IV

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A silhueta de Wanda atravessava a escuridão,explorando mais uma vez a noite de Wakanda. Seus pés eram silenciosos no piso, pois não era hora de rondar corredores ou se esgueirar por passagens na imensa construção. Se dobrasse a esquerda e seguisse adiante por dez metros, para então subir mais dois lances de escada, encontraria a voz serena de Steve. Stevie, que conversava noite sim, noite não com seu amigo congelado.
Haviam pessoas dormindo, outras ainda trabalhando. Pessoas que cuidavam do bem estar da equipe, agraciados com a confiança do próprio rei T'challa para que houvesse sigilo e paz.

Sigilo e paz.

Aquelas palavras borbulharam trêmulas nos lábios da jovem, a qual seguia sem rumo. As luzes vez ou outra a alcançavam em meros fachos; existiam momentos em que alguém pensava ter visto uma figura feminina vagueando por aí.
Quando isso acontecia, seus dedos tamborilavam quase que sozinhos, naquele seu instinto rubro. Apenas um movimento e o indivíduo não se recordaria do vulto ou do arrepio que sentiu da nuca aos pés. Apenas um movimento a mais e este indivíduo gritaria em pura agonia, visitado pelos mais táteis pesadelos que ele sequer imaginava que tinha.

Wanda fez força para acalmar as mãos ligeiras e as vozes dos pensamentos alheios, que ficavam mais próximas e mais interessantes. Seria tão fácil errar um movimento e pronto! Ela não seria a jovem trôpega e ferida. Seria a bruxa.

A bruxa que vagava Wakanda. Que matara pessoas, responsável pela morte de onze wakandanos. Que destruíra Sokovia. Que seguira um robô feito de vibranium e crueldade. Que era responsável pela morte do próprio irmão.

Houve um pulso escarlate.

Njeri.

Os olhos da moça tornaram-se vermelhos por detrás das pálpebras.

Njeri, que estava ali. Pensava nela, em Wanda. Estava trabalhando até tarde, um andar abaixo do chão onde Wanda se encontrava, com mais de trinta centímetros de concreto de espessura. Tinha olheiras. Pensou na própria filha, uma garota pré-adolescente. Pensou no sorriso dela, nas tardes em que passavam juntas. Pensou em seu cabelo crespo e macio, que adorava acariciar. Perguntava-se se teria outro filho ou não. Então lembrou-se do grito que dera mais cedo, o corte profundo da estrangeira, sangrando enquanto objetos pairavam no ar contra a física do mundo.

Wanda viu a si mesma assim como a doutora assistia células se desenvolverem e reagirem à substâncias através da lente de um microscópio. Era uma jovem pálida, de rosto abatido e olhos opacos. Olhos que estavam além da tristeza, além da fúria. E o homem loiro que conversava com essa jovem também enxergava isso.

O ruído de sua queda soou mais alto e pior no corredor largo, rasgando o silêncio da madrugada. As mãos e os joelhos dela foram ao chão, e provavelmente a pele tinha se esfolado. Estava no agora e estava sozinha. Sacudiu a cabeça, livrando-se da mente de Njeri. Não queria estar ali. Não queria saber que ela se preocupava. Não queria enxergar sua felicidade ou sua tristeza.

Não queria contaminá-la.

A luz vermelha de seus olhos se apagou por fim. E o homem loiro da lembrança da doutora lhe estendia a mão, com sua aura azul, sempre azul. Stevie.

* * * * *

Lá estava ele, o homem no gelo.

James Buchanan Barnes. Sargento Barnes. O Soldado Invernal. Uma arma, uma máquina. Um experimento, assim como ela. Assim como o agente Rogers.

Tantas coisas em comum. Engraçado, porém, como os três eram vistos de formas tão distintas.

Um herói, símbolo nacional. A Aprimorada caótica. O maior acusado de atos terroristas.

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