Zhelaniye

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"Saudades"

Após minutos apenas respirando o ar gélido da floresta - pois era uma chance para as três se recuperarem depois de cruzarem o inferno - seguiu-se um momento terno para... Apresentações, por assim dizer. Agatha teve a oportunidade de dizer como conhecia Natalya; contou brevemente sobre sentir a anomalia na Travessia da Bruxa e como tentou ajudá-la. Natalya agradeceu, embora parecesse ainda um tanto confusa, mais enrolada em pensamentos e memórias do que estava enrolada em seu manto vermelho. Não queria desgrudar da sobrinha adotiva, Wanda, e lhe cobriu de abraços e beijos estalados.

— Você está tão grande! Tão linda...

A Feiticeira agradeceu, cansada. Mesmo com a pele mais uma vez brilhando cálida pelo proteção feérica - já que a Lua jazia agora no céu sem nuvens - a jovem tinha dificuldade de acompanhar as perguntas de Natalya. Gostava de assistir seu rosto, porém. Suas expressões, a cor de seus olhos e uma tonalidade opaca de aura.

— Me perdoe, querida. — Ela enfim disse, segurando as mãos frias de Wanda. — Sei que está exausta e precisa de descanso. Ainda mora na mesma casa em Novi Grad? E onde está aquele seu irmão? Lembro-me que não se desgrudava dele.

A face da jovem foi resposta suficiente para que houvesse silêncio.

Natalya estivera fora por anos. Não sabia sobre a explosão que matou Django e Marya. Não sabia sobre Pietro.

Agatha limpou a garganta com um pigarrear discreto, tocou nos ombros de Natalya com delicadeza enquanto um portal mágico abria-se atrás de si, dando direto para a sala aconchegante de sua casa.

— Há muito o que conversar. — Ela disse, depois ajudou a outra a se locomover de maneira lenta, um tanto hesitante. — Vamos primeiro esfriar as ideias enquanto bebemos chá. Ninguém mais quer se manter nessa montanha mais que o necessário, sim?

Wanda permaneceu em silêncio, pensativa. A noite só respondia com costumeiros sons de insetos ocasionalmente voando, o farfalhar do vento nas árvores. Ela encarou a escuridão adiante, distinta da cena que tinha visto todas as vezes em que olhou a floresta ao sopé da Montanha Wundagore. Algo havia mudado. Não existia mais aquela vibração terrível, algo errado entre os galhos e folhas. Wanda sentia a ausência das criaturas de sombras, da seres e entidades vis, como uma certa coruja.

Era agora uma floresta normal, devolvida à natureza. A Montanha já não mais sangrava.

No entanto, algo dentro da Feiticeira Escarlate parecia não ter se curado direito.

Antes de atravessar o portal com Natalya, Agatha voltou sua atenção para a aprendiz, olhando breve por detrás dos ombros. Sua voz era gentil, sensível ao pensamentos silenciosos da jovem:

— Você vem, Wanda?

Sua boca esboçou uma resposta automática, mas levou um tempo a mais para que sua voz tomasse forma. Seu tom era tão frágil quanto um floco de neve, também carregado com facilidade pelo vento.

— Sim, eu... Eu já vou. Só me dêem alguns minutos.

A bruxa se convenceu após um miado de Ebony, parado ao lado da sokoviana. Fez um curto aceno com o queixo para o bichano e depois atravessou o portal brilhante junto com Natalya.

Em seguida, Wanda se pôs de joelhos naquele solo frio, sujo e ingrato. Encarou a luz da Lua com os lábios trêmulos, grata por Ebony lembrá-la que não estava sozinha - pois ele estava ali, esfregando carinhosamente seu diminuto corpo em suas pernas dobradas - mas ela ainda se sentia tão absolutamente só.

Toda aquela dor era dela e pesava demais em suas costas.

Quando deu-se por si, estava chorando. Não aquele choro quieto que costumava a chorar, não desejando ser um incômodo, um tormento inconveniente e demasiado sensível. Eram soluços incontidos no peito, uma respiração entrecortada e o rosto avermelhado, molhado, torcido.

VaziosOnde histórias criam vida. Descubra agora