2.8 |Gael

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Olhei o relógio no pulso pela quinta vez desde que cheguei em casa. O dia estava chegando ao fim o que significava que a minha hora de ir para o hospital estava próxima, e isso me preocupava. Habitualmente chegaria atrasado mas não por minha culpa. Certo, talvez eu tivesse uma pequena e mísera parte nisso, porém não dava para evitar a mulher andando pelo meu apartamento e observando cada cômodo e móvel, não que tivesse muito para admirar. Olhei o celular verificando alguma chamada perdida do hospital. Nenhuma. Um alívio. Me senti culpado desde que saí do quarto da Emerie de forma súbita e estranha, mas não queria assustá-la jogando a informação do meu noivado, que estava em pausa temporiaramente, era provável que ela nunca mais quisesse olhar a minha cara, e honestamente eu não queria que isso acontecesse.

Ela parou. Na minha frente com as mãos na cintura e um olhar desconfiado na cara.

- Você tem algum compromisso, uma reunião importante? - Indagou irritada. - Não quero ser uma intrusa e muito menos desejo atrapalhar seus planos para a noite Gael.

- Você sabe que isso não é verdade Rachel. - Respirei fundo. - Só estou, acho que estou um pouco surpreso ainda, por você estar aqui.

- Não é o que está parecendo. - Ela apontou para a minha mão. - Você tem olhado esse relógio desde que cheguei aqui. Parece que está com medo de se atrasar para alguma coisa, eu só não sei o quê.

- Você não pode me culpar. Quem chegou sem avisar foi você.

- Eu liguei pra você Gael.

- Sim, apenas uma vez e só para avisar que já estava chegando, você queria que eu fizesse o quê?

Rachel andou para trás soltando um riso irônico, acenando com a cabeça em negação. Eu sabia o que aquilo significava. Ela estava irritada, mulheres em geral sempre estão irritadas com os homens porém com essa mulher em especial sempre era diferente. Aquele típico drama femino, jogando tudo para o parceiro, distorcendo as coisas e no fim tudo cai sobre o homem como se ele fosse o infeliz culpado. Com nós dois não era diferente, no entanto ela tinha um jeito um tanto quanto estranho de demonstrar sua irritação. Ela chorava e eu sempre cedia, era um jogo clássico e o seu choro era só o xeque-mate.

E lá estávamos nós, naquele cena que já se repetiu mais vezes do que posso contar.

- O quê está acontecendo Gael? - Ela perguntou com a voz embargada e os lábios trêmulos. - Quando foi que nós ficamos assim? Tão distantes um do outro.

Fiquei quieto, em momentos como esse qualquer resposta que eu der pode ser usado contra mim futuramente. Se isso fosse um tribunal Rachel seria o juiz e eu o seu réu sem direito a um advogado.

Ela virou-se novamente se aproximando lentamente. As lágrimas escorrendo dos seus enormes olhos castanhos.

- Eu senti tanta a sua falta quando você foi embora. Eu sei que assustei você chegando assim fo nada, mas a culpa é sua.

- Minha? - Ri com amargura.

- Sim, eu liguei pra você a semana toda Gael. Todos os dias e você ignorou todas, atendeu ontem sabe se lá porquê, sem contar que eu estava preocupada por você não retornar as minhas mensagens nem as minhas ligações, pensei que algo de ruim tivesse acontecido. Você não pode me culpar por ficar preocupada com o meu noivo.

- Eu sei, desculpa. - Eu não disse? Eu sempre cedia. - Essa semana foi um porre, e realmente você chegou num momento bem conturbado.

Ela apoiou as mãos no meu rosto. Seu toque despertou algo em mim. Uma lembrança, uma recordação de que Rachel não era ela. Não era a Emerie.

- Você não sentiu minha falta Gael? Porque eu senti a sua e muita. - Devagar aproximou sua face. - Diga que não sentiu falta de mim. Do que nós tínhamos.

- E-eu... não... nós não podemos fazer isso Rachel. Não é justo.

