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O Victor mudou de assunto e eu agradeci ele mentalmente por aquilo.

Nós terminamos de comer enquanto falávamos sobre algumas besteiras.

Eu estava explodindo de tanto que tinha comido e aquele milkshake só tinha feito meu frio aumentar.

Depois de comermos, fechamos as portas e pulamos pro banco de trás.

Esperei ele se ajeitar no banco e então me enfiei entre as pernas dele, ele me abraçou e iniciou um cafuné na minha cabeça.

- Tô esperando você começar a contar - falei baixo fechando meus olhos.
Ele suspirou. - Vou te contar, Nat. Mas isso não vai mudar nada entre nós, tu promete?
Balancei a cabeça positivamente e me aconcheguei nos braços dele.

- Depois que os meus pais morreram, eu fiquei morando com o meu irmão, e a nossa relação foi sempre bem fodida. Tudo sempre foi motivo pra estresse, e a gente já saiu muito na porrada por motivo besta, tá ligada? E era porrada de verdade. Com o tempo eu comecei a ficar mais intolerante com as coisas que ele me dizia ou que fazia, parecia ter virado uma bomba prestes a explodir a todo o momento e eu explodia pra caralho, Nat.

- Vocês se batiam sem mais nem menos? - perguntei.

- Sempre tinha um motivo besta por trás, tipo uma luz acesa esquecida ou a perca de uma chave. Tinha dia que era foda, esses meus acessos de raiva ficavam cada vez mais constantes e não era só dentro de casa. Ficava puto na escola com os professores, com as matérias e só metia o pé pra casa, porque se eu ficasse por lá rolaria merda. Nessa época a Mari já vivia lá em casa, e ela via como eu ficava, ela contou pra a minha avó e as duas inventaram que era trauma por causa da morte dos meus pais e eu fui obrigado a ir pra um psicólogo. Foi questão de umas três sessões pra minha psicóloga me diagnosticar com TEI.

- Que isso? - perguntei.

- Transtorno explosivo intermitente. - ele falou mais baixo - Eu não tenho controle de mim quando tô com raiva, me perco fácil e só alivia o que eu sinto subindo pelo meu corpo quando eu tô quebrando alguma coisa. - meu corpo se tensificou - Esse diagnóstico explicou bem a minha relação com o Vinicius, as nossas brigas, os meus surtos. Porra, eu cheguei a quebrar nossa sala inteira por causa dele e da Mariana. Comecei a fazer acompanhamento psicológico, a fazer terapia e ia encontrar com um psiquiatra duas vezes ao mês, ele me passou uma porrada de remédio, a maioria deles calmantes. Só assim para que eu ficasse mais tranquilo, mas era só ver a Mariana com o Vinicius, ou ouvir a foda deles do meu quarto, que tudo voltava cada vez mais forte e difícil de controlar. E o Vinicius sabe da minha situação, ele gosta de me ver fora do controle, tu viu isso mais cedo...

O olhei. - Como você conseguiu me esconder isso o tempo todo?

- Por causa dos remédios, Nat. A pior parte do TEI é o sentimento que fica depois da explosão, é uma culpa filha da puta misturada com remorso, dá um aperto no peito, um nó na garganta que tu só quer ficar sozinho.

- E o que aconteceu hoje...?

- Ele falou daquele jeito de ti, Natasha. Tu não sabe como meu sangue ferve quando alguém fala de ti perto de mim, quando eu tenho que te ver com outro cara, tu não tá ligada o quanto eu preciso me controlar. E já faz um tempo que eu não vou na terapia.

- Por que não? - perguntei.

- Porque chega uma hora que a gente acha que tudo se tornou tão repetitivo que eu já sei tudo o que o meu terapeuta vai dizer, que eu já consigo me virar sozinho. Mas depois de hoje eu vi que não consigo...
Suspirei.

Um filme passou pela minha cabeça de todas vezes em que eu o provoquei em relação à Mariana, das vezes em que ele segurou meu braço com mais força, em que sua respiração ficava cada vez mais pesada e seu rosto mais vermelho.

Regra Número 3Onde histórias criam vida. Descubra agora