Fomos almoçar em um maravilhoso restaurante localizado a apenas algumas quadras do nosso condomínio. Era a primeira vez que eu experimentava comida mineira e não poderia estar mais encantado. Já estava pensando em como contrabandear pão de queijo e guaraná pelos próximos dez anos. Nina, é claro, se prontificou a me dar algumas dicas. Marcela não estava se sentindo bem e foi direto para o apartamento. Quis acompanhá-la, mas ela se sentiu insultada com o meu cavalheirismo. Eu sabia que ela podia voltar para o apartamento sozinha, não estava alegando o contrário. Estava apenas tentando ser gentil. O que não a agradou.
Ela dizia estar sem fome, mas mesmo assim, a Nina preparou uma refeição completa para viagem. Estávamos conversando sobre os planos daquela noite... Rafaella já estava automaticamente inclusa neles, esperava que ela soubesse disso. Se fosse necessário, convidaríamos suas amigas também, mas era bastante óbvio que ninguém queria aquilo. Nem mesmo a Rafa. Por que será?
Depois do almoço, precisamos nos despedir. Embora quisesse muito continuar na sua companhia e aproveitar as horas seguintes na folia, estava exausto. Algumas horas de sono se faziam necessárias. Ela concordou e disse que me mandaria uma mensagem de texto quando acordasse. E, sim, isso significa que finalmente (como se tivesse demorado uma eternidade!) havíamos trocados nossos números. Eu me sentia melhor com isso... Não precisaria tocar a campainha do apartamento da frente, correndo o risco de ser atendido pelas demais garotas. Principalmente por Nicole.
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Estava quente. Muito quente. Eu não sabia ao certo se isso estava relacionado ao clima ou se era Rafaella quem despertava isso em mim. Havíamos ido parar no meu quarto e não faço ideia de como isso aconteceu. Só a conheço há um dia, é verdade, mas já estou ficando louco. Eu não consigo parar de pensar nela e nas coisas que quero fazer com ela. Isso está bem impróprio, é verdade, mas está fora do meu controle. Bastava fechar os olhos para imaginar o toque de nossos lábios; minha língua devorando a sua; seu corpo quente colado ao meu; seu aroma de cravo inebriando meus travesseiros; sua pele branca sendo revelava e se tornando meu lugar favorito em todo o mundo.
Encarei-a. Ela estava corada a respirou fundo quando sentiu toda a intensidade do meu olhar. Aproximei-me e ela recuou. Fiquei com medo de estar sendo dispensado, mas ela sorria, como se estivesse se divertindo às minhas custas. Bem, aquela era uma péssima ideia. Avancei. Mais rápido, mais feroz. Suas costas foram de encontro à parede e, com os braços, encurralei-a. Ela não desviou o olhar dessa vez. Aproximei meu rosto até que nossos lábios pudessem, suavemente, se encostar. Ela entreabriu os seus e eu fiquei satisfeito. Ela não estava tentando fugir de mim. Minhas mãos tomaram sua cintura e eu a puxei na minha direção, arrancando-lhe um suspiro sôfrego. E finalmente eu a beijei. Eu já beijei algumas mulheres na vida, mas nunca imaginei nada parecido com o que estou sentindo nesse momento.
O tempo parecia não passar para nós dois. Minhas mãos adentraram sua camiseta e subiram, cheias de boas intenções. Para minha surpresa (e deleite!) ela estava sem sutiã. O suspiro, dessa vez, foi meu. Assim que toquei seus mamilos, deixamos escapar gemidos baixos e torturados. Não aguentei e retirei sua camiseta de uma só vez, finalmente podendo admirar seus seios fartos sem empecilhos. Instantaneamente senti minha boca salivar. Talvez estivesse indo rápido demais, não queria assustá-la. E não a assustei. Foi Rafaella quem puxou minha boca em direção aos seios expostos.
E foi ela quem decidiu guiar as próprias mãos em direção ao cós da minha calça. E então, só então, eu me lembrei: ela não sabia. Assustado, afastei-a. Ela não entendeu nada, mas eu não sabia como começar a explicar. Inevitavelmente, me senti inseguro e temeroso, como o Noah de doze anos, que fez sua primeira namoradinha chorar. Lara. Quando descobriu sobre mim, ficou chocada e indignada. Eu devia tê-la alertado antes do primeiro beijo. Ela se sentiu traída... E a culpa era minha, embora todos tentassem me convencer do contrário. Eu queria me envolver com alguém sem ter que lhe dar uma carta de instruções. Ao fazer isso, correria menos risco de ser tratado como um produto defeituoso que precisa de devolução. O problema é que eu queria poder viver todas as etapas de um relacionamento como uma pessoa normal. Sem ter que explicar e muito menos alertar.
