XV

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Tudo parecia um sonho estranho durante o percurso até o quarto. Poderia até pensar que não acontecera nada na última meia hora; poderia pensar que a briga, seus poderes aflorando, o sentimento latente de Deka, não passavam de alucinação. Caso voltasse ao quarto com a ameixa na mão e visse o ambiente no mesmo estado que tinha deixado, concordaria em se consultar com um psiquiatra.

Mas nenhum dos dois estava lá.

Isso a aliviou, de certa forma. Não era um delírio ou outro pesadelo, afinal. Inclinou sua cabeça de um lado a outro, sem ouvir um único som que pudesse indicar onde os dois estavam. Certamente não na cozinha e muito menos na sala, porém não escutara nenhum ruído vindo dos quartos. Então lembrou-se de que seus amigos corriam pela manhã.

Foi até a arena, então. Não levou o arco e flecha, ainda não havia trocado o vestido da noite anterior. Era cedo e ela teria tempo para tudo isso logo. Só sabia que precisava ver o riso de Sam e a solidez de Steve, e precisava disso rápido.

Wanda viu apenas o primeiro, de costas, e neste exato instante ela parou. O dia já começara brando e iluminado, o vento sussurrava fresco. Sam estava perto das árvores e era possível ouvir sua voz agradável, embora ela não pudesse distinguir suas palavras ao certo. Conversava daquele seu jeito alegre, meio sol, meio estrela. Naquele curto momento, Wanda foi atingida por revelações agudas e melancólicas.

Sam tinha sofrido também na sua vida. Assistira o amigo de outros voltarem: Bucky para Steve, Rhodes para Tony, ainda que com todas as dificuldades e problemas. Mas Riley jazia morto e enterrado, assim como Pietro. O luto era uma constante, mas...

O sorriso de dele ainda estava ali. Mesmo que estivesse de costas e conversando com pássaros, Wanda sabia que carregava aquele seu sorriso matreiro no rosto.

Isto a levou a segunda epifania:

Sam estava de costas e distraído e, mesmo que separados por trinta ou vinte metros, parecia insuportavelmente inalcançável. Sua alegria e sua luz eram distantes. Distantes demais.

Ela deu um passo para trás. O sol a chamou de volta.

— Hey, garota. – Wanda estava certa. Ele ainda sorria. – Há quanto tempo está aí parada?

Não respondeu de imediato, somente deu de ombros e encarou o chão, sem saber porque seus pés a levavam para frente, sem recuar. Talvez porque precisava de luz, talvez porque Sam mesmo dissera que poderia contar as coisas à ele. Provavelmente ambos. Quando estava mais próxima, ele balançou um pouco a cabeça e quadril, finalizando numa pose de ar hollywoodiano e blasé enquanto levantava os óculos escuros da altura dos olhos.

Então ela riu, riu até verter o corpo pela metade. Nenhum dos dois estava esperando tal reação, tanto que Sam ergueu as sobrancelhas impressionado. Ainda segurando a haste dos óculos, decidiu entrar na brincadeira.

— Gostando da visão, Wanda?

A palavra "visão" a deixou desconfortável e ele foi sagaz o suficiente para perceber e mudar de tom.

— Só uma ameixa de café da manhã? Impossível que ainda esteja cheia de ontem a noite. – Wanda esboçou um meio sorriso, de lado. De fato, havia comido bastante, mas a ameixa não era para ela. – Bom, coma logo. Da última vez que alguém tentou comer ameixas, começou uma perseguição violenta em Bucareste.

— Vou tentar me lembrar disso. – Deu uma mordida na fruta, o que lhe dava tempo para pensar no que diria. Estava abalada pela discussão que tinha ouvido, entre T'Challa e Deka, mas não existiam formas seguras de contar isso a alguém. Teria que contar que sim, mais uma vez tinha ido vagar pelos corredores, e que de alguma forma que nem ela, nem ninguém conseguiria desvendar, Wanda compreendera boa parte do que ambos disseram. Como Steve reagiria à isso? Ou Sam? Ela terminou de mastigar e seus breves segundos terminaram. – Hã... Onde Steve está?

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