3 || Eu quero acreditar

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⚠️ Conteúdo sensível: abuso de álcool, ansiedade⚠️

A segunda-feira na qual ele prometera parar de beber havia chegado. Os inoportunos contratempos ebriosos ultrapassaram os limites. Em menos de 24 horas fora expulso de um bar, por comprar briga com um homem que o olhou torto, caíra em uma vala e reencontrara seu primeiro — e único — amor. Nada daquilo parecia real. Não poderia ser.

Passara a madrugada encarando o fundo do copo a rodar em suas mãos entre as doses de aguardente, não deveria confiar na própria visão. Especialmente quando sua visão o dizia que havia duas fadas rodopiando pelo teto.

Sujo, cansado e, agora, delirante. Evan, você se superou.

Alguns metros acima deles, as duas garotas planavam descontraidamente. Risos melódicos ecoaram como uma doce canção de ninar. Cerrou os olhos e chacoalhou a cabeça, com o intuito de escapar daquele sonho esquisito, mas nada aconteceu.

Continuava ali, frente a frente com aquelas criaturas de contos de fadas. Numa ocasião diferente, teria as achado cômicas e seria capaz de rir com elas. Naquele dia, Evan não estava em seu melhor estado de espírito.

Asas cintilantes como letreiros em neon tremulavam mais rápido do que conseguia acompanhar. Alguns instantes depois, elas pararam de rir e começaram a conversar. A língua lhe era completamente estranha, o que por si só era notável. Devido às imposições da mãe e natureza de seu trabalho, Evan possuía em sua bagagem de poliglota um impressionante rol de idiomas exóticos.

Tinha dúvidas quanto ao que era mais absurdo: enxergar fadas ou considerá-las extremamente atraentes. Quem sabe o maior dos absurdos fosse Elena — a original, não uma sósia — diante de si. Todavia, poderia ser somente o fato de achá-la tão bela quanto achara no dia em que a conhecera. O fato de que seus sentimentos nunca mudaram.

Aos vinte e quatro, Evan ainda a seguiria aonde quer que ela fosse assim como o menino de oito anos o faria. A menina de olhos dourados e cabelo castanho acobreado exercia um forte poder persuasivo sobre ele.

Fora apresentado a ela em uma das muitas festas de confraternização da empresa do pai. Em meio aos acionistas, diretores, gerentes e seus filhos igualmente enfadonhos havia uma família que se destacava dos demais tanto pela aparência quanto pelo comportamento. Em meio ao tédio do evento, se divertiam. Aquilo o marcou, pois era algo inédito.

O homem chamava-se Carlos e era o novo assessor de seu pai. A esposa dele, Luna, era confeiteira. E a garota de vestido amassado, que resmungava enquanto a mãe recolocava a tiara em sua cabeça, era Elena. A mesma garota que haveria de ser a razão dos seus hematomas ainda naquela noite.

Depois de o pai fazer as honras e o apresentar à família Fernandes, Elena o chamou para brincar. Ainda que não o devesse, visto que sua mãe detestava algazarras e o proibira de envergonhá-la na frente dos convidados, ele a seguiu.

Durante a brincadeira de pega-pega, Evan pensou ser capaz de alcançá-la. Ela, que sempre fora pequena e esperta, passava por entre as pernas dos adultos sem qualquer repercussão. Vendo a facilidade com que ela se esgueirava, decidiu fazer o mesmo.

Como era alto e desajeitado, acabou esbarrando na mão de um dos acionistas e o fez derrubar vinho em sua camisa branca. Um crime imperdoável aos olhos de sua mãe, que deu cabo de sua punição.

Ah, Elle... Tinha que ser você, não é mesmo? O presente não lhe parecia muito diferente do passado. Mais uma vez estava metido em encrenca e mais uma vez Elena estava envolvida.

Evan se controla! Ele censurou-se. Tá achando que ainda é adolescente pra ficar "Elle pra lá, Elle pra cá"? E essas fadas? Tá tão carente assim? Até mulher que voa você inventou!

Planeta LuzOnde histórias criam vida. Descubra agora