54°Capítulo

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Narração: Monica.

Romeu já estava doido, puto e bolado percebi pela aflição dele.
Mônica: Que houve amor? Fala sério cara. -Falo ficando bolada com essa dele de me esconder as coisas.
Romeu: Vou fazer uma parada ali e te busco pra gente ir para casa, tá? Não sai daqui, é papo rápido.
Deu um beijo na minha testa.

Aquilo já me deixou nervosa, olhei em volta e o pessoal das outras favelas já não estavam mais, tem algo estranho, parei até de beber, esperei o Romeu voltar para a gente subir logo, antes que aconteça algo de ruim. Precentimento nada legal que eu tô, passou meia hora e nada do Romeu, fui na direção do Ricardo.
Mônica: Viu teu pai? -perguntp olhando para os lados.
Ricardo: Passou pra lá com o pessoal, está todo estanho ele já vou me adiantar com a gata, quando eu for te chamo, pô, Camila já foi.

Quando me vi sozinha...
Olhei pra todos os lados e só via tudo indo pro alto. Quando vi a correria do pessoal na minha cabeça ja passava um filme, como se em câmera lenta, pensei no meu marido na hora, primeira coisa.
O caveirão tá vindo, corre! — Aquela multidão de gente dizia.

Meu Deus, só senti o copo cair da minha mão, eu ainda estava parada, sem reação, a música parou...
— Mônica, vem pra cá. -ouvia lá no fundo, a voz do Romeu, mas não o encontrava mais, eu só ouvia vozes, me vi perdida.

Até que resolvi acordar, é cada um para o seu lado, