Domingo, 14 de abril.
Eu estava em um porão, sozinha e com fome.
Meu padrasto me prendeu aqui para que eu aprendesse a respeitá-lo. Estou em um porão, sem água, sem comida e sem nada.
E pra quê?
—Cadê a Dy?
Eu ouvi enquanto estava agachada no chão sujo e fedorento. Era a voz da minha mãe lá de cima.
Rastejei até a porta, começando a gritar e bater com todas as minhas forças.
Passaram-se cinco minutos, ou mais... não sei exatamente, antes dela aparecer e abrir a porta para mim.
Seu olhar parou sobre o meu corpo e tudo o que eu vi foi vazio e indiferença, como se eu não fosse sua filha, como se o Henry não tivesse me prendido em um porão por quase nove horas, como se eu não tivesse sido espancada até desmaiar pelo meu padrasto.
— Vá para seu quarto. — ela disse e se virou, deixando a porta aberta para mim.
Eu suspirei e rastejei até subir as escadas. Meus joelhos ainda estavam doloridos e meu rosto estava marcado com os dedos do meu padrasto pelos socos.
— Suma da minha frente antes que eu te bote de volta no porão. — disse meu padrasto enquanto ele estava sentado no sofá, bebendo cerveja.
Olhei bem nos seus olhos e balancei a cabeça, rastejando até o quarto.
O que foi que eu fiz? Pai, por que me deixou? Eu não fui boa o bastante, é isso?
Me olhei no espelho da penteadeira, eu estava terrível. Em poucas semanas eu perdi dez quilos. Eu não me alimentava bem, eles não me davam comida. Eu limpava a casa todos os dias, cozinhava. Fazia de tudo e sem comida e as vezes, água.
Depois de um tempo me olhando, escuto a porta batendo.
— Entre. — sussurrei sem voz para falar mais alto.
— Eu trouxe um pouco de comida. — minha mãe disse, colocando a bandeja na cama.
— Filha, por favor, não desrespeite mais o Henry — ela pediu baixo, evitando olha nos meus olhos.
Balancei a cabeça, sem ter mais o que fazer. É sempre a mesma coisa, ela diz as mesmas palavras.
— Pode se retirar, mãe. — ignorei-a e entrei no banheiro.
Enquanto a água caía sobre mim, aproveitei para chorar. Estou tentando ser forte, mas não consigo, pai. Estou tentando proteger a mamãe, mas também não consigo. Desculpa por ser fraca, pai.
Saí do banheiro enrolada em uma toalha.
Me assustei ao ver Henry sentado na cama, me olhando de cima a baixo, com um sorriso nojento no rosto.
— O que você quer? — perguntei, me enroscando ainda mais na toalha.
— Na verdade, tenho algo em mente... — ele respondeu com um tom sugestivo.
Senti um desconforto imediato e rapidamente fui até a porta.
— Não me importo com o que está pensando, apenas saia do meu quarto — disse, tentando parecer firme.
Ele se aproximou lentamente, bloqueando a minha saída.
— Você é igual às outras. Não passa de uma vadiazinha querendo abrir as pernas — ele disse puxando meu braço com força.
Isso era nojento e repugnante de todas as formas possíveis. Mas a ideia de confrontá-lo diretamente me assustava.
— Me deixe em paz. Não quero nenhum tipo de relação com você — respondi tentando puxar meus braços e me afastar.
Nesse momento, escuto o barulho da porta do meu quarto se abrindo.
— Dy...— minha mãe finalmente quebrou o silêncio.
Fiquei paralisada, incapaz de dizer qualquer coisa. Meu coração acelerou e as lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto. Eu esperava amor, compaixão, alívio, mas tudo o que encontrei nos olhos dela foi indiferença.
Henry rapidamente afastou-se, com um olhar de frustração.
Eu queria correr para os seus braços, buscar abrigo e consolo, mas algo me impedia. Era como se eu fosse invisível para ela, como se eu não fosse mais a sua filha, como se eu fosse uma inimiga para ela.
Uma rival...
— O que você está fazendo aqui, hein mulher?
— Bem, você disse que ia só pegar uma coisa e não...
— Vamos.
Eles saíram do quarto, enquanto eu prendia a respiração e tentava processar o que acabara de acontecer. Senti uma mistura de medo, raiva e tristeza no peito.
Suspirei alto indo até o armário. Vesti o short curto azul, que deixava minhas pernas mais brancas do que já eram. Coloquei um grande moletom branco por cima tentando cobrir as minhas pernas.
Após amarrar os fios marrons no alto da minha cabeça em um coque bagunçado, dei uma olhada no espelho e gostei do resultado. O coque dava um aspecto despojado ao visual, enquanto os cabelos soltos emolduravam meu rosto.
Finalizei o look colocando um par de pantufas nos pés.
Voltei para a cama com o meu diário na mão. Era a única coisa que ainda me fazia sentir viva.
Querido diário
Estou cansada de tentar agradar a todos e me sentir constantemente sozinha. Eu sei que você não está mais aqui para me ajudar, mas eu sinto sua falta. Sinto falta de ter alguém que me apoie e me defenda como você fazia.
Eu sei que você amava minha mãe e queria que fôssemos uma família feliz, mas desde que você se foi, as coisas mudaram. Ela se casou novamente, e agora estamos morando com Henry, ele é horrível. Eu não entendo por que ela permite isso, por que ela não me defende.
Eu tento ser compreensiva, tento aceitar tudo, mas está cada vez mais difícil. Eu sinto que estou perdendo a cabeça, que estou perdendo a mamãe.
Eu sei que você me ensinou a lutar pelos meus sonhos, a ser forte, mas parece que tudo isso se perdeu depois que você se foi. Eu sinto muito, pai, sinto por não ser forte, sinto por não estar conseguindo defender a mamãe.
Eu só queria que você estivesse aqui para me ouvir, para me dizer o que fazer, para me abraçar e me dizer que tudo vai ficar bem. Mas eu sei que isso não vai acontecer, que você não vai me abraçar e dizer que tudo vai ficar.
Eu prometi cuidar da mamãe e não vou desistir, pai. Vou cuidar dela, eu não vou te decepcionar. Vou ser forte, vou te deixar muito orgulhoso de mim.
Pai, onde quer que você esteja, por favor, não fique triste. Eu vou resolver tudo.
Eu te amo e sinto sua falta todos os dias.
Com amor.
Sua borboleta.
— Que merda você está fazendo parada aí?
Meu padrasto entrou já gritando no quarto e mais uma vez ajeitei o short que eu estava usando.
Eu sei que devo usar coisas mais longas, mas não tenho dinheiro e o Henry fez de tudo para que eu continuasse a usar essas roupas. A prova disso é que ele proibiu a minha mãe de me dar dinheiro deste que botamos os pés por aqui.
— Eu fiz alguma coisa? — perguntei baixo, saindo da cama.
Fechei o diário com cuidado. Coloquei-o de volta na gaveta, ao lado da minha cama, rezando que ele não tenha visto.
— Não escutou sua mãe te chamando? Achar que tem emprego? Isso é falta de uma boa surra.
— Já estou saindo.
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Intenções Perversas
RomanceDaysha Cupper, uma jovem evangélica de 17 anos, que enfrenta a mais dolorosa das dores: a perda de seu pai. Envolta em luto e lutando contra a depressão, ela se isola, buscando refúgio em sua própria solidão. Mas o silêncio de sua alma é perturbado...