O pincel na mão de Jack tremeu junto com seu apartamento inteiro, o que resultou num risco errado sobre o papel grosso. Ele grunhiu, depois suspirou no alto de seus quase oitenta anos de idade. Seu desenho sobre a aquarela estava arruinado, logo esse que estava tão bom, cheio de amarelo e azul profundo. Histórias ilustradas sobre super-heróis sempre lhe garantiram um trocado considerável para somar com sua aposentadoria, mas depois que heróis de verdade surgiram em plena Nova York em 2012, as pessoas não estavam tão interessadas nos personagens fictícios. Queriam é notícias dos reais. Ele olhou para o desenho do herói sobre sua escrivaninha, suas cores tão vivas e seu rosto firme. Os quadrinhos de hoje careciam de saturação, de uniformes mais interessantes do que uma mistura de spandex e kevlar.
A energia faltou no apartamento e mais uma vez os móveis chacoalharam.
— Argh. — Ele se levantou da cadeira, levando consigo seu material de desenho: O copo com água e tinta, pincéis e toalha. Não conseguiria terminar naquela noite, sem falar que sua esposa ficaria um tanto aborrecida se ficasse acordado até muito tarde. O idoso estava de frente para a janela, mas virou-se justamente quando rajadas de luz vermelha atravessaram o horizonte e uma antena parabólica foi arrancada do teto de um prédio vizinho para uma direção estranha, atraída talvez para o chão. — Essas obras no centro parecem que nunca acabam! A prefeitura tem que fazer alguma coisa.
Ele caminhou até a pia da cozinha e começou a lavar as cerdas escuras dos pincéis enquanto murmurava o preço dos impostos e sobre a marca do estojo de aquarela que estava em falta na sua loja favorita. Olhou para as cores se misturando e se desfazendo no ralo. Parecia até sua história de origem de vilão: As aventuras do terrível Jack contra inconvenientes do cotidiano e histórias ruins nos quadrinhos!
Riu sozinho, sem perceber o som de uma explosão há alguns quilômetros. Pensava agora que seu neto talvez estivesse certo. O guri gostava das narrativas do avô e aprendeu a desenhar com ele, mas tinha verdadeira paixão por web comics, fanfics. Jack nem sabia direito o que diabos era aquilo, só sabia que ocupavam grande parte do tempo e do coração do moleque, que andava com um tablet enorme na mão. Ele chegou a conhecer até mesmo pessoas de outros países, fez amizade com uma tal menina chamada Kamala, na America.Ele ficou doido quando soube que o Pantera Negra em pessoa, o Homem de Ferro e o robô Visão iriam para o Congresso em Zurique naquele dia, porém tinha aula e acabou em casa, em outra cidade.
Enquanto enxugava as mãos e a energia oscilava de novo, o idoso divagou sobre os boletos de luz e sobre o Congresso. O tema era sério. Pensou sobre os mutantes. Procurou também um fósforo na gaveta para acender algumas velas de emergência. De repente parou, iluminado por uma epifania, uma história que parecia ter vindo pronta na sua cabeça: Um grupo de heróis mutantes, todos eles muito diversos, resistindo bravamente contra o preconceito e os tais Sentinelas. É, aquilo parecia legal. Uniformes. Toda a estética dos anos oitenta seria perfeita, mas poderia discutir isso melhor com o neto. Ele levou a vela acesa até a sala, ligou o celular que ganhou do guri e franziu os olhos para enxergar as coisas na tela. A internet da casa também oscilava, mas poderia ligar aquela outra bola com o símbolo de setas nas opções, que o permitia acessar o Google até do café do outro lado da cidade. Sua esposa que o desculpasse, mas aquela noite ele tinha que saber mais o que eram webcomics e fanfics.
Depois ligaria para o neto.
Sentou-se à escrivaninha de novo. Procurou uma caneta azul no meio da confusão de papéis e materiais, até que finalmente achou a cor que queria. No risco que escapara sobre o torso do herói, ele fez um risco contrário na diagonal, formando um elegante "X".
— Ooh!
*****
Ayo levava a princesa Shuri na nave. É claro que a herdeira do trono não precisava de condução até onde precisava ir, mas era costume que uma guerreira das Dora Milaje sempre acompanhasse os monarcas em missões oficiais e principalmente em missões secretas. Podia sentir que a princesa estava tensa ao fundo, sentada e com o olhar fixo no vidro da aeronave. Não era costume seu questionar Vossa Alteza, pois tudo o que ela fazia era por seu irmão e por Wakanda. Mas, ainda que confiasse de olhos fechados em sua princesa, estranhou o local onde ela indicara no mapa. Sul de Madagascar. Pelo o que sabia, Vossa Majestade T'Challa estava em Zurique, no Congresso. E também trouxe consigo duas ampolas de uma substância amarela que eram cargas para uma seringa em seu bolso.
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Vazios
أدب الهواةHá um vazio latente em Wanda. Um vazio que cresce e devora, sussurra e rosna. Grande, feroz. Vermelho e sanguinário. Um vazio que era apenas uma pequena flama, mas que ao longo dos anos, incendiou-se feito uma tormenta de fogo. Wanda o sente. Sente...