Uma hora e meia antes do despertar de Solis, Luuk parou à porta do quarto delas e tocou a campainha. Atende, desejou avidamente quando o tempo de espera extrapolara o considerado normal.
Estalava os dedos, estranhando a demora. Àquela hora, Zoya deveria estar mais do que acordada. Exemplo de pontualidade, sempre se mostrava preparada muito antes do horário combinado. Era pouquíssimo provável que ela ainda estivesse dormindo.
De fato, ela não estava. Não o atendera imediatamente em decorrência da curiosidade que a paralisou. O vibrar de sua pulseira, notificando-a sobre a presença dele, havia lhe preenchido de estranhamento.
O imediato dela poderia muito bem utilizar-se do acesso irrestrito garantido a ele e "entrar sem bater". Então, por que tinha pedido permissão para entrar?
Desacostumada com o respeito à privacidade, um conceito que não existia em Rawin, pôde pensar apenas o pior sobre o ingênuo gesto de Luuk. Demência precoce, trauma craniano, lobotomia; cogitara tudo o que pudesse acometer a cabeça dele e modificar a atividade neural.
A doutrina da Cúpula enraizara-se tão profundamente em seu ser que, ao deparar-se com algo que fugia a norma, retraía-se e reprimia essas ideias. Em sua lógica limitada, o comportamento atípico de Luuk tratava-se de alguma doença. Vontade própria estava fora de cogitação.
Enquanto Luuk aguardava, dúvidas sobre suas decisões surgiram. Estava mesmo fazendo a coisa certa? O que Zoya iria pensar? Como reagiria? Era ela quem estava no comando, ele dependia da colaboração dela. Uma colaboração que viria a passos lentos, para seu desgosto.
De volta à realidade, Zoya o recebeu. Com uma cordialidade exacerbada, Luuk encheu-a de perguntas acerca da saúde de Elena tentando se passar por despretensioso. Contudo, à Zoya ele não enganava.
Mais cedo ou mais tarde ela descobriria a natureza do interesse dele. Por enquanto, ela relevaria suas atitudes suspeitas e ouviria o que ele tinha a dizer.
— Tem certeza de que ela tá bem? — insistiu.
— Absoluta. No fim da tarde de ontem, quando a visitei na enfermaria, ela estava meio sonolenta por conta dos analgésicos, mas foi devidamente alimentada e repousou bastante. Está dormindo desde a hora em que chegou.
— Não acha que deveríamos checar o estado dela de novo? Ela não me parece — Zoya olhou-o de soslaio antes de ele terminar a desculpa esfarrapada, mostrando-o que havia detectado sua mentira — bem.
— Você poderia me lembrar por que está aqui em vez de estar cuidando de seus assuntos que também são meus assuntos? — inquiriu Zoya.
Assuntos pendentes não lhes faltavam. Como os principais responsáveis pelo treinamento, precisavam testar o funcionamento de cada etapa dele separada e minuciosamente. Entretanto, lá estava Luuk ocupando-se de algo que nada tinha a ver com o seu trabalho.
Por isso, Zoya precisava de uma explicação concreta. E uma das boas. Não o dispensaria do serviço sem saber por qual motivo ele se intrometia tanto nos assuntos da terráquea. Seria ele uma alma piedosa que se preocupava com o bem-estar dos mais frágeis?
— Só estou um pouco receoso — respondeu, por fim. — Você sabe — deixou suas justificativas implícitas, pairando no ar.
— Sei... — tentou soar compreensiva, por mais que seu tom de voz dificultasse suas tentativas de comunicação empática e esta não fosse um de seus pontos fortes.
Depois de um breve silêncio constrangedor, sugeriu que ele acompanhasse Elena e a auxiliasse no que fosse preciso. Presumira que isso o acalmaria. No entanto, a impressão de que havia algo de errado a impeliu a alertá-lo sobre os perigos de agir ilogicamente:
VOCÊ ESTÁ LENDO
Planeta Luz
Science Fiction+16 | Completo | Um acontecimento inusitado leva Elena à maior aventura de sua pacata vida: uma jornada ao Planeta Luz. Perdida neste incrível mundo, ela precisa se encontrar em meio ao caos e lutar contra forças desconhecidas. A força de Elena Fern...