Capítulo 84

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O fato é que eu não tinha um diário. Não mesmo. Sempre achei que isso fosse pré-adolescente demais para mim. E eu, com todas as certezas do mundo, já estava crescida demais para ficar completando folhas brancas com os acontecimentos de meus dias. Até porque, ultimamente, eles haviam voltado para a mesmice.

– Diga-me onde está o diário. – pediu.

– Diga-me tudo sobre a minha mãe. – também pedi.

A sua cara foi como se quisesse dizer 'haha-não-brinque-...-você-está-falando-sério-?-quer-mesmo-saber-?'. E eu queria.

O meu ex-pai desceu até a metade da escada. Os seus braços apoiaram-se no corrimão (ah, Mia já havia o consertado), e então ele olhou em meus olhos.

– E se eu não quiser falar nada?

Precisei tomar outra atitude. Quis parecer corajosa, mas na verdade foi apenas um pretexto para que eu me afastasse um pouco mais dele, que havia chego perto demais. Para isso, sentei no sofá, como se estivesse despreocupada com a arma abaixada em suas mãos.

– Temos a noite toda. – falei enquanto sentava. Depois, arqueei os ombros e fitei-o. – Ou então você pode me matar. Boa sorte depois, papai.

– Você fica patética tentando parecer corajosa. Sei que você está morrendo de medo por dentro. Como atriz você não se sairia muito bem.

Prendi a respiração.

– E, ah, Sophia. – havia mais. – Você acha mesmo que depois de eu ter chego até aqui, o meu maior problema seria encontrar o seu diário? Ninguém sabe disso tudo que acabei de falar. Quem sabia, já morreu. Posso voltar para casa, visitar a sua querida irmãzinha, e ela não suspeitará de nada. Será fácil pedir para ver as suas coisas, fingindo certa tristeza sobre a sua morte. Encontrarei o que quero. – ele deixou claro. – Você nunca ouviu falar que os caras do mal sempre são mais rápidos que a polícia? Eles levarão anos para abrir o seu diário.

Os meus punhos cerrados empurravam o tecido do sofá. Eu estava mais nervosa do que podia. Arrisquei olhar para trás mais uma vez (eu ainda estava de costas para ele), e o que enxerguei foi a arma apontada para mim. Esta foi engatilhada. A morte bateu na minha porta.


– Oh, Daniel, querido. Sempre tão convencido. Pff.

Aquela voz surgiu abruptamente no meio da escuridão. Eu a reconhecia perfeitamente, e não fazia a mínima ideia de que aquela mulher estava ali.

– De que adianta toda essa sua frieza quando apontam um trinta e oito para os seus miolos? – perguntou Mia.

A minha ex-mãe estava apontando uma segunda arma para o meu ex-pai. O seu corpo esbelto apareceu no alto das escadas. Ela mandou que o homem desengatilhasse o seu revólver.

– Você sempre surgindo do nada, Miazinha. – respondeu ele, pouco surpreso. – Quanto tempo que não te vejo. Por que não foi me visitar nenhum diazinho?

– Não me enrole, imbecil. – ordenou. – Conte para a garota, ela quer saber.

Daniel gargalhou ironicamente.

– Não vou seguir suas imposições, sinto muito.

– Então conto eu.

O Menino debaixo da minha camaOnde histórias criam vida. Descubra agora