Nem tudo acaba em pizza

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Meus pais chegaram cerca de duas horas depois e trouxeram comida.

Isso não era algo frequente, mas também não era exatamente incomum.

No geral eles preferiam economizar e cozinhar em casa, mas havia ocasiões em que se sentiam especialmente cansados e não queriam ter mais trabalho. Também existiam aqueles momentos em que por alguma razão queriam comemorar.

Dessa vez foi pelo primeiro caso e a escolha foi pizza e refrigerante.

Eu não tinha nada a reclamar.

Minha mãe fazia questão de que sempre jantássemos todos juntos na mesa, independente de qual fosse a refeição. Então, lá estávamos nós.

Comendo, bebendo e conversando.


- Mãe, o Gabriel está traficando drogas. – foi Julia quem puxou o assunto. Horas atrás havíamos rido muito disso, então Bianca e eu achamos engraçado. Pena que meus pais não estavam contextualizados. Minha mãe especialmente não pareceu ver graça nenhuma.

- Que? Do que você tá falando, menina? – replicou em tom irritado.

- É besteira da Julia, mãe. Relaxa. – tentei acalmá-la. – Ela esta dizendo isso por que recebi cem reais da minha cliente.

- Cem reais? – meu pai olhou desconfiado. – Ela não tinha te pagado oitenta da outra vez?

- Sim, exatamente. Mas como fiz aquele curso tive um aumento.

- Um aumento? Rápido assim?


Ele estava alternando o olhar entre o prato de pizza e meus olhos.

Eu fazia o mesmo, mas no meu caso era por que ponderava minhas palavras com cuidado. Não queria descumprir o acordo que fiz com dona Fátima.

Alias, era mais do que isso.

Não queria nem ter de falar sobre o acordo se pudesse evitar.

Conhecendo meu pai ele provavelmente iria compreender a situação.

Ele trabalhava com administração e contabilidade, por isso era responsável por uma série de informações sigilosas de diferentes clientes. Havia coisas que ele simplesmente não podia revelar.

Foi dele que herdei meu senso de responsabilidade procurando sempre cumprir com minha palavra.


"Um homem sem palavra é um homem sem honra. Um homem sem honra não é homem."


Perdi as contas de quantas vezes ouvi isso e coisas do tipo.

O problema de revelar sobre o acordo era minha mãe.

Eu já podia vê-la achando aquilo esquisito demais, desconfiando da dona Fátima e talvez até mesmo querendo ligar pra ela.

Suas palavras provavelmente começariam com algo como:


"- Você só tem dezesseis anos!"


Tendo tudo isso em mente, passei para o próximo assunto o mais rápido possível, algo que com certeza seria do interesse deles.


- A parte boa é que se vocês quiserem já posso pagar mais uma parte do curso que vocês pagaram pra mim.

- Que ótimo! – meu pai respondeu mordendo a isca e também um pedaço de pizza.

- Ronaldo! Não. – minha mãe interveio. – Nós parcelamos pra ele.

Por trás do toqueOnde histórias criam vida. Descubra agora