VERSÃO ANTIGA

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Eu não precisava mais me preocupar com as provas. Já havia feito todas e estava confiante. Eu só precisaria voltar a me preocupar caso fosse reprovado em alguma disciplina, o que (por favor!) não pode acontecer. O clima de férias já havia me alcançado... Eu ajudava a Marcela na tentativa de deixar seu apartamento o mais aconchegante possível em tempo recorde. Em algumas noites até dormi lá. Por várias vezes perdemos a hora... Além de ajudá-la, nós conversávamos muito e tínhamos tanto em comum. Eu me sentia confortável na sua presença.

Com Nícolas em outro país, eu me preocupava só em ajudar minha amiga e ir às reuniões do grupo de apoio. E, por falar nele, Candela havia prometido nos encontrar semanalmente. Eu não sabia como iam as coisas entra Martín e ela, mas tentava ser otimista a respeito. Quando por fim cheguei ao grupo, depois de passar todo o dia ajudando na pintura das paredes do novo apartamento da Marcela, me deparei com Candela hesitante do lado de fora. Gentilmente, toquei seu braço, mas acabei assustando-a.

− Fique calmo, Cande. Sou só eu... – pensei que ela se viraria na minha direção, mas não o fez. Continuou de costas para mim, como se me escondesse algo. – Ei, está tudo bem? – Candela continuou muda, se encolhendo mais e mais. Parecia envergonhada. – Cande, o que está acontecendo? Fale comigo. Eu... – ela se virou só um pouquinho, mas o suficiente para eu perceber que havia algo de errado com o seu rosto. – O que aconteceu? Isso... Isso... Foi o Martín? – questionei, embora duvidasse seriamente daquela hipótese.

− Não foi o Martín. Ele é... Um doce – foi tudo o que ela disse. Aproximei-me, mas ela rapidamente se afastou. Céus, o que estava acontecendo?

− Cande, por favor, você pode confiar em mim... – sussurrei. Seu corpo se encolheu, parecendo mais frágil e vulnerável. Sem pensar muito, puxei-a para um abraço apertado. Ela relutou no começo... Tentou se afastar. Mas eu não deixei. Apertei meus braços ao seu redor e esperei que ela desistisse de me afastar. E ela desistiu. Seu pequeno corpo se acomodou ao meu e antes que eu pudesse voltar a questioná-la sobre o ocorrido, ela desatou em lágrimas.

Não era um choro qualquer, preciso enfatizar. Havia desespero, dor, raiva, frustração e... Ela tremia. Tremia muito enquanto seu rosto continuava a ser inundado por novas lágrimas. Eu sabia que de nada adiantaria tentar conversar naquele momento. Candela não conseguiria falar... Não com tanta dor e medo. Então eu só continuei ali, abraçando-a bem forte, tentando, desesperadamente, lhe dar o meu melhor suporte silencioso.

O chuvisco do final da tarde começou a apertar. Continuamos ali, na porta do grupo de apoio, abraçados, com a chuva que aumentava gradativamente. Temendo que ficássemos doentes, eu a levei em direção ao meu carro, estacionado não muito longe dali. Eu a acomodei no banco do carona, assumi meu lugar e dei partida... Rumo ao apartamento da Marcela. Eu precisava da ajuda da minha amiga, porque realmente não sabia lidar com tudo aquilo. Pensei em levá-la até o Martín, mas algo me dizia que, nesse momento, uma ajuda feminina seria muito mais útil.

E, bem, parece que eu estava certo.

Eu e Cande ficamos parados na porta do apartamento da Marcela. Cande ainda tentava esconder o rosto no capuz de seu casaco. Assim que a porta se abriu, o olhar da Marcela pareceu surpreso e chocado. Mas, para nosso total alívio, não houve questionamentos. Ela nos deu passagem e rapidamente sumiu pelo apartamento, retornando, instantes depois, com duas toalhas, além de uma muda de roupa. Uma calça de moletom e uma camiseta larga.

− Vista algo seco... – ela disse, estendendo as roupas na direção da jovem que, para ela, era uma total desconhecida. – Vou preparar algo quente para você beber.

Cande pareceu desconfiada e relutante, mas aceitou a ajuda depois que me viu sorrindo em sua direção, como se dissesse "pode confiar". E ela de fato podia. Marcela era uma mulher prática, algo que eu admirava muito nela. Ela com certeza iria querer saber o que aconteceu, mas primeiro ela se asseguraria de que estávamos bem. Candela sumiu pelo corredor, enquanto Marcela e eu seguimos para a cozinha. Ela começou a preparar um chá que, a julgar pelo aroma, parecia de camomila, o que era uma excelente pedida, considerando o estado da minha outra amiga. Sem nem pedir permissão, comecei a preparar alguns sanduíches... Não importa o tamanho do problema, encará-lo de barriga cheia parece muito mais promissor.

SINGULAR (degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora