Capítulo 23

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Alicia saiu caminhando com Maia nos braços e a mais nova não soube como reagir. Tinha passado seus braços em volta do pescoço da veterinária, mas estava encarando o rosto sério da mesma sem reação desde que se viu nos braços da mulher. Não poderia negar que estava se sentindo segura ali, nem que o fato de estar ali havia feito-a parar de tremer. Aos poucos voltou a raciocinar e, finalmente, reparou no ombro esquerdo de Alicia. Havia um corte no tecido azul, próximo ao ombro. As bordas do tecido estavam úmidas e Maia arregalou os olhos ao notar que era sangue. Com cuidado ela levou seus dedos da mão direita até o rasgo no tecido.

- Você está machucada – disse a mais nova assustada tentando enxergar por dentro do corte para definir o tamanho do ferimento.

- Não é nada – disse Alicia sem se importar muito com a mão de Maia sobre o rasgo do tecido – Foi só um arranhão.

- Alicia me coloque no chão agora! Você está sangrando – falou a mais nova num tom de exigência e preocupação.

- É só um arranhão, não precisa se preocupar Maia – falou a veterinária com calma mostrando que realmente não se importava e sem diminuir o passo como se dizendo que não pararia – Vou cuidar disso assim que te deixar no seu quarto.

Maia queria reclamar, queria fazer com que ela colocasse-a no chão e arrumar algo para cuidar daquele ferimento. Mas ainda estava com as pernas fracas pelo susto e tinha plena consciência de que, mesmo se não estivesse assim, nunca conseguiria caminhar mais rápido do que Alicia. Sem escolhas além de aceitar que seria carregada até seu quarto ela decidiu se conformar. Soltou um suspiro derrotado e apenas colocou sua mão direita contra a base do pescoço da veterinária. Deitou a cabeça no ombro não ferido de Alicia, seu rosto parcialmente escondido no pescoço da mais velha. Sentiu os braços a trazerem mais para perto e se permitiu fechar os olhos.

Alicia tentou, mas não conseguiu conter um pequeno sorriso ao sentir a mais nova se aconchegar em seus braços e relaxar. Ainda estava com a adrenalina alta e realmente não sentia dor no ferimento do ombro. Mas ela sabia o que havia causado o corte. Fora o resultado do último erguer-se de Angel, quando ela chegou perto o bastante para conseguir alcançar a guia e as rédeas. Havia estado perto demais dos cascos bem cuidados da Puro Sangue Inglês. Perto demais para que ela conseguisse desviar completamente quando a égua voltou ao solo. O casco dianteiro havia batido em seu ombro, quase de raspão. Ela havia ouvido o tecido da camisa rasgar, mas não havia se dado conta, até a observação de Maia, que estava sangrando.

Continuou seu caminho com a menor em seus braços. Ainda estava surpresa com o quão leve ela era, ou talvez fosse apenas o efeito de toda a adrenalina que ainda não havia se dissipado. Mas Alicia não conseguia evitar o pensamento de que Maia Almeida era uma criatura frágil da qual ela queria ser capaz de cuidar para sempre, mesmo que ela soubesse que essa constatação era apenas uma impressão falsa. Ainda pensando sobre o quanto queria cuidar da mais nova elas entraram na cozinha da casa principal. Antonieta e Maria eram as únicas ali e ambas se levantaram assustadas da mesa onde estavam sentadas ao verem as duas mulheres entrarem pela porta aberta.

A veterinária não deixou que elas a parassem, falou por alto que houvera um pequeno acidente, mas que estavam todos bem. Explicou que Maia apenas havia ficado muito assustada e que ela a estava levando para descansar em seu quarto. Antes de sair da cozinha pediu apenas que Antonieta preparassem um chá de camomila para elas e levasse para o andar superior. Maia apenas concordou com o que ela falava e se manteve abraçando o pescoço da veterinária enquanto estavam na cozinha. Assim que chegaram próximas as escadas ela voltou a deitar a cabeça no pescoço de Alicia.

A maior tentou se manter calma, não queria que Maia ouvisse o bater acelerado e irregular de seu coração. Muito menos que ela percebesse que ela estava segurando diversos suspiros, um para cada vez em que a menor se movia fazendo seu nariz se arrastar por seu pescoço. A subida da escada trouxe lembranças para ambas e, talvez por isso, Maia não tenha relacionado o bater acelerado do coração da veterinária com seu rosto colado ao pescoço dela. Alicia não pode controlar seus parâmetros cardíacos, seria impossível mesmo que ela tentasse. Ainda se lembrava de qual quarto havia visto Maia entrar, mas confirmou com ela para ter certeza. Abriu a porta com certo esforço, não queria deixar Maia sair de seus braços.

Entrou receosa encostando a porta com um dos pés. Tentou não admirar muito o interior rústico do quarto, mas percebeu ser bem parecido com o destinado a ela na noite anterior apesar de maior. Localizou a grande cama de casal no centro do aposento e se dirigiu para lá. Maia a olhava da posição em que se encontrava, o pensamento no fato de que logo estaria em seu confortável colchão e não mais nos braços da veterinária. Alicia deu a volta na cama, apoiou o joelho direito sobre os lençóis e cobertores e pousou o corpo pequeno sobre os mesmos. Assim que se viu longe dos braços da veterinária Maia sentiu frio e um certo vazio preencher seu peito.

Sem falar nada, nem pedir permissão, Alicia se sentou na cama perto dos pés de Maia que estava sentada com as costas contra os travesseiros. Pegou um pé de cada vez da mais nova e, pacientemente, abriu o zíper lateral da botinha de cano curto que ela usava nos pés. Assim que a livrou dos calçados Alicia se moveu para puxar o grosso cobertor que estava dobrado nos pés da cama. O que a impediu foi a mão fina e delicada segurando manga direita de sua camisa.

- Pode me fazer um favor? – pediu Maia com um tom calmo e baixo, quando a veterinária apenas confirmou com a cabeça ela deu um pequeno sorriso – Pegue uma valise que está dentro do armário embaixo da pia do banheiro pra mim?

Sem contestar o pedido a veterinária se levantou e entrou no banheiro do quarto que sabia onde estava por ter a porta aberta. Abriu ambas as portas do armário e encontrou a valise preta pequena. Pegou-a e fechou as portas antes de voltar para perto de Maia que sorriu ao pegar o objeto e pousa em seu colo para abri-lo.

- Eu vou ao meu quarto, preciso me trocar. Logo Antonieta sobe com o seu chá – disse Alicia se sentindo ansiosa para sair do aposento, sua cabeça lhe gritava para sair dali e deixar Maia porque ela não mais precisava de seus cuidados, mas seus sentimentos imploravam para permanecer mais um pouco.

- Espere – pediu a mais nova terminando de abrir o zíper e pousando a valise preta ainda fechada ao seu lado na cama – Sente-se aqui – ela pediu se afastando da borda da cama e indicando que Alicia deveria se sentar a sua frente.

- Eu realmente acho melhor ir – disse a veterinária indecisa, queria sair, mas também queria muito ficar, por fim o olhar gentil de Maia a fez suspirar e logo depois estava se sentando próxima a mais nova – Porque quer que eu fique? – perguntou se posicionando de forma a estar de frente para ela.

- Eu me machuco bastante, por causa da dificuldade em me mover – contou ela se voltando para a valise e trazendo-a novamente para seu colo – Alguns dias são piores que outros. Por isso sempre tenho essa valise comigo – contou mostrando o conteúdo composto por diversas coisas para cuidados e curativos – Me deixe cuidar do seu corte – pediu Maia voltando seu olhar para encarar os olhos castanho mel da veterinária – É o mínimo que posso fazer.

Por mais que Alicia tentasse ou quisesse, seria impossível negar aquele pedido. Não quando os verdes a hipnotizavam por olharem-na de forma tão decidida. Sabia que poderia sim cuidar daquilo sozinha, mas depois de todos os acontecimentos, foi impossível negar a possibilidade de ficar mais algum tempo na companhia da jovem proprietária do Rancho. A veterinária só esperava não se arrepender depois de ter cedido aos seus próprios impulsos. 

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