Acho que deveria ser uma dançarina, mas aquilo se parecia mais com um astronauta sem cabeça. O bolo de aniversário que minha mãe fazia era um dos piores visualmente, mas tinha que admitir que o gosto era surreal. Mia o recheava com morangos frescos e um pouco de doce de leite. Para completar, o cobria com calda de chocolate. O aroma do cacau perambulava saltitando pela casa. Sem contar que em ocasiões especiais – e por algum motivo Cecília fazer vinte e um anos estava sendo tratado como a Terceira Guerra Mundial – ainda ganhávamos uma bola de sorvete ao lado do bolo. Era fácil se sentir no céu daquele jeito.
Eu estava com os braços cruzados em cima da mesa, com a cabeça apoiada sobre eles. Gustavo estava do mesmo jeito. Na verdade os dois estavam babando no astronauta marrom que ganhava os toques finais. Meu irmão esticou um dedo, ameaçando provar um pouco da calda de chocolate ainda quente, mas Mia o acertou com uma colher de pau.
– Quantas vezes eu vou ter que te mandar esperar? – perguntou ela.
– Eu sou criança, não sei esperar! – falou.
A minha mãe possuía grandes habilidades de expressar-se com faces que resumiam o que ela queria dizer. Era como ter a Regina George de Meninas Malvadas dentro da minha própria casa.
– Você só é criança quando lhe convém, não é mesmo? Em todas as outras você já é crescido o suficiente.
Gustavo suspirou.
– Chata.
Mia apontou a colher de pau outra vez. Meu irmão não pensou duas vezes e saiu correndo.
Greg se mexeu na poltrona da sala. Ele estava assistindo aqueles jornais péssimos de começo da tarde. Acho que o quatro dedos e minha mãe haviam chegado a algum acordo, pois eles estavam conversando normalmente. Na verdade Mia não se importava em me dar um tapa na cara e depois agir normalmente comigo. Tinha sido só um acontecimento merecido que já havia ficado no passado, segundo ela. Greg tinha mais facilidade em se acostumar com esse tipo de coisa. Eu achava ridículo, mas nada podia fazer.
– Onde está Cecília? – perguntei.
– Foi procurar emprego mais uma vez. – falou a doceira. – Acabei! – gritou, apontando para o bolo.
O bebê assustou-se e começou a chorar.
– Tente ser menos... Explosiva. – avisei.
Peguei Nathan no colo e o embalei por algum tempo enquanto observava uma grande mesa montada entre a sala e a cozinha. Alguns brigadeiros haviam sido espalhados por ali, ocupando espaço junto com uns castelos feitos de isopor. Eu ainda não acreditava que a minha mãe havia deixado de trabalhar para construir edificações de mentira para alguém que estava completando vinte e um anos. Quer dizer, se quando eu chegasse a essa idade me dessem uma passagem sem volta para qualquer lugar eu já estaria muito agradecida. Quem Mia pensava que Cecília era? Algum tipo de fada ou princesa do castelo?
– Ai meu Deus! – gritou ela mais uma vez.
Minha expressão era de raiva. Acho que ela não se importava mesmo para o bebê que tentava dormir em meu colo.
– A vela, Sophia, a vela! – falou ela mais baixo. – Não temos nenhuma vela!
Encarei-a do tipo 'você-está-mesmo-falando-sério?'
– E o que você quer que eu faça? – perguntei, não esperando nenhuma resposta em troca.
Minha mãe pensou, até que voltou a gritar. Movendo-se ligeiramente pela sala, apontou para Greg.
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O Menino debaixo da minha cama
Teen FictionSophia é uma garota de dezesseis anos comum, diferentemente de seus problemas. Sua irmã está grávida do namorado motoqueiro, o bebê que a sua mãe teve durante o segundo casamento a faz acordar todas as noites, e o irmão caçula... Bem, ele é o caçula...