Wanda tinha a inconveniente teima de se negar a fazer o que lhe era dito dependendo da situação, traço compartilhado por seu gêmeo e até mesmo acentuado nele. Não era preguiça ou escárnio para fazer o que era necessário, era apenas aborrecimento por seguir ordens de alguém. No entanto, lhe sobrava ainda o mínimo de discernimento para saber que deveria completar sua nova agenda de deveres estabelecido pelo rei de Wakanda, ainda mais que este não esboçara um único comentário de repúdio pelo o que acontecera no laboratório, nem mesmo mencionara os custos de equipamentos quebrados ou exames feitos por James, que acordara no meio daquela confusão.
Ás vezes ela se flagrava divagando, pensando se ele acordara por conta de algum código acionado pelo dispositivo de Zola. Outras vezes questionava se existia a possibilidade dele querer protegê-la. No fim sabia que aquilo era fruto apenas do caos, um resultado aleatório de uma situação infeliz.
Talvez mostrasse o caderno à James, sobre as coisas que ela anotara e as palavras que o atingiam em cheio para o transformar numa máquina. Ela se lembrava que anotara mais palavras do que chegara a testar de fato na conexão psiquica e nas memórias, mas não imaginava que deveria testar mais coisas. Um dia talvez no futuro, se ela sentisse que ele não teria nojo dela por ser uma criatura de mente dividida e tão invasiva.
Com pensamentos infelizes, Wanda chegou rápido aos aposentos da princesa. Encontrara muitas Dora Milaje no percurso, que pareciam ter retirado qualquer simpatia pela estrangeira por conta do incidente. A Feiticeira compreendia a reação, pois ninguém deveria ferir a herdeira do Trono, que dirá uma refugiada de guerra como ela. Ela bateu à porta, murmurou seu nome.
E a porta foi aberta.
Foi um sistema automático, sem nenhuma recepção. Ela já estivera ali para estudar livros de psicologia e misticismo junto com a princesa, mas agora o cômodo parecia ainda maior e impessoal, a estatueta de gato, de Bastet, a julgava com seus olhos brilhantes. Parecia ter passado tanto tempo.
Quando pensava em sair ou procurá-la além do hall de entrada, Shuri veio da porta que dava ao seu dormitório propriamente dito, apoiada em uma muleta.Sua face parecia melhor, no sentido de sua pele ter se recuperado de forma evidente de seus hematomas, tantos os causados por Avalanche quanto os da briga há sete dias. Wanda gostaria de ter um organismo que a limpasse de feridas tão rápido assim.
— Veio rir da minha muleta?
— Eu só riria se tivesse um cone no pescoço, Alteza.
Shuri riu pouco, andando alguns passos até desabar no sofá. Acima de tudo, estava cansada.
— Essas piadas envolvendo gatos nunca vão parar, vão?
Wanda repetiu o gesto e sentou-se numa poltrona do outro lado da mesa de centro. Desejava que sua postura fosse despreocupada, mas ainda assim estava próxima da borda do estofado e de quando em quando lançava olhares à porta. Esperava quando Shuri a mandaria embora, talvez enxotando-a com sua muleta ou jogando a estatueta.
— Não me parece realmente ofendida.
— De fato, não estou. Não por isso. — Ela deu de ombros. A pergunta seguinte referia-se à tudo: À briga no laboratório, aos duelos na arena das Dora Milaje, às trocas de insultos em toda a oportunidade possível. — Você está?
— Eu queria dizer que sim, mas não consigo ficar realmente brava com você.
— Desgraçada. Eu digo o mesmo.
Elas compartilharam mais uma vez um riso sem um pingo de humor.
— Acho que aprendemos dessa forma a não reagir com violência física.
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Vazios
FanfictionHá um vazio latente em Wanda. Um vazio que cresce e devora, sussurra e rosna. Grande, feroz. Vermelho e sanguinário. Um vazio que era apenas uma pequena flama, mas que ao longo dos anos, incendiou-se feito uma tormenta de fogo. Wanda o sente. Sente...