Capítulo 51

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            O gatinho preto e assustado foi batizado de Frajola em virtude da hashtag criada por Manoel, que tentava, na internet, conseguir um lar adotivo para o bichano do qual cuidávamos. Em seu apartamento, mais conhecido como "apê fabuloso", providenciamos banho, alimentação e cuidados médicos para o Frajola, que parecia um gato doméstico que vinha, no entanto, sofrendo agressões constantes. Embora os dois amigos parecessem eficientes, perguntei-me o motivo de cursarem biologia, não veterinária.

− Eu cortaria os meus pulsos se tivesse que lidar constantemente com animais machucados – Rafa confessou com sinceridade, enquanto dava leite ao felino.

− E queremos investir na área dos estudos – Manoel complementou, falando pelos dois. A ruivinha assentiu alegremente.

− Sem contar o nosso fascínio pelas plantas... – acrescentou, sorrindo para mim e seu amigo.

Nas horas seguintes, providenciamos todo o necessário para proporcionar ao forte Frajola uma recuperação rápida. Manoel foi o primeiro a ganhar a confiança dele, que sem dúvidas tinha suas razões para ter pulgas atrás das orelhas quando o assunto eram os humanos. Quando deixamos o "apê fabuloso", um lugar pequeno, mas aconchegante e muito bem decorado, voltamos para o nosso apartamento. Fizemos um lanche rápido, pois precisávamos nos arrumar para cair no samba na Marquês de Sapucaí. Marcela chegou alguns minutos depois da gente e... Ela estava acompanhada. Do Stéfan, é claro. Eu sabia que teria de lidar com ele ainda naquela segunda-feira, mas fui pego de surpresa. Ele sorriu na nossa direção e cumprimentou a minha garota primeiro.

Seu sorriso de bom moço e seu tom educado tiveram um efeito positivo na Rafa, como tinha na maioria das garotas. Sem ser indelicado ou grosseiro, ele foi galanteador e receptivo. Na hora de me cumprimentar, no entanto, me estendeu a mão direita com receio... E era bom que tivesse mesmo! Afinal, já tinha ameaçado quebrar sua cara e não hesitaria se fosse preciso. Não gosto de homens como ele... Que vivem fazendo joguinhos quando lhes convém; que tratam as mulheres como objetos desenvolvidos em função do próprio prazer. Ainda assim, tentaria honrar com o combinado. Estendi a mão na sua direção e nos cumprimentamos com apenas a dose necessária de educação e civilidade.

Separamo-nos (felizmente!) logo em seguida. Rafa e eu seguimos para o nosso (notem o pronome possessivo na primeira pessoa do plural) quarto, onde nos jogamos preguiçosamente na cama. Já estava se tornando comum para mim, ansiar por qualquer contato físico, por menor que fosse. Sua pele quente contra a minha era o bastante para me despertar para uma nova realidade, totalmente desconhecida. Com o polegar, acariciei sua mão delicadamente e ouvi um suspiro em resposta. Inesperadamente, ela se virou, se deitando de lado para poder olhar para mim. Fiz o mesmo e me concentrei na bela visão que se desenrolava bem diante dos meus olhos. Separando-nos, estavam apenas o silêncio e a expectativa. Ao contrário do esperado, não foi nada desconfortável. Aquele pequeno momento dispensou palavras, pois havia uma intensa carga nos nossos olhares, nas nossas respirações. Uma declaração silenciosa seguida da outra. Foi como se, por um breve momento, a Terra se esquecesse de girar. Ela parecia ocupada demais admirando nossa cumplicidade tão rápida e intensamente adquirida.

− Meu coração... – ela sussurrou bem baixinho a certa altura, com os olhos fechados. – Parece que vai romper as paredes do meu peito.

− Achei que fosse o único – rebati aos sussurros, sendo agraciado no instante seguinte pelo seu olhar intenso. – Você quer sentir? – perguntei e ela, que apenas assentiu, aproximando todo o corpo do meu. Com a voz rouca e quase inaudível, ela disse:

SINGULAR (degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora