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Luísa
Terminei de passar meu perfume e já comecei a ouvir a bateção na porta.
- Bora Luísa, já é onze da noite cacete! - Minha mãe berrou pela milésima vez.
Que merda do caralho, não pode nem se arrumar tranquilamente que já vem encher.
- Já vou caralho! - Berrei.
Minha mãe na mesma hora invadiu o quarto.
- Fala de novo essa merda que eu arranco teus dentes em um único tapa! - Minha mãe disse me olhando séria.
Eu bufei saindo do quarto e dando de cara com Samira enfiando o pé no tênis, Vinicius encostado na porta, e meu pai com o narguile eletrônico dele, ele fumava sempre essa merda, não tinha nada mais e nada menos que água e algum sabor.
Dezesseis anos e o senhor Fumaça ainda sofre com a falta do cigarro.
- Demora em, foi fazer a roupa? - Meu pai perguntou se levantando e eu revirei os olhos.
Meu irmão foi abrindo a porta e meu pai fechou com tudo.
- Bagulho é o seguinte, quero ninguém bebendo álcool e ficando louco, quiser beber, beba mas quero ninguém passando mal perto de mim, fumando, usando qualquer porra de droga, e nem sumindo pra meter, tão ouvindo? - Meu pai disse sério.
- Sim! - Respondemos todos juntos.
Meu pai abriu a porta e a gente foi direto pro carro, entramos em silêncio até um certo ponto do caminho.
- Outro ponto, se caso baixar polícia por lá, cês já sabem! - Meu pai disse.
Ele logo emendou uma outra conversa com a minha mãe, eu tava era com preguiça de sair da favela pra ter que ir no meio do mato comemorar o aniversário do Caveira.
Caveira tem merda na cabeça.
- Pra que tão longe? - Samira falou.
- Fogo no cu! - Respondi.
Porra, achei que tava saindo do Rio, só me dei conta que ainda estávamos, por conta da vista do mar que não havia sumido ainda.
Meu pai entrou por um caminho de terra, lugar escuro demais, ficamos uns dez minutos naquela estrada péssima, sem luz, e nem sinal de celular. Quando vimos lá no fim uma luz, meu pai disse que era logo ali.
- Se eu soubesse eu tinha vindo de bota, essa merda de barro vai sujar todo meu salto. Vai me carregar em Fumaça! - Minha mãe disse.
- Caveira inventa de fazer aniversário em cada lugar, que merda tinha de fazer lá na favela caralho! - Meu pai disse.
Pelas conversas que meus pais falavam, eu tinha me ligado que não teria gente "avulsa" ali, e sim quem realmente Caveira queria. No caso, envolvidos, mulheres dos envolvidos, alguns caras da Rocinha e a gente, nada de penetra...
Sai dos pensamentos quando meu pai entrou com tudo naquela chácara, ele estacionou logo no começo. Eu desci sentindo o maior ar gelado.
- Frio em? Pra ajudar não trouxe nem blusa de frio! - Reclamei caminhando ao lado de Samira que ajeitava o vestido.
- Será que vai ter uns pitelzinhos? - Samira sussurrou e eu ri alto.
Não demorou muito pra mim sentir um puxão, eu me virei e meu pai encarava nós duas.
- Quero que cês não fiquem de gracinha ai com os manos, eu sei as crias que botei no mundo. Abre o olho! - Meu pai disse negando e saindo de perto.
Eu ri baixinho junto de Samira enquanto caminhava pra perto daquelas pessoas. Tinha cada um com cara de bandido, cada tipo que só por Deus, tinha uns que salvava, mas uns que só pela misericórdia de Cristo.
- Tavam vindo de ré? - Leticia perguntou abraçando minha mãe.
- Reclama não, olha o lugar que o Caveira escolheu. - Minha mãe reclamou.
- E ai Marilda, tá falando mal de mim pra minha mulher, que bagulho feião! - Caveira disse chegando perto e abraçando minha mãe.
- Dava pra ter ficado lá na favela e ter feito os negócios lá né tripa seca, porra tava achando que eu tava na Bahia de tanto que andamos. - Minha mãe disse gargalhando.
- Tem cara do movimento que não pode tá andando na pista assim, por isso... Pra tu ter idéia, nem sinal tem aqui, os canas tá atrás de todo mundo, tem que ficar ligadão! - Caveira disse.
Caveira cumprimentou eu e Samira e logo meu pai se ajuntou a nós.
- Tão falando mal de quem em? - Meu pai perguntou agarrando minha mãe por trás.
- De tu que não era né pulmão convertido! - Leticia disse e meu pai negou.
- Coitado, Fumaça não fuma mais, sofre faz anos com isso! - Minha mãe disse rindo pelo nariz.
- Tu sabe que por ti eu faço qualquer bagulho! - Meu pai disse beijando a bochecha da minha mãe. - Menos dar o cu caralho! - Ele disse encarando a Letícia que logo bufou.
Ouvimos logo um barulho de carro, olhamos pra trás e vimos um sonata entrando.
- É os caras? - Caveira perguntou.
- Cê pá é... - Meu pai respondeu olhando de canto.
Leticia logo apoiou o cotovelo no ombro do meu pai e encarou ele.
- Quer o que em? - Meu pai perguntou encarando ela.
- Não adianta nada tu enfiar a metade da parte pra esse zé ruela que vai vir, o morro é meu, tu me prometeu há mais de quinze anos atrás! - Leticia dizia rindo.
Meu pai riu pelo nariz e negou.
- Tu chapa demais na moral mesmo. Tu não cuida nem de tu, vai cuidar da Rocinha? - Meu pai perguntou.
- E você cuida? Tu não cuida nem do teu pulmão e tá querendo vir falar de mim? To esperando, quando você morrer, já que você é bem mais velho que eu, vai ficar pra mim antes, ai depois que eu bater as botas, reparte pros teus tesouros! - Leticia disse.
- Vou fazer tu cuidar uma semana, quero ver! - Meu pai disse.
- Combinado, em troca te dou uma caixa de eight pra relembrar os velhos tempos em pulmão falido! - Leticia disse rindo enquanto batia nas costas do meu pai.
- Ela chapa demais! - Meu pai sussurrou afastando da gente.
• aperta na estrelinha •
Gentinha do meu coração, peço que respondam... Qual parte do dia vocês preferem os capítulos, manhã, tarde ou noite?
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MUNDO M
RomanceEra uma vez não se encaixa com todas as histórias... Aliás, o era uma vez se encaixa apenas em histórias com finais felizes fictícios, mas e o meu que foi real? Será que se encaixa? BASEADO EM FATOS REAIS! SEGUNDA TEMPORADA DE "...