74 - Fingir

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Os olhos de Luke encontram os meus e o mundo parece diminuir a velocidade, um contraste absurdo com o compasso acelerado do meu coração.

Luto para manter um semblante sereno, mas minhas emoções estão à flor da pele.

Como ele reagirá agora que me viu aqui, cortando morangos na sua cozinha?

Há um breve lampejo de surpresa em seu rosto e meu coração congela por um instante. Seus olhos claros me olham fixamente enquanto ele processa a minha presença.

A tensão no ar é palpável e meu nervosismo atinge o ápice. Eu daria tudo para saber o que ele está pensando nesse exato momento.

Luke desvia o olhar por um momento, como se precisasse de um segundo para absorver a cena. A garrafa de água em suas mãos parece ter se tornado um objeto de grande importância, algo para focar enquanto tenta entender o que está acontecendo.

— Grazy vai almoçar conosco hoje. Não é ótimo? — Eliza anuncia, empolgada.

Luke olha para ela por um instante e em seguida volta a olhar para mim.

Minhas bochechas queimam sob seu olhar curioso e desconfiado.

— Sim, mãe. Isso é ótimo — concorda, encarando o meu rosto.

Permaneço em silêncio.

Luke gira a tampa da garrafa de água e, sem tirar os olhos de mim, vira na boca. Após um longo gole, ainda sem desviar os olhos dos meus, ele tampa a garrafa novamente e começa a caminhar em minha direção a passos lentos.

Minha perna esquerda balança de nervosismo e fico grata por ela estar escondida atrás do balcão.

Luke chega perto, coloca a garrafa de água sobre a superfície da bancada e se senta de frente para mim.

Continuamos nos encarando.

— Já está terminando, Grazy? — Eliza pergunta, me fazendo lembrar da minha tarefa com os morangos.

Finalmente consigo tirar os olhos de Luke, liberta da hipnose.

— Sim... estou terminando — pego a faca que tinha largado e começo a cortar um morango bem devagar, temendo errar o corte sob a pressão do olhar de Luke.

Com a visão baixa, acompanho ele pegar um morango e morder.

— Luke, por que não ajuda Grazy? Ela está preparando a sua sobremesa favorita — Eliza desfaz o laço do avental. — Vou voltar ao supermercado, esqueci de comprar tomates para o molho do espaguete.

Salto do banquete para o chão.

— Eu vou! — minhas palavras saem quase como um grito de desespero.

Talvez eu finja que tropecei em um bueiro no caminho e fui parar no Japão.

Ou que tive uma crise alérgica ao encostar em frutos do mar acidentalmente no mercado.

Ou até mesmo finja que esqueci de voltar para cá.

São tantas possibilidades.

— Ah, obrigada, Grazy — ela me sorri, doce. — Por que não vai com ela, querido?

Meus olhos se arregalam na direção de Luke. Ele não pode ir, isso arruinaria o meu plano de desaparecer do mapa assim que pisar fora desta casa.

Os olhos de Luke estão sobre mim, me observando atentamente enquanto come um morango.

Ele pega mais um morango e se levanta.

— Vamos.

Isso é uma tragédia.

O garoto dos olhos avelãOnde histórias criam vida. Descubra agora