Eu sabia que esse era um dos motivos para não agarrar a ruivinha na primeira oportunidade. Sabia que ser recusado por ela destruiria meu coração (novamente) e seria muito, muito difícil remendá-lo. Havia certo receio de me apaixonar, é verdade, mas o maior receio provém do jovem de doze anos que não quer ser acusado de enganar ninguém. Não quero andar com uma faixa na testa dizendo: "Atenção! Homem trans!". Isso por acaso é crime? Rafa ainda estava ali, mordendo o lábio e se sentindo rejeitada. Mas eu não a estava rejeitando... Só não conseguia lidar com o dilema entre contar agora ou quando me sentisse pronto. Será que ela se sentiria enganada, como a Lara? As lágrimas vieram e...
Acordei. Chorando. E entendendo um pouco mais de onde vinha tanto receio. Beijar dezenas de bocas no carnaval sabendo que você nunca mais verá a pessoa na vida? Fácil. Eu estava pronto para isso. Mas não estou pronto para me envolver com uma garota incrível que pode (ou não) me descartar. E aquilo, precisamente aquilo, estava me fazendo ir com calma. Eu queria conhecer a Rafa primeiro, embora isso não pudesse me garantir uma boa aceitação de sua parte. As pessoas possuem a capacidade de nos surpreender, mas nem sempre de forma positiva.
Levantei da cama, ciente de que precisava de um copo d'água e ar fresco. No caminho para a cozinha, no entanto, ouvi vozes femininas. Não costumo ser enxerido nem nada, mas me aproximei da porta de onde vinha o som. Marcela e Nina conversavam e embora eu não conseguisse ouvir o que a minha cunhada dizia, a voz de sua melhor amiga se fazia bem clara.
− Eu adoraria me apaixonar pelo Noah, sabe?! Ele é incrível e o Stéfan não é nem metade do homem que ele é – bom, estávamos de acordo em alguma coisa. – Mas a mente e o coração não parecem funcionar em sincronia. Embora o ame, é com o Stéfan que coisas estranhas acontecem. Sinto meu estômago revirar, minhas mãos suarem e minhas pernas bambearem. E eu nunca havia sentido isso. Não digo que o amo, afinal, esse é um sentimento que deve ser plantado e cultivado. Mas sinto algo, que não sei o que é, e não posso controlar. Não o acho uma pessoa ruim, se quer saber. Ele é generoso, gentil, solícito, bem humorado... Mas se esconde atrás de atitudes babacas. E é aí que está o problema.
Quis abrir a porta e dizer que não era bem assim. Stéfan não tem apenas atitudes babacas. Ele é um babaca completo. Do tipo que transa com a chefe casada, dá em cima da funcionária nova e está pouco se fodendo com a possibilidade de alguém sair machucado da história. Desculpe-me, mas homens de verdade não fazem isso. Babacas fazem. Fim da história.
Esse rolo todo acabou sendo positivo, no fim das contas. Tirou minha atenção do recente pesadelo revelador. Quando peguei o celular, pronto para mandar uma mensagem para a ruivinha da porta da frente, recebi uma notificação de outra pessoa. Abri e...
Fiquei muito, muito feliz com o que vi. Candela havia acabado de me enviar uma foto vestindo o uniforme de uma boa cafeteria argentina. Uma segunda imagem veio logo em seguida. Nessa, ela estava acompanhada do Martín, que a abraçava e sorria tão intensamente quanto ela. Aquilo me deixou realmente contente e me fez relaxar um pouco. Aquele improvável casal estava dando certo. Mesmo com todas suas singularidades e dificuldades, eles estavam felizes e juntos. Eu ainda podia ter esperança de viver uma história como aquela...
Só não conseguia dizer com certeza se Rafaella seria sua protagonista ou não.
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Cheguei! Escrevi esse capítulo aos trancos e barrancos. Uma parte foi escrita no avião, na volta de São Paulo (e, pasmem, no meio de uma turbulência). Outra parte foi escrita no meu caderninho e, por fim, digitei as últimas palavras no meu notebook. Muitos leitores têm se perguntado por que o Noah tem se refreado tanto em relação a Rafa e acho que essa explicação precisava chegar nesse momento. Calhou de ser no dia da visibilidade trans e enfatizo: não acredito em coincidências. Espero que vocês gostem do capítulo e que possam mergulhar ainda mais fundo no universo do meu tão amado Noah ♥ Beijos de luz no coração de vocês e até quarta-feira.
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SINGULAR (degustação)
RomanceSINGULAR é um spin-off independente de PODER EXTRA G; narrado pelo Noah, personagem secundário da trama que ganhou muitos admiradores. Se você ainda não conhece a Nina, trate de ler sua história e dar boas risadas. Sinopse: Noah sempre quis s...