Corri até o corpo ensanguentado. Abaixei-me, ficando do lado da mulher que costumava ser a minha mãe. Olhei para Greg, que dirigiu-se até a cozinha. Ele abriu a torneira e lavou as suas mãos. Depois, foi até o seu armário de bebidas e escolheu a mais forte. Mia tentou falar alguma coisa.
– Fique quieta. – mandei.
Eu não deveria fazer aquilo, mas era a minha obrigação como filha. Passei os dedos levemente em seu rosto, e ela reclamou de dor. Dirigi-me até a cozinha também, onde peguei alguns panos. Passei um pouco de água em todos. Agarrei um balde e voltei até a mulher. Limpei com cuidado o seu rosto machucado. O seu peito também tinha um pouco de sangue.
– Como você ficou sabendo? – perguntei, ainda olhando para os ferimentos.
– Passei no bar assim que cheguei à cidade. Os caras me contaram tudo que aconteceu, a vizinhança toda ficou sabendo... – ele falava com pressa, entre um gole e outro. – Desculpe, eu não pensei. Mas ela mereceu... Certo?
Passando o pano molhado ao redor dos olhos de Mia, fitei-a com cuidado. Não respondi o meu padrasto, apenas fiquei olhando para ela.
– Sophia, desculpa, eu... – dessa vez quem pediu perdão foi Ben, que apareceu na porta.
Falando um palavrão, o garoto aproximou-se de mim.
– O que aconteceu? – perguntou.
O pano molhado em minhas mãos já estava todo sujo, o que obrigou-me a pegar outro.
– Finalmente ela está pagando o preço por seus erros.
Não olhei para o garoto em minha frente, apenas torci o novo pedaço de tecido, retirando o excesso de água com auxílio do balde. Finta colocou a sua mão sobre a minha, que estava sobre o peito da mulher. Acho que a loira até reclamou um pouco, mas ela estava desconfigurada demais para eu ter certeza. Depois de um curto espaço de tempo, puxei a minha mão para longe dali, ignorando o garoto.
Pela primeira vez na vida, eu quis ser a minha mãe. Por que ninguém me espancava de uma vez e não acabava com tudo aquilo em segundos?
♦
A mulher gorda demorou anos para atravessar a rua, mas enfim bateu na porta da casa roxa. Quando a abri, fui simplesmente ignorada e quase atropelada (teria sido de verdade se ela se movesse mais rápido).
– Amiga, o que fizeram com você? – perguntou Marga toda desesperada.
– Desista, ela não vai conseguir falar. – eu avisei.
A boca de Mia estava inchada demais. O gelo que ela segurava parecia ser inútil. A nossa vizinha sentou-se no sofá, ao lado da mulher rígida que já estava limpa e vestida.
Puxei uma das cadeiras da cozinha – não havia mais mesa naquela casa – e sentei ao lado de Greg, que continuava bebendo.
– Liguei para Sam, ele está vindo.
O quatro dedos largou a garrafa no chão.
– E quem é esse? – perguntou.
– O futuro namorado da minha irmã. – avisei. – O que mais você não sabe?
Ele pensou um pouco, passando a mão nos cabelos repletos de nós.
– Sei o que ela fez com aquele roqueiro desgraçado, sei que Cecília foi atropelada...
– E está em uma cadeira de rodas. – concluí.
As mãos do homem ao meu lado juntaram-se, e ele apertou com força os dedos.
– Então não tenho dúvidas de que essa daí mereceu uma surra.
Olhei para a figura que não conseguia se mover. Mia estava estática. Pela porta, a minha irmã surgiu, empurrada pelo homem rico. Ela olhou-me, sabendo que estávamos com mais um grande problema nas mãos.
– Como ela está? – quis saber.
– Viva. – falei.
– O que nós faremos? – ela sussurrou perto de mim.
Eu estava olhando para o nada, pensando no destino.
– Esperamos a nossa morte.
A mulher gorda segurou o gelo na boca de Mia.
– Amiga, você quer que eu chame a polícia? – ela perguntou.
A vizinha nos olhou como se fôssemos um bando de marginais. Eu tentaria avisar que a ex-general não conseguia falar, mas já tinha o feito, e o problema não era meu se ela conseguia ser burra demais para entender.
– Não... – uma voz surgiu.
Mia havia falado, para a minha surpresa. Foi o bastante para que eu levantasse da cadeira, nunca parando de encará-la. Segurei a respiração, temendo o que ela diria.
– Eles terão o que merecem na hora certa. – falou com sua voz cansada.
♦
Larguei o bebê no sofá da mansão e Gustavo correu para jogar um pouco de Wii. Olhei para Nathan.
– Torça para que nada de mal nos aconteça, bebê.
Ele estava quieto, encarando-me.
– Onde está o seu dinossauro? – perguntei, mesmo sabendo que não ouviria uma resposta.
Em seu cesto, Nathan não teria como sair dali. Então deixei-o por um segundo, voltando para o lado de fora. Antes de descer as escadas da frente – que me levariam até o carro (onde provavelmente estava o brinquedo) -, enxerguei Cecília e Sam. O homem estava quase ajoelhado no chão, do lado da porta aberta do passageiro. A jovem loira, por sua vez, estava muito ocupada, beijando-o.
Como os meus lábios eram os únicos vagos aparentemente, aproveitei para sorrir.
♦
Mais dois dias se passaram. Greg estava dormindo em um hotel, mas quando eu desci as escadas da casa de Sam, o encontrei na sala, onde conversava com minha irmã e o dono do lugar. 'Então estamos decididos', o quatro dedos falou. Cecília balançou a cabeça, sorrindo para o ricaço.
– Sophia, venha cá! – gritou meu padrasto.
Distribuí um leve sorriso ao deixar as escadas. A campainha do casarão tocou. Como era o dia de folga de Maiá, ofereci-me para atender antes de juntar-me aos adultos. Percorri o hall imenso do casarão e abri a porta. Dois policiais estavam parados, olhando para mim.
– Senhorita Cecília? – perguntou.
– Não, sou a Sophia. Mas...
– Ótimo. – ele interrompeu-me. – Na verdade é você quem estamos procurando.
Dei uma leve risada para os oficiais, não entendendo a situação. Por que diabos eles precisavam de mim?
– Isso é uma daquelas brincadeiras, certo? – eu estava rindo.
– Você e o seu irmão terão de nos acompanhar. – falou o segundo sujeito.
Eles moveram-se da minha frente, desobstruindo a minha visão. Agora, podendo enxergar a entrada da mansão, reparei na viatura de polícia com luzes ligadas que estava estacionada. Do lado de dentro, uma pessoa com óculos escuros observava a casa em que estávamos abrigados.
A mulher desfigurada encontrou o meu olhar.
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O Menino debaixo da minha cama
Roman pour AdolescentsSophia é uma garota de dezesseis anos comum, diferentemente de seus problemas. Sua irmã está grávida do namorado motoqueiro, o bebê que a sua mãe teve durante o segundo casamento a faz acordar todas as noites, e o irmão caçula... Bem, ele é o caçula...