Capítulo 57

3.2K 486 36
                                    


Ela abriu os olhos aos poucos. Eu peguei em sua mão esquerda enquanto sorria para ela. Preferi fazer aquilo sozinha, poupando meus irmãos de presenciarem aquele momento doloroso. O seu olhar percorreu o quarto todo, e aposto que a sua mente fazia a tradicional pergunta: 'Onde estou?'. Confusa e sem respostas, ela fitou-me, na esperança de que eu explicasse tudo. Naquela tarde, Cecília voltava a enxergar a vida.

– So... Sophia? – ela falou devagar e com fraqueza.

– Eu estou aqui, Ceci.

Não parei de sorrir um segundo.

Do lado de fora, Sam esperava enquanto tomava conta de Gustavo. Ben estava sendo um ótimo amigo. Ele havia levado Nathan para a sua casa, aonde – com a ajuda da mãe, é claro – daria os cuidados que ele merecia. O homem rico queria ter entrado comigo, mas eu avisei que a ex-grávida poderia entender tudo do jeito errado e culpá-lo. Não era a hora certa para ele fazer aquilo. Ainda tinha a pior parte por vir, e era horrível ter que caminhar a passos de bebê. Já Gus, ainda estranho, disse que era a minha missão avisar o que havia acontecido. 'Você é a chefe da família agora', foi o que ele disse.

– A minha boca está seca... – murmurou a minha irmã.

Rapidamente alcancei para ela um copo que continha um desconhecido líquido amarelo que repousava ao lado da cama. Com o auxílio do canudo dobrável, ela tomou um gole.

– O que aconteceu? – a sua voz a fazia parecer drogada.

Tudo bem, era a hora. Ainda sem dormir e comer (o meu estômago estava sustentando-se apenas com os copos de café – quer dizer, aqueles que ele não havia rejeitado), pensei que não teria carga emocional para mais aquele momento. Quis desistir, falando que os médicos eram os melhores para darem a notícia para a minha irmã. Conhecendo-a, eu poderia imaginar exatamente como aquela loira em minha frente reagiria. Quando avisei para os rapazes de que não conseguiria fazer aquilo, o meu irmão falou 'Lembre-se do sonho dela'. E aí foi quando encontrei mais um empecilho. A dança. Quer dizer, como Cecília iria exercer os seus perfeitos e sincronizados passos rítmicos? Apenas uma resposta: Não iria. Daí imaginei-me deitada em um leito de hospital, sem movimento nas pernas e com um sonho destruído. De quem eu gostaria de receber as piores notícias de minha vida: De um médico desconhecido que não teria o mesmo cuidado por fazer isso frequentemente ou de minha irmã que podia me entender? Então lá fui eu, decidida a aguentar mais um pouco.

O Titanic já havia afundado. Os botes salva-vidas já haviam partido. E eu era apenas uma Rose jogada ao mar. Até mesmo sem uma porta de madeira para subir em cima, o que protegeria-me da água gelada que me levaria até a morte. Nem um apito eu poderia conseguir para pedir alguma ajuda.

– Até onde você se lembra? – perguntei.

A garota fez um pequeno esforço, tentando recordar-se.

– Eu deixei a casa de Marga. Já estava escuro, eu não estava enxergando muito bem. E aí eu... Saí... Não lembro. Não sei o que aconteceu depois.

Olhei-a com cuidado, desfazendo o sorriso em meu rosto. Estava séria agora.

– Aconteceu um acidente, Cecília.

Ela tossiu uma única vez.

– A... Acidente? – a minha irmã ainda gaguejava, tendo dificuldade para pronunciar todas as palavras.

O Menino debaixo da minha camaOnde histórias criam vida. Descubra agora