Será que todas as escolhas na vida adulta implicam abrir mão de algo? Sempre será preciso soltar uma coisa para pegar outra? Por que não posso pegar uma com cada mão? Algo sempre tem que ficar para trás?
Decidi ir embora para ficar com a minha família. Nessa escolha, o homem que eu amo fica para trás.
Tudo é doloroso nesse momento, mas uma das partes mais difíceis é ter que me mostrar forte para a minha mãe, pois ela está aos pedaços por ter mandado o amor da vida dela embora, mas entende que eu amo alguém e não quer que eu me despedace também.
Eu disse para ela que quero ir porque preciso pedir perdão ao meu pai, pois as coisas que eu disse para ele estão dilacerando o meu coração, e isso é verdade.
Mas não é só isso. Mesmo que minha mãe fosse embora e me deixasse aqui, ou que eu viajasse com ela apenas para me desculpar e depois voltasse para Luke, não é tão simples. Não quero ficar sem os meus pais. Sem nenhum dos dois.
E não sei como contar isso para Luke.
Ele me deu a opção de ficar. Garantiu que cuidaria de mim. Mas não consigo me separar da minha família desse jeito.
Mais cedo, quando fomos para a escola juntos, ele percebeu que havia algo de diferente em mim, mas deve ter associado isso ao fato de eu estar mal pela partida do meu pai.
Na escola tudo foi muito estranho, pois qualquer interação com as minhas amigas, eu sabia que era a última, mas elas não.
Não prestei atenção às aulas e também não faz diferença, pois não tenho a menor ideia de como vou concluir o ensino médio em outro país. E não há espaço em minha mente para me preocupar com isso agora.
Lia percebeu que eu estava estranha, mas ela é muito boa em respeitar quando alguém não quer falar sobre algo.
Em um momento de distração dela, enfiei minha carta de despedida no fundo de sua mochila. Lia vai me odiar quando descobrir que fui embora sem me despedir adequadamente, mas não me parece haver uma forma adequada de dizer adeus para as pessoas que eu amo.
Agora é meio-dia, o voo sai às onze da noite. Faltam exatas onze horas para eu ir embora e, ao invés de estar aproveitando o tempo que me resta com Luke, estou deitada na cama encarando o teto fixamente.
A dor que sinto é paralisante e me faz querer fugir para dentro da minha própria mente, onde tenho acesso ilimitado às lindas memórias que construí com Luke. Não estou pronta para ver sua cara de decepção quando descobrir que vou embora, então estou adiando ao máximo o momento de contar.
Meu celular toca em cima da escrivaninha e eu me levanto depressa, pois cada ligação penso que pode ser meu pai.
Ao avistar o contato da minha mãe, meu coração murcha como uma flor ao pôr do sol.
— Grazy, já resolvi tudo no trabalho — ela diz quando atendo. — Estou resolvendo as pendências na sua escola e chego daqui a pouquinho. Você já comeu?
Ela está resolvendo tudo e felizmente não preciso me envolver em nada. Sei apenas o que preciso saber: entraremos em um avião, pousaremos na Espanha e então ligaremos para ele.
Queremos surpreendê-lo. E um lado meu está muito ansioso pelo momento de vê-lo, abraçá-lo e pedir desculpas pelas coisas que falei.
— Já sim — minto.
— Tenho outra coisa para te dizer — ela hesita.
Nem me preocupo, pois sei que não dá para ficar pior.
— Recebi um e-mail da companhia aérea. O voo foi antecipado para às sete da noite.
Meus olhos se fecham devagar, como se minha mente estivesse desistindo de tudo. Mas meu coração se desespera, se acelera e eu me levanto depressa.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O garoto dos olhos avelã
Novela JuvenilGraziella tem uma imaginação para lá de fértil, vive no mundo da lua e, por vezes, acaba se enfiando em situações embaraçosas. Sem planos de se apegar à nova cidade, ela sabe que a promessa de permanência do pai é daquelas que não se deve levar à sé...