Cecília estava dormindo. Eu faria o mesmo, pois a chuva estava acolhedora. Porém, a minha mente perdia-se em pensamentos sobre o futuro, impedindo-me de fechar os olhos. A trilha sonora do quarto branco era o som dos aparelhos que cercavam a minha irmã somados ao barulho de gota por gota que caia de um frasco de plástico para serem levadas até o braço da paciente por meio de canos finos. As luzes do quarto estavam apagadas, e a claridade que vinha da janela – levemente obstruída por persianas – encarregava-se de não nos deixar no escuro. Os relâmpagos e trovões continuavam.
A porta do quarto abriu-se devagar. A figura de meu irmão apareceu. Com a mão direita, ele chamou-me. Levantei do sofá devagar, olhando para Cecília. Rumei até a entrada, abaixando-me (não que eu precisasse tanto, a minha falta de altura já deixava-me quase igual ao meu irmão) para ouvir o que ele tinha a dizer.
– Ele está aqui. – sussurrou.
Assenti com a cabeça e saí do quarto, fechando a porta atrás de mim. Dirigi-me até um balcão que havia quase na frente do quarto onde a garota loira estava e pedi delicadamente para que ela ficasse de olho em minha irmã. Acho que todos já sabiam que eu era a garota-neurótica-que-gritou-na-recepção, então qualquer um fazia o que eu pedia, com medo que gritasse novamente. A mulher prontificou-se em não desgrudar os olhos, eu a agradeci com um sorriso forçado.
Peguei na mão de Gustavo e percorremos o longo corredor, chegando até a recepção. A grande entrada do hospital era feita de vidro, e o barulho da chuva – que já estava mais forte – ecoava por todo o lugar. Era possível enxergar a rua, onde algumas pessoas corriam com guarda-chuvas.
Aproximamo-nos do garoto que sorria com um bebê no colo.
– Posso adotá-lo? – perguntou.
– Sem chances. Ele já é meu.
– Ah, então adotaremos juntos.
Finta riu e passou-me Nathan. Ele estava mais cheiroso do que nunca, e pelo volume por debaixo das suas roupas eu podia notar as fraldas limpas que ganhara. Ben estava com uma bolsa de bebê de alça grande pendurada em seu ombro. Na outra, a mala que eu havia levado até a casa de Jonas e mais uma sacola. Perguntei-me como ele havia conseguido tudo aquilo. Os dois haviam finalmente se encontrado?
– Como você...
Ele não deixou-me terminar.
– Não pense que eu não conheço o seu jeito quase-secreto de entrar na casa roxa.
– Ai meu Deus, você falou com Mia? – perguntei surpresa.
Ele negou.
– Esperei que ela saísse. Escalei a árvore e entrei em seu quarto. Pensei que teria que arrumar todas as malas, mas já as encontrei prontas em cima da sua cama. Inclusive a sua mochila.
Ben a retirou das costas, deixando-a no chão ao lado do resto.
– Também tem algumas coisas suas na sacola, campeão.
Finta passou a mão pelos cabelos de Gustavo, desarrumando-os. Todos gostavam de fazer aquilo.
– Eu não sei como posso te agradecer.
O garoto fez uma cara de quem estava a pensar.
– Eu poderia te convidar para comermos uma pizza essa noite. Sabe, é o último dia do ano. Mas acho que você anda um pouco ocupada.
– Realmente...
– Você vai ficar bem? – perguntou.
– Terei que ficar.
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O Menino debaixo da minha cama
Teen FictionSophia é uma garota de dezesseis anos comum, diferentemente de seus problemas. Sua irmã está grávida do namorado motoqueiro, o bebê que a sua mãe teve durante o segundo casamento a faz acordar todas as noites, e o irmão caçula... Bem, ele é o caçula...