- É claro que é. Sou sua noiva e você o meu. O que há de errado?

- Teoricamente nós não estamos mais noivos. Você sabe disso.

- De novo essa conversa Gael? - Ela se afastou. - É normal você se sentir assim, é normal essa confusão, mas nós não podemos desistir porque você de repente numa crise existencial decidiu que não me quer mais. E muito menos porque sua mãe finalmente deixou você em paz e agora o doce Gael quer ser independente. As coisas não são assim.

- Você não está entendendo. Não é por causa disso. - Deveria citar a Emerie? - Não quero ser injusto com você e muito menos brincar com os seus sentimentos.

Rachel riu novamente, aquela risada irônica. Quase pude ver o veneno escorrendo da sua boca.

- Ah pelo amor de Deus Gael, quem você pensa que é pra me dizer que não quer brincar com os meus sentimentos? Nós temos dezesseis anos? Não. Não temos. - Outra aproximação repentina e perigosa. - Somos duas pessoas adultas capazes de tomar as próprias decisões e nesse momento perdoo você por dizer besteira. Você está irritado e ouso dizer chateado comigo, mas tudo bem, não vou culpá-lo. Porém não venha me dizer categoricamente que de uma hora para outra você simplesmente esqueceu o quê nós tínhamos pra desistir agora. Você não pdoe fazer isso Gael. Espero não ter que te recordar o motivo do nosso noivado.

O motivo. Aquilo sim foi assustador, tinha sido uma grande surpresa pra um garoto de dezenove anos. Não era o ideal mas aconteceu, não tinha volta. E eu cuidei de tudo, não a deixei como um objeto, porém as coisas tomaram um outro rumo.

- E quando eu mais precisei de você Gael, você me deixou como uma inválida apaixonada esperando seu amor voltar sendo que ele nunca voltou. Você nunca voltou. - Ela começou a chorar de novo, mas dessa vez não era uma farsa. - Eu estava sofrendo pela nossa perda e você vivendo sua liberdade sem me dar notícias.

- Acredite, me arrependo toda a merda dos dias pelo o quê aconteceu, mas não foi minha culpa e nem sua. Eu deixei bem claro antes de ir embora que eu precisava de um tempo, eu precisava pela primeira vez na vida pensar em mim antes dos outros Rachel. Acho que você entende isso já que fez a mesma coisa a vida toda.

Cerrei os punhos. Era difícil alguém me irritar ao extremo. Eu disse que com nós dois as coisas funcionavam diferente, ela era capaz de mudar meu humor em questão de segundos em quanto tudo o que eu pudia fazer era engolir as merdas que ela sempre falava e jogava na minha cara quando era conveniente.

- Eu sou uma idiota né? Todo mundo me disse isso e eu ignorei por respeitar, por amar e confiar em você. - As mãos dela tremiam, isso nunca era um bom sinal. - Todo mundo dizia que você estava feliz e provavelmente já tinha outra e eu sempre neguei preferindo acreditar no homem que prometeu casar comigo. Mas acho que estava errada, talvez você tenha outra. É isso, não é? Você tem outra pessoa.

- Você não sabe o quê está falando. Você não entende Rachel. - Era tudo o que ela precisava ouvir. Era um vacilo, uma brecha pra mostrar que ela estava certa.

- Então você tem Gael. - Rachel me olhou chorando. Uma intensa mistura de raiva, tristeza e ódio.

Passei as mãos pelo rosto me obrigando a inspirar profundamente o ar. Tentando manter a calma e a paciência, afinal ela estava se sentido traída e agia como um animal ferido. Não era sua culpa deixar a raiva dominar sobre sua desconfiança. Contar sobre a Emerie era um risco, ela não tinha nada a ver com o meu relacionamento caótico e com certeza não precisava ter que lidar com mais uma merda na sua vida.

- Você não vai responder? - Sibilou irritadiça. - Tudo bem.

Fitei seu rosto, atordoado. Confuso.

- Não precisa me dizer. Eu descubro sozinha. Você sabe meu amor, eu sempre tenho o quê eu quero.

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