Cap.59 - Saída Antecipada (Parte III)

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Assim que se afastaram do lugar...

— Então... Foi só eu virar as costas pra que Sua Alteza voltasse a importunar o pai, até ele ceder.

— Não! De jeito nenhum! Juro que não disse mais nada. — defendeu-se, entusiástica.

— Duvido!

— Eu juro!! Fiquei triste, é claro, quando foi se aproximando do dia... Mas não pedi de novo.

— Ainda não acredito.

— Eu também não acreditava. Quando eles me contaram, quase desfaleci de alegria.

— Mas é muito mimada mesmo... — Matheo caçoa dela.

— Eu??! Mas que audácia a sua me dizer tal coisa...! — ela ergue a cabeça do ombro dele para encará-lo, ainda abismada com a ousadia.

— Eles fazem todas as suas vontades. Completamente desvirtuada...

— Acha mesmo...???!

— Acho, não...! Tenho certeza absoluta...

— E... desde quando tal assunto lhe cabe...??! — e lá estava ela, novamente a enfrentá-lo com a coragem que não tinha, fazendo com que Matheo fechasse a cara na mesma hora.

Como se não fosse o suficiente...

— Isso certamente só diz respeito a mim e aos meus pais...

E a raiva súbita crescia por dentro...

— Ah... E, logicamente... ao meu marido, quando eu me casar.

Ao ouvir aquilo, Matheo abriu um sorriso lindo e relaxou de vez.

É lógico que ela o provocava descaradamente.

— Tem razão! Só esse... marido mesmo pra dar algum jeito na senhorita. — e já estava deslumbrado por ela de novo, como se tivesse acabado de conhecê-la.

— É... Talvez... — concordou, com aquele sorrisinho larápio. — Mas, enquanto isso... vou dando o meu jeito com meus pais.

— Fazendo tudo que quiser...

— Fazendo tudo que me der vontade.

Matheo, mesmo desacreditado do atrevimento, não podia deixar de achar graça nos comentários e em como Laila o desafiava, de propósito. Tinha vontade de puni-la como um pai a um filho, mas não podia.

Pelo menos, não naquele momento...

— E conte-me como foi em Valduero? — ela pede.

— Difícil.

— Conseguiram devolvê-lo ao Rei Simón?

— Claro...!

— Que ótimo, não...?

— Muito bom mesmo... — e criou uma animação só para ela.

Matheo nem se apressava mais. Estava cansado, mas tranquilo como nunca, ali, com a única pessoa que importava no mundo, todo aquele tempo sozinhos.

E faltou muito pouco para desviar do percurso e sumir no mapa, como cogitou várias vezes.

Nem Herbert seria capaz de explicar o que seu amigo fez para conseguir se segurar e conter os impulsos, naquela que seria a condição mais que perfeita para tal ousadia.

— E como é? — Laila, de repente, interrompe seu delírio.

— O quê?

— Como é... uma invasão...?

— Bem... — e ficou lá relatando os detalhes para ela, com toda a paciência do mundo, ocultando logicamente os mais sórdidos.

— E o que normalmente fazem... quando chegam a um lugar invadido...?

E outro bom tempo de conversa dando todas as explicações possíveis.

Estava abismado ao ver que ela interessava genuinamente pelo tema, fazendo perguntas, comentando...

• • •

E assim o dia passou, até que rápido demais para o gosto dele.

Por sorte, conhecia alguns Povoados e Reinos pelo caminho e sempre escolhia os melhores lugares para parar com ela.

À noite, o mesmo em relação aonde repousariam. Era uma Hospedaria bem organizada, num pequeno povoado que ele conhecia de outras ocasiões.

Pediu os melhores quartos, com a exigência que ficassem lado a lado.

Matheo estava se segurando para começar o interrogatório sobre o Retiro e escolheu o jantar, certo que o assunto geraria desavenças.

— Ainda não me contou como foi o Retiro, Alteza.

Laila o encarava, desconfiada, pescando perfeitamente o tom da pergunta.

Humm... Foi excelente...

— E o que fizeram lá...?

— Havia atividades pela manhã e à tarde... No primeiro dia, quando chegamos... — e ficou lá, dando todas as explicações possíveis às mais inimagináveis perguntas, enquanto saboreava seu prato.

Lá pelas tantas...

— E o seu ex-namoradinho foi?

— O senhor se refere a Rudolf... Seria isso? — e fez-se de séria.

Matheo, com aquele olhar assustador encarando-a sem dizer palavra, a fez tremer dos pés a cabeça. Mas ela não recuou...

— Sim... Estava.

— E aquele com cara de bunda de criança. O do Baile? — mais uma pergunta em tom ameaçador.

— Também...

Ahh... Agora entendi seu interesse em participar.

— O senhor supõe que eu tenha ido ao Retiro por causa deles?

— É o que suponho.

— E acha que eles combinam tanto assim comigo e que valham tão a pena, a ponto de eu me empenhar exaustivamente, até conseguir a liberação do meu pai..?

— E por que não?! — Matheo a desafia.

— E por que sim?!

— Eu perguntei antes!

— Mas eu sou a dama. E mereço receber primeiro a resposta de um exímio cavalheiro... — provocando-o, o que o deixa abismado.

Laila, mesmo apreensiva, pressionava-o. Queria saber aonde aquele diálogo iria parar.

— Tão educados... Pomposos... Com seus trejeitos rebuscados... — Matheo começa a explicar.

— Hum... E o que mais?

— Seu pai deve aceitar qualquer um deles muito bem, como genro. 

— Sei... Mais alguma observação?

— Várias. Mas certamente que a senhorita deva ter reparado também...

— É, senhor Matheo... Posso afirmar... com absoluta e irrestrita certeza, que o senhor não conhece nada mesmo a meu respeito. Com licença...! — arrancou o guardanapo do colo e o atirou com tudo em cima da mesa, deixando Matheo para trás, enfurecido por ter sido abandonado no meio da refeição, mas em êxtase por saber que ela não se importava nem um pouco com aqueles "almofadinhas".

Queria ter conseguido ir além, mas não seria naquela noite...

Laila encostou a cabeça no travesseiro e levou um bom tempo ainda para conseguir dormir. Não havia mais dúvidas que era ele... Que era o que queria... Ainda que a consciência tentasse lutar contra, seu coração já havia se resolvido.

(COMPLETO) Laila Dómini - Quando é para ser... (Livro 3)Onde histórias criam vida. Descubra agora