[NOVA VERSÃO] CAPÍTULO 09

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O clima de férias já havia me alcançado. Eu não precisava mais me preocupar com as provas ou qualquer problema referente à faculdade – só se fosse azarado o suficiente para ficar reprovado em alguma matéria. Minha única missão era ajudar a Marcela na tentativa de deixar seu apartamento o mais aconchegante possível, em tempo recorde. Ficávamos trabalhando lá constantemente e o cansaço era tanto que em algumas noites até dormi lá. Nesse meio tempo, nós conversávamos muito e víamos cada vez mais o quanto tínhamos em comum. Eu me sentia confortável na sua presença.

Com Nícolas em outro país e sua livraria sendo administrada por seu gerente e demais funcionários, meu tempo era ocupado apenas com ajudar a minha amiga e ir às reuniões do grupo de apoio... E por falar nas reuniões, naquela semana Candela havia prometido comparecer. Eu não sabia como iam as coisas entre Martín e ela, mas tentava ser otimista a respeito. Sabia que cedo ou tarde, quando fosse o momento, um dos dois acabaria me revelando algo.

Passei o dia todo ajudando a pintar as paredes do apartamento da Marcela, e ao final da tarde fui ao grupo. Na porta, me deparei com Candela, hesitante, do lado de fora, usando um casaco de capuz maior que o próprio corpo. Não pude ver seu rosto com nitidez, mas tinha certeza que se tratava dela. Gentilmente, toquei seu braço, mas acabei assustando-a. Ela parecia apreensiva.

− Calma, Cande. Sou só eu... – pensei que ela se viraria na minha direção, mas não o fez. Continuou de costas para mim, como se me escondesse algo. – Ei, está tudo bem? – Candela continuou muda, se encolhendo mais e mais. Parecia envergonhada e do nada começou a chorar. Eu havia feito algo de errado? Estava muito preocupado com ela, só tentando ajudar... – Cande, o que está acontecendo? Fale comigo. Eu... – ela se virou só um pouquinho, mas o suficiente para eu perceber que havia algo de errado com o seu rosto. – O que aconteceu? Isso... Isso... Foi o Martín? – questionei, com medo da resposta, embora duvidasse seriamente daquela hipótese.

− Não foi o Martín. Ele é um doce... – foi tudo o que ela disse, secando as lágrimas (ou pelo menos tentando). Aproximei-me, mas ela rapidamente se afastou. Céus, o que estava acontecendo?

− Cande, por favor, você pode confiar em mim. – sussurrei. Sem pensar duas vezes, seguindo o meu coração, puxei-a para um abraço apertado. Ela relutou no começo... Tentou se afastar, gemendo de dor e medo, mas eu não a deixei. Apertei meus braços ao redor de seu corpo e esperei que ela desistisse de me afastar. E depois de alguns momentos, ela desistiu. Seu pequeno corpo se acomodou ao meu e antes que eu pudesse voltar a questioná-la sobre o ocorrido, ela começou a soluçar, inconsolável.

Não era um choro qualquer, preciso enfatizar. Havia nele tanto desespero, dor, raiva e frustração misturados. Ela tremia muito, enquanto seu rosto continuava a ser inundado por novas lágrimas. Eu sabia de que nada adiantaria tentar conversar naquele momento. Candela não conseguiria falar... Não com tanta coisa a sentir, explodindo de dentro dela. Então eu só continuei ali, abraçando-a bem forte, tentando, desesperadamente, lhe dar o meu melhor suporte silencioso.

O chuvisco da noite que se aproximava começou a apertar. Temendo que ficássemos doentes, eu a levei em direção ao meu carro, estacionado não muito longe dali. Eu a acomodei no banco do carona, assumi meu lugar e dei partida, rumo ao apartamento da Marcela. Eu precisava da ajuda da minha amiga, porque realmente não sabia lidar com tudo aquilo. Pensei em levá-la até o Martín, mas algo me dizia que, nesse momento, uma ajuda feminina seria muito mais útil.

E bem, parece que eu estava certo.

Eu e Cande ficamos parados na porta do apartamento da Marcela. Cande ainda tentava esconder o rosto no capuz de seu casaco. Assim que a porta se abriu, o olhar da Marcela pareceu surpreso e chocado. Mas, para nosso total alívio, não houve questionamentos. Ela nos deu passagem e rapidamente sumiu pelo apartamento, retornando, instantes depois, com duas toalhas, além de uma muda de roupa. Uma calça de moletom e uma camiseta larga.

SINGULAR (degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora