Um - primeira parte.

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Era madrugada, e um sereno sutil caia do céu, fazendo uma bruma sob as ruas. Quando se é novo, parece muito divertido sentar-se no banco do passageiro, na frente, e eu gostava muito quando eu sentava ao lado do meu irmão.
As ruas que estavam tranquilas foram ficando ainda mais vazias ao chegarmos na Av. Mãe dos Homens, estávamos voltando da casa de Amanda, sua namorada, o olhei com certa admiração. Wellington tinha olhos azuis cristais como os do meu pai e eu invejava aqueles olhos por ter nascido com os meus cinzas, quase que dizia sem uma cor interessante.

O ronco do motor das motos me tomou a atenção e olhei através do vidro levemente embaraçado, a moto passou quase que tirando "fininha" do carro, e logo mais outras duas, rapazes com capacetes e encapuzados por baixo nos cercaram,— era para ser apenas um assalto —, um deles bateu com o cano da arma no vidro de meu irmão, e eu o olhei com olhos assustados, ele abriu a porta e homem estranho começou a abordagem agressiva.
Meu coração agitava-se feito um pássaro preso em uma gaiola, e eu com os olhos cheios de lágrimas de pavor fechei os olhos desejando que aquilo não estivesse acontecendo. Minha mãe era muito católica e sempre dizia que orar resolvia os problemas, aquela foi a única vez que fiz um pedido genuíno ao tal deus que ela tanto acreditava. Uni as mãos, rezando, sem saber ao certo se estava rezando pois as palavras mal saiam. O primeiro disparo ecoou, o segundo, o terceiro, meu corpo ficou imóvel.

Havia um livro que li, há muito, muito tempo, quando estava descobrindo o mundo, livro este que contava a história de um homem com uma vida pacata, na qual ele dizia a seguinte frase: "sinto-me como um compo furado, nem sempre cheio para transbordar, tampouco vazio" - não com essas palavras exatamente, mas mais ou menos isso, na época não entendia muito, mas agora sei exatamente como é essa situação.
Limpei minha mente daquele pensamento a respeito do que aconteceu com Wellington. Respiro fundo e o cheiro do sexo invadiu minhas ventas, eu terminava de dichavar a erva na mó mesmo, coloquei na seda, enrolei o mais fino que podia, dei uma boa prensada na maconha após lamber a fita, e ascendo.

Respiro novamente profundamente, escuto Carol gemer ainda em êxtase depois de foder a buceta dela por longos minutos. Olho para meu pau flácido e ainda melado de porra e lubrificante. Dou uma tragada no cigarro, embora não fosse ideal tragar maconha, puxa prende e solta, sentado na cama olhando para a mesinha de cabeceira onde havia uns enfeites bagunçados, o lubrificante que parecia um dildo masturbador (não duvido que vendam nesse formato para isso).
Escuto Carol se levantar, e a olho de soslaio, sua bunda grande brilha de suor e porra, ela pega suas peças de roupa do chão, e passa na minha frente, com os peitos balançando feito belos pêndulos suspensos, mas volta de ré, pega o Beck da minha mão e da um, dois, três puxes e me devolve quando o mesmo já está parcialmente apagado, usei o isqueiro novamente reacendendo e me encostei na cabeceira da cama e cruzei os braços olhando meu peitoral, com o cigarro de maconha ainda preso nos lábios. Observo meu mamilo rosado ainda acesso, e os pelos em seu entorno.
Por que tão sensíveis?

Meu celular na cabeceira da cama vibrou, era uma chamada desconhecida, mas eu sabia quem era e sabia da onde vinha. Acho que estava esperando.

— E Aí doutor Kauã César Lobos, é você não é?

— Sim — falei secamente.

— Aqui é o Peçanha.

Claro, de dentro da cadeia, por isso a ligação era desconhecida, já esperava que fosse esse merda.

— Vai me tirar daqui doutor?

— Eu ia... — falei dando um puxe no cigarro escutando ele queimar.

— Como assim ia doutor, tá maluco? Ou tu me tira ou os cara do comando te derruba.

—  Que mané comando Peçanha. E você achou o que? — puxei o cigarro da erva boa — Que eu não descobriria sua ficha? Caralho Peçanha eu falei que eu advogo causas criminais na minhas normas, sua ficha criminal tem até abuso, não vou defender abusador...

— Porra Doutor, tá tirando? Claro que não fiz aquilo

— Vai se foder, se fosse só o roubo eu aliviava a barra mas abuso? É o seguinte não tenho medo de você e nem daquela meia tigela do comando, arruma outro advogado.

— Qual foi doutor?

— "Qual foi", o caralho Peçanha, não vou pegar o seu caso.

— Pago o triplo.

— Pode pagar a porra toda mermão, que se foda, não vou pegar, espero que vivre marmita de carcereiro aí dentro! Cuzão.

Desligo o telefone, pego o isqueiro, acendeu o fogo na ponta do Beck que apagou novamente.
Existe uma regra clara para eu advogar em defesa dos criminosos, desde que esses crimes não envolvam nada que inclua abusos, ou assédio.

Quando me tornei advogado, foi pensando em vingar a morte do meu irmão, comecei fazendo justiça, mas logo vi que era mais difícil do que imaginava, e a grana era sempre muito curta. Então comecei a defender presidiário.
Não sou um bom advogado, minha vida é uma bagunça fora do escritório, fora do tribunal, eu nem de longe tenho boas condutas.
Que frustrante.

Descobri meio tarde que a vida não é como nos filmes, eu nunca consegui pegar os culpados pela morte do meu irmão o máximo que consegui foi a descoberta de que pertenciam a uma quadrilha da zona-norte de São Paulo e um retrato falado do Formiga, o filho da puta que sentou bala no meu irmão e mais nada além de perdas. Eu devia ter virado policial investigativo, mas minha mãe, traumatizada pela morte do meu irmão que era policial militar naquela época, nunca apoiou a ideia, e como não queria dar mais decepção à velha além de um filho perdido, deixei passar e desisti.

Me levanto, coloco o resto do cigarro meio apagado no cinzeiro. Me lembro a primeira vez que fumei maconha, foi um barato, hoje parece nem fazer efeito.
Respiro fundo, dou uma pegada no meu saco suado, sentindo os fios do mesmo na minha mão, não que eu estivesse peludo, também não estava raspado pois não curto essa parada de andar linsinho, mas é indiferente sempre tem pelos lá embaixo, dei uma cheirada na mão, aquela famosa checada que todo homem faz ou já fez na vida, o cheiro do suor do saco é diferente do resto do corpo né não? Caminhei até o banheiro e Carol já estava se secando.

Ela olhou pro meu pau e disse:

— Grosseiro — riu passando por mim.

Ergui a sobrancelha.

— Igual o dono — acrescentou ela olhando em meus olhos.

Em seguida ela levou a mão em minha barba e acariciou meu rosto com suas unhas longas vermelhas, logo entrelaçou o dedo na corrente fina de ouro do meu pescoço com o pingente da Nossa-Senhora-Desatadora-dos-Nós.
Virei o rosto, não gostava muito de carinho, entrei no box, liguei o chuveiro, ainda vendo a silhueta dela através do vidro embaçado.

— Kauã, vamos em casa mais tarde? É aniversário sua cunhada.

— Não somos namorados — falei de olhos fechados enquanto lavava o pouco cabelo que tinha.

Não, eu não era calvo, mas usava sempre um corte militar, ou seria corte de maloqueiro hoje em dia? Eu não sei, desses que é raspado dos lados com sutil degradê,  com um pequeno topete seco.

— Mas minha família acha que somos, e sua também.

Não éramos namorados de fato, nós só fodiámos, às vezes eu e Carol ficávamos nos pegando e trepando durante vários dias ou meses.
Mas havia meses da qual estávamos na pista, eu comia outras minas, e ela? Bom eu não sei, só sei que ela sabia que eu trepava com outras garotas, inclusive suas amigas. Às vezes essas filhas da puta esqueceram sutiã, calcinha, brincos aqui em casa e Carol sempre pegava as peças. Ela tentava disfarçar sua putisse, chamava as mina de piranha e os caralho, as vezes até me dava uns tapas (esses eu gostava).

— Não vou — respondi com brandura

— Porra Kauã que custa?

— Custa meu tempo, e isso está se tornando um hábito, não sou seu namorado, nem seu acompanhante de luxo.

Houve um silêncio. Eu ainda estava de olhos fechados tirando o sabão da cabeça.

— Carol amanhã… — escutei o barulho da porta bater.

Ótimo, agora ela vai ficar uns dois meses sem falar comigo.
Abro os olhos embaçados pela queda d'água olhando para a parede fixamente.

A Ordem do CaosOnde histórias criam vida. Descubra agora