A casa e a loja de Agatha Harkness cheiravam permanentemente à ervas. Wanda adorava. O perfume de incenso foi a primeira coisa que sentiu quando voltou para lá, se teletransportando direto para a cozinha de sua mestra.
— Bem vinda de volta, bruxinha.
A velha disse, casualmente preparando um chá para si mesma. Ofereceu-lhe uma piscadela e aproveitou para servir uma segunda xícara. A Feiticeira tirou o casaco, o apoiou no encosto do banco e depois se sentou de frente à bancada, agradando o gato que pulou no assento ao seu lado. Havia um sorriso sincero em seu rosto. Continuou em silêncio enquanto observava-a mexer fogão, as vestes roxas muito longas e trêmulas ao apagar a chama que esquentara a chaleira com apenas um simples gesto. A voz da anciã preencheu a quietude:
— Sabe, é incomum bruxas aparecerem no lar de outras bruxas sem ser pela porta da frente. Mas você também não é uma bruxa comum... Não é mesmo, senhorita Wanda Maximoff?
— É, eu acho que não.
Agatha parou o que estava fazendo e ficou de frente para sua aprendiz, as rugas de seu rosto torcidas numa expressão incerta. Orgulho, humor, deboche uma pitada de repreensão. As duas tomaram um gole longo de chá de hibisco, em seguida a mestra bateu levemente a ponta do dedo indicador sobre o baralho de tarot, que sempre ficava à beira da bancada de pedra.
— Que tal carta pra ver o que o futuro reserva? Será bom um guia para ver o que passaremos nesta semana.
Wanda soltou um arquejo falso para depois reclamar:
— Já voltamos ao trabalho?
— Mas é claro! — Ergueu a sobrancelha. — E acho que você já descansou bem, correto?
O riso dela a denunciou mais do que gostaria de admitir. Esperava que o rubor não tingisse muito sua pele. Engoliu seco, agradou a cabeça felpuda de Ebony e afinal inspirou fundo, sua mão esquerda sobre o baralho. Não tinha a mesma habilidade de Remy LeBeau em embaralhar e cortar as cartas, mas - em sua própria defesa - ele não conseguia ler o futuro nelas. Ou ao menos ela achava que não.
— Que tal três cartas? — O bichano balançou a cauda de forma distraída, embora seus olhos amarelos estivessem focados nas mãos magras da jovem. — Parece um bom número.
— Acho que toda feiticeira deve confiar em gatos pretos. Além disso, você já meu dicas de tarot antes... Veremos três cartas, então.
Wanda cortou o baralho novamente e fez três pilhas. Tirar cartas antes e durante o café da manhã era um hábito corriqueiro na casa de Agatha Harkness, uma coisa que fazia parte da rotina tanto quanto preparar chá todos os dias, portanto não houve tanta cerimônia para desvirar cada uma delas. Mesmo que fosse uma espécie de chá da tarde, o gesto da jovem foi despreocupado:
O Mago.
O diabo.
Os Enamorados.
— Oh. — Wanda franziu a testa. — Essas duas primeiras são reincidentes.
— É, — Ebony pulou na bancada e apontou para a última com uma bela ilustração: Duas silhuetas humanas, uma vermelha e a outra preta. Acima deles, asas douradas enfeitavam o céu, como se um anjo sem rosto os observasse entre as nuvens. — Mas "Os Enamorados" nessa tiragem? Eu entenderia "A Estrela", até mesmo " A Torre". Não gosto disso. Não gosto nada disso.
— Hã... Explicações, Agatha?
A velha suspirou, apoiada com as duas mãos sobre a superfície. Também não parecia exatamente feliz. Wanda, por sua vez, não compreendia o motivo de tanta frustração. Para ela, a carta remetia apenas à um casal, ainda mais pelo seu nome: "Os enamorados". Era estranho que aparecesse naquela tiragem, já que não tinha exatamente pensado em relacionamentos, mas não conseguia achar a situação tão grave assim.
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Vazios
FanfictionHá um vazio latente em Wanda. Um vazio que cresce e devora, sussurra e rosna. Grande, feroz. Vermelho e sanguinário. Um vazio que era apenas uma pequena flama, mas que ao longo dos anos, incendiou-se feito uma tormenta de fogo. Wanda o sente. Sente...