23 - Oscilando

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Enfio o resto das coisas de Lia na mochila dela de qualquer jeito e me levanto depressa.

— Oi — diz Natan.

— Você não estuda aqui. O que estava fazendo dentro da escola? — minha voz sai rude.

— Estava procurando minha prima. Ela disse que a aula acabou cedo e me pediu para vir buscá-la, mas não encontrei Jenifer em lugar nenhum. Você a viu?

Apesar de Jenifer ser colega de sala de Luke e sempre me ver com ele, ela parece ter esquecido a minha existência.

— Não.

Cruzo os braços e fixo os olhos nas grades da escola, atrás dele, deixando claro que estou ocupada esperando por alguém.

— Mas que bom que te encontrei. Queria pedir desculpas por aquele dia.

— Já passou — respondo seca.

— Estou vendo pela sua postura que não passou. — Natan solta um suspiro pesaroso. — Lamento muito por aquilo, eu só estava querendo te levar para beber algo. Aquele cara é surtado, Grazy.

Olho para ele com irritação.

— É Graziella. E ele não é surtado. Não fala assim dele — digo com firmeza.

Natan desvia os olhos e esfrega a nuca, ficando visivelmente constrangido.

— Desculpa, não quis te aborrecer. Eu tenho o péssimo hábito de estragar tudo com todo mundo.

Seus olhos ficam tristes e imediatamente me lembro do que Jenifer disse, sobre ele estar deprimido e qualquer chateação deixá-lo para baixo. De repente, sinto a urgência de tranquilizá-lo.

Descruzo os braços e uso um tom ameno ao dizer:

— Tudo bem. É normal, eu também estrago tudo às vezes.

Ele volta a me olhar.

— Duvido. Eu vacilo muito, deve ser por isso que não tenho amigos. — Natan parece perceber que soou muito vitimista, pois acrescenta depressa: — Mas ser solitário não é tão ruim — ele dá um sorriso sem graça.

Acontece que eu conheço bem a sensação de ser alguém solitário. E, apesar de nunca ter sido uma pessoa deprimida, imagino que a solidão deve piorar esse sentimento.

— Sei exatamente como é ser solitário e te garanto que às vezes pode fazer bem cultivar amigos — digo em tom amigável.

— Estou me esforçando — mas sua voz não é muito animadora.

Na verdade, nada na aparência dele é animador. Natan tem uma expressão triste, os ombros curvados e os olhos apagados. Ele parece tão... vulnerável.

— Sei que você consegue — incentivo.

Ele enfia as mãos nos bolsos, parecendo meio sem jeito, e diz:

— Quer se habilitar para a vaga de primeira amiga?

Sua pergunta soa um alarme dentro da minha cabeça. Claro que não posso ser amiga dele, Luke o odeia. Na verdade, Luke não pode nem saber que estou conversando com ele. Preciso dispensá-lo depressa.

— Eu... é que... minha mãe me proibiu de fazer amigos. Ela diz que amizade é coisa que os traficantes inventaram para fazer os jovens oferecerem drogas uns aos outros.

Os olhos de Natan, já sem luz, se apagam totalmente, e vejo que ele entendeu minha desculpa esfarrapada como uma rejeição cruel.

Me arrependo imediatamente, devia ter dado uma desculpa mais realista.

O garoto dos olhos avelãOnde histórias criam vida. Descubra agora