Não estou largando ninguém

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A ideia de morar em Madrid estava mais real na minha cabeça quando acordei no dia seguinte. Minha cabeça já não estava tão perdida e eu tinha conseguido aprumar o rumo da minha vida, bem, mais ou menos. Ainda me perguntava como o relacionamento que eu achei que seria pra vida toda acabou de uma maneira tão abrupta e esquisita. Busquei enterrar esses pensamentos, porque sentia que ainda tinha muita coisa pra chorar e não queria fazer isso, então estava me mantendo ocupada até não aguentar mais. Era o último dia no City, eu iria apenas para me despedir do pessoal e depois teria alguns dias livres até viajar, meu estômago se revirava em ansiedade e medo, mas eu tentei manter minha expressão firme.

O carro dele já estava lá quando cheguei, como de costume. Eu sabia o horário que ele saía de casa, porque fizemos esse percurso juntos inúmeras vezes nos últimos meses, então passei a sair um pouco mais tarde, pra não lhe encontrar assim que chegasse. Juntei as poucas coisas que decoravam a minha sala em algumas caixas e as deixei em um cantinho pra buscar na hora de ir embora, suspirei quando observei o local tomar a mesma forma que tinha quando entrei pela primeira vez. Vazio e impessoal. Mas, logo outra pessoa deixaria um pouco mais vivo, quando tomasse o meu lugar.

Inconscientemente, passei as palmas das mãos suadas na minha jaqueta e arrumei o óculos de grau no rosto, estava indo até o campo, conversar com Guardiola e me despedir do pessoal todo de uma vez só, o que não tornava as coisas mais fáceis. Os rapazes estavam jogando uma partida quando cheguei, nenhum deles a não ser Alvaréz e meu ex namorado, notou minha presença. Eu ignorei os dois e segui até Guardiola, que anotava algo em seu tablet.

- Osborn. - Ele me cumprimentou ainda sem me olhar. - Imagino que não tenha boas notícias pra mim.

- Eu não sei bem como classificar. - Dei de ombros e parei ao lado dele, observando os jogadores. - Ferran já deve ter te falado sobre meu afastamento do clube.

- Ele falou sim. - Bloqueou o tablet e finalmente me olhou. - Confesso que, quando soube da proposta que Florentino havia feito, cheguei a pensar que você não aceitaria.

- Não aceitei de primeira. - Expliquei e ele maneou o cabeça, vendo que tinha razão. - Mas, tive motivos pra voltar atrás.

- Não sou ninguém pra questionar. - Ele sorriu. - Não cheguei onde estou por acaso.

- Eu só vim me despedir. - Guardiola assentiu. - Gostei muito de trabalhar com você, espero que saiba disso.

- Também gostei de trabalhar com você, Osborn. - Ele segurou meu ombro e apertou. - Sei que vai se dar bem no Real Madrid.

- Eu espero que sim. - Sorri, sem graça.

- Vou reunir os rapazes. - Ele me largou. - Se prepare pra ouvir os choramingos.

Meu estômago se revirou enquanto ele se afastava, eu queria sair correndo e nunca mais olhar pra trás, mas não iria admitir ser covarde na reta final. Engoli o medo, minha boca amargou, mas eu ostentei um sorriso enquanto os rapazes se aproximavam de mim. Dois deles pareciam saber muito bem sobre o que eu iria falar. 

- A doutora Osborn tem um comunicado. - Guardiola disse e se afastou, me deixando no centro de tudo.

- Oi pessoal. - Cumprimentei, de repente morrendo de vergonha deles. - Não vou me prolongar, pra não atrapalhar o treino de vocês.

- Você nunca atrapalha, Ellie. - Alvaréz sorriu se aproximou um pouco mais de mim.

Tive a reação por instinto de olhar pra Haaland, que já não me encarava mais. Seus olhos tilintavam em Julián e eu senti uma sensação conhecida, já passamos por isso muitas vezes.

- Bem. - Mantive meu sorriso e voltei a falar. - Eu vim me despedir de vocês, porquê em breve estarei indo pra Madrid.

- O quê? - Bernardo falou por cima de todos os sussurros que se formaram. - Como assim você vai nos largar?

- Não estou largando ninguém. - Por algum motivo, meus olhos procuraram os dele, que já estavam atentos em mim novamente. Ele baixou a cabeça. - Recebi uma proposta do Real Madrid.

- Meus parabéns. - Julián veio me abraçar. - Eu vou sentir sua falta, mas, é uma grande oportunidade.

- Obrigada. - Retribui o abraço. - É realmente um oportunidade muito boa. - Engoli em seco.

- Eu vou chorar. - Bernardo também veio me dar um abraço. - A Inês vai ficar indignada.

- Juro que volto pra visitar assim que o bebê nascer.  - Ele concordou e abriu um sorriso.

- Você vai fazer falta, Ellie.

- Tudo bem. - Guardiola impediu que as coisas ficassem sentimentais demais. - Sem drama, ela vai se mudar, não morreu.

- E vai se mudar pra algo melhor. - Alvaréz parecia genuinamente feliz. - Talvez eu vá pra o Real Madrid, atrás de você.

- Vamos parando por aí. - Guardiola ralhou.

- Obrigada por todo acolhimento pessoal, desde o começo. - Retomei meu monólogo. - Vocês são incríveis e foi incrível trabalhar com vocês.

- Vai ser difícil encontrar alguém que consiga substituir você. - Ederson disse. - Mas vamos estar por aqui, torcendo sempre pelo seu melhor.

- Eu não tenho dúvidas disso. - Garanti. - Passo pra fazer uma visita sempre que puder.

- Vamos cobrar. - Foden, que estava calado e distante até então, falou. Ele estava sério e provavelmente tentando entender tudo que estava acontecendo, era um problema pra o Haaland resolver. - Não pense que vai nos largar assim e sumir.

- Isso não vai acontecer. - Ele assentiu, olhando dentro dos meus olhos.

- Eu não vou deixar de te ver. - Grealish deu de ombros, mas veio me abraçar. - Quando você menos esperar, vou estar no seu quarto de hóspedes.

- Tô sabendo. - Ri do que ele disse.

A conversa se estendeu por mais meia hora, abracei alguns rapazes, outros apertaram minha mão, mas todos me desejaram boa sorte. Haaland não chegou a meio metro de mim, observou tudo de longe, com os braços cruzados e ignorando os olhares de dúvida direcionados a nós. Ele teria muitas perguntas pra responder e eu estava feliz por não ser ele. Quando consegui falar com todos, voltei pra minha sala e comecei a carregar as caixas até meu carro.

- Ellie! - Alvaréz apareceu lá. - Quer ajuda?

- Eu aceito. - Sorri, aceitando a aproximação porquê já não havia mais um namorado ciumento ao qual eu devia respeito.

- Você nos pegou de surpresa. - Ele empilhou três caixas e as ergueu. - Agora que estávamos acostumados.

- Também fui pega de surpresa. - Ele assentiu.

- Você vai quebrar tudo lá. - Riu. - Vou ficar com medo porque os caras vão estar em forma quando forem jogar contra nós.

- Eu não vou ter nada haver com isso. - Sorri e ele parece querer perguntar algo, que eu sabia exatamente o que era, mas ele foi interrompido quando as portas do elevador se abriram e demos de cara com Erling.

Ele piscou algumas vezes e alternou o olhar entre nós antes de sair do caminho pra que pudéssemos passar. Ficou claro que alguma coisa havia acontecido.

- Eu não vou nem perguntar. - Alvaréz deu de ombros.

- Obrigada. - Esbocei um sorrisinho mínimo.

Yuànfèn - Erling HaalandOnde histórias criam vida. Descubra agora