêmea. O beijo era cheio de paixão e devoção, tinha uma pitada de desespero, não sabiam se aquele seria o último.
E quando Áurea se afastou para recobrar o fôlego, ela podia jurar que os olhos de Selene estavam dourados contra o reflexo das estrelas.

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