Capítulo 4: " Baixos e mais Baixos" - Parte 1

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''Quando somos adolescentes, tudo é intenso demais. Uma simples espinha, se torna um enorme bicho, gosmento e nojento. E uma simples peça de roupa rasgada, se torna a vida querendo estragar completamente o seu dia.''

Eu estava deitada sobre a minha cama, decidindo o que eu iria fazer com aquele desenho, e tecidos que o Louis me deu. Não sabia qual ideia eu iria fazer para a peça, e tão pouco para o desfile.

Depois do jantar, minha mãe bateu na porta e disse:

—O prefeito me contou que você se voluntariou para o desfile da cidade, achei interessante, depois de tudo, achei que você não queria mais. —disse minha mãe com leveza.

 Era verdade, eu havia dito que não queria mais. Quando o meu pai, apareceu com a proposta de me mudar de cidade por causa, do seu caso nojento. E ali, como forma de castiga-lo, eu o culpei, caso eu não fosse mais estilista. E culpei ele por tudo. Eu sei, foi injusto, mas, na minha mente, eu queria que ele sofresse, sofresse a mesma dor que eu, como se fosse que seria possível.

Eu então, engoli a seco e respirei fundo e disse:

—Bem, eu mudei de ideia. Não posso esconder o meu talento por causa do que aconteceu. Isso não é justo. E além do mais, eles estão sem voluntários e acho que seria bom para mim. —disse dando de ombros.

—E esse é o projeto? —perguntou a minha mãe sentando ao meu lado da cama.

—É sim. O que a Senhora acha? —perguntei com receio.

—Bom, para quem não desenha há meses, está perfeitos — disse ela sorrindo com alegria.

—Obrigada. E como vai o trabalho novo? —perguntei curiosa.

—Vai muito bem. O banco me transferiu para uma boa área. Tem sido, terapêutico contar notas é algo bem terapêutico. —comentou ela sorrindo e eu concordei.

—Mãe, eu queria que a senhora soubesse, sobre o papai... —disse, mas, o telefone nos impediu.

—Um instante querida, eu já venho. —disse minha mãe, com o som do telefone.

A voz da minha mãe, ecoou sobre a casa, e ouvi ela dizendo:

—Alô? Olá Querida, Boa noite. Que surpresa! Não, Cass não me disse não. Claro que pode querida, pedirei uma pizza, ainda gosta de Portuguesa com cheddar? —perguntou minha mãe no telefone.

Houve um silêncio, e então, o telefone foi para o gancho.

—Querida, Julia vai passar uma noite aqui em casa. Tudo bem para você? —perguntou ela me olhando com atenção.

—Claro, mãe. — disse sorrindo.

Ela ficou parada na porta, esperando por alguma coisa, e então, eu olhei para ela e disse:

—O que houve? — perguntei olhando com atenção.

—Não me disse que Julia tinha voltado, porque? —perguntou ela com atenção.

—Bem, eu não sei. As coisas mudaram. — disse, por fim.

—As coisas mudaram, ou, você mudou? —perguntou ela me olhando.

—Acho que os dois, eu não sei mãe. Eu não sou mais aquela garotinha. —disse.

—Deve ser os hormônios, está tudo bem mudar. Só não pode se esquecer de quem você é. — disse ela sorrindo e então, saiu.

Eu parei, ainda olhando para a porta, demorei alguns segundos para retornar para o que eu estava fazendo. Não me esquecer de quem eu era, não era uma tarefa tão fácil.

Por vezes, eu queria esquecer de quem eu era, lembrando disso, me olhei no espelho pela cama. E então, senti repulsa, e então, corri para o banheiro. Coloquei o dedo na garganta, e todo o jantar se foi. Sentada ao lado do vaso, novamente me senti envergonhada, me senti minúscula e impotente. E acabei chorando baixinho, houve um toque da campainha e então, eu me levantei, suspirei, enxuguei as lágrimas e escovei os dentes.

Dei descarga quando escutei a voz da minha mãe falando lá em baixo:

—Ela está lá em cima, desenhando e projetando. —disse ela com delicadeza.

Houve sons de passos da escada, e então, Júlia apareceu no meu quarto. Júlia estava com uma camiseta de Stranger Things, uma que Eleven estava com as mãos erguidas para a frente, eu achei super a cara de Júlia. Uma calça jeans preta, rasgada nos joelhos, e um All Star velho e surrado.

Foi então, que eu sorri e ela se sentou do meu lado:

—E então, o que está projetando? — perguntou ela sorridente.

—Bem, estive pensando nisso aqui. — disse mostrando a ela e ela sorriu ao ver os projetos.

—O que está pensando em colocar o Louis para fazer? Ele vai espetar os dedos com os alfinetes. — disse ela sorrindo.

Eu dei uma risada, e disse:

—Era justamente por causa disso que ele vai me ajudar a costurar. Quero ver se ele consegue costurar fino. — disse e Julia sorriu e disse:

—Não subestime um cara que luta contra o próprio corpo. —disse ela rindo e eu sorri mais timidamente.

—O que houve para você vir dormir aqui? — perguntei curiosa.

 Julia bufou e disse:

—briga de casal. Ninguém merece meus pais brigando por liberdade expressão. — disse ela sorrindo com leveza.

—Como assim? —perguntei sem entender.

—Minha mãe está indo em um grupo de apoio para "Mulheres Contra o Tabu." Então, imagina, ela está lutando contra tudo e dando opinião sobre tudo. O que, eu acho que não seja errado. O errado é ela ser a rainha do lar e o meu pai não aceita isso, você sabe. — disse ela sorrindo e dando os ombros.

—Sinto muito, por isso. —disse a ela e ela não fez por conta.

—Que horas você vai chegar na escola amanhã? —perguntou Júlia me analisando.

—Cedo. Uma hora antes, assim, dá tempo de eu fazer tudo o que eu preciso no teatro.
Quer me ajudar, para auxiliar nos figurinos? —perguntei e Julia abriu um largo sorriso e disse:

—Será uma hora te ajudar. — disse ela colocando a mão na testa como um soldado.

E eu dei uma risada.

Júlia colocou Katy Perry no Spotify, e ali juntas, ficando cantando e desenhando, pensando em um jeito de deixar tudo original e de autonomia própria.

Além das Aparências - Veja além das suas AparênciasOnde histórias criam vida. Descubra agora