Temos nosso próprio tempo

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E o que se seguiu depois da declaração da Érika foi mais ou menos o seguinte:


- Aí aí, filha... – Sérgio falou sorrindo com o canto dos lábios.

- Que foi? – ela replicou parecendo incomodada.

- O garoto não teve nem tempo de aprender a tocar ainda. – falou se referindo a mim.

- Eu já disse que eu posso tocar guitarra. – Jean emendou.

- E eu já falei que é mais fácil achar guitarrista que baterista, Jean. – Erika replicou.

- E daí? – mordeu o sanduiche novamente. – A gente acha um, ué.

- Um desconhecido?


Jean olhou pra mim, ergueu os ombros e suspirou parecendo bem incomodado, mas desistindo de discutir.


- Você sabe ou não sabe tocar afinal? – ele perguntou de boca cheia.

- Eu... – e de repente todo mundo estava quieto olhando pra mim. – Sei?

- Dá o violão pra ele e deixa a gente ver, Érika. – Sérgio falou, ainda sorrindo. O homem não botava um pingo de fé em mim. Mas quem poderia culpa-lo? Eu também não botava.


Na real eu não fazia ideia do que raios eu estava fazendo ali.

Desde que havia comprado o violão eu tinha treinado obstinadamente e quase de forma compulsiva aproveitando boa parte do meu tempo livre.

Gostava de ouvir o som e perceber conforme eu evoluía que estava fazendo música ao invés de apenas barulho.

Naqueles meses que haviam se passado desde a aquisição do violão eu havia me encontrado algumas vezes com a Érika e até tínhamos tocado juntos em pelo menos duas ocasiões.

Foi como descobri que ela tocava contrabaixo e também foi quando ela começou a falar de formarmos uma banda.

Eu achei a ideia legal na ocasião e até me atrevi a sonhar um pouco.

Que adolescente saudável no auge da MTV não sonhava em virar um guitarrista famoso e tocar numa banda?

Eu só não imaginava que a Érika levaria aquele pensamento adiante.

Então, quando ela voltou com meu violão senti meu nervosismo aumentar.

Uma coisa era tocar junto dela e outra era tocar para desconhecidos que com certeza estavam me avaliando.

E eu nunca tinha tocado pra mais ninguém antes além da minha família, mas eles eram obrigados a me ouvir por não ter outra escolha.


- Relaxa, Gabriel. – Erika percebeu meu estado e tentou me acalmar. – Começa com a que a gente começou da outra vez.

- Ok...


Peguei a palheta na minha carteira e a deslizei pelas cordas uma vez. Afinei de ouvido o melhor que pude antes de começar a tocar uma música do Legião Urbana chamada Tempo Perdido.

As primeiras notas foram saindo meio atrapalhadas arrancando uma pequena risada do Sérgio, mas eu continuei mesmo assim sem me deixar abalar.

E então Érika entrou cantando e foi tudo o que eu precisava para ficar calmo.

Sua voz era linda e eu realmente adorava ouvi-la cantar.

Meu repertório não era vasto e eu nem era tão bom violonista.

Por trás do toqueOnde histórias criam vida. Descubra agora