Capítulo 40

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Eu dei uma olhada rápida. Não quis parecer uma observadora que estava invadindo a privacidade alheia, o que era exatamente o que eu estava fazendo.

Nenhum movimento, nenhum sinal, nenhuma luz acesa que se apagasse ou o contrário. A casa do meu vizinho desaparecido estava mais calma do que minha irmã ao tentar bordar algo. Era de uma paz absolutamente incrível.

Eu poderia ir até lá. Poderia mesmo, nada me impedia. Eu já havia ido uma vez e tinha sido convidada para um retorno. Não que o convite valesse depois da noite dos beijos, mas eu poderia tentar. Era tudo sobre isso mesmo.

Abri a janela pela qual eu espiava e desci a árvore cansada de mim. Pulei no fim, atingindo a grama mais verde do que nunca. A casa ao lado era feita de tijolos, diferente da nossa. Não havia tinta ou cor específica. Eram só tijolos, o que passava uma certa seriedade desafiadora. Também não havia campainha – quem naqueles tempos ainda não tinha uma? – e então eu apenas bati na porta. Quase apliquei o conhecido 'Noc-Noc-Noc', mas sabendo que aquilo estava tão deserto quanto o lugar que minha melhor amiga se encontrava (sem os índios, claro), apliquei mais uns dois 'Nocs'.

Você sabe quando está sendo observada pelo olho mágico. Não somente pelos passos escutados do outro lado da porta, mas é inevitável não perceber que tem alguém te analisando. Percebi que o faziam, e este foi o sinal para que minhas bochechas ficassem vermelhas. E se fosse Ben olhando-me? E se ele não quisesse abrir a porta? Bom, então eu gritaria com ele do lado de fora mesmo. E eu já estava pronta para fazer isso, pois aquilo tudo estava demorando demais.

Mas eu hesitei. Havia uma terceira pergunta: E se fosse o pai do jogador de basquete? Tudo bem, eu nunca o tinha visto e nem perguntado para Finta sobre ele (talvez os seus pais fossem separados, ou ele até quem sabe já estava morto), mas ele poderia estar naquele momento me olhando e pensando 'Não vou abrir a porta para uma vendedora de biscoitos'. Eu não estava vestida de escoteira nem nada, mas você sabe como são as mentes dos pais de família. Garotas na porta? Se isso fosse levado para o lado passional, deveria conter uma figura masculina no olho mágico.

A porta abriu-se enquanto eu falava 'Não estou vendendo biscoitos!', bem animada e explicativa. Eu sei, foi um erro. Deveria ter esperado mais. Na verdade foi patético, pois a expressão no rosto da senhora Finta (o que?) não foi das mais alegres.

– Ah, Sophia. – ela disse com a voz fraca.

Ela estava realmente diferente da primeira vez que eu havia aparecido em sua porta. A mulher de cabelos grisalhos não estava feliz.

– Olá. Ben está?

A senhora olhou para o chão, relutando em falar qualquer coisa.

– Aconteceu alguma coisa? – perguntei.

Ela olhou-me nos olhos enfim.

– Benício não está.

– Ah. – joguei uma vogal no ar.

Minhas mãos, antes nos bolsos de minha calça, saíram livres enquanto eu mexia os ombros.

– Voltarei outra hora então. – sorri de leve. – Obrigada.

Virei-me, afastando-me dali.

– Benício não está há seis dias. – ela falou um pouco mais alto para que eu pudesse escutar.

Meu corpo parou, fixado ao chão, como se nunca mais fosse mover-se novamente. Apenas meu pescoço deslocou-se, para que eu pudesse girar um pouco a cabeça.

O Menino debaixo da minha camaOnde histórias criam vida. Descubra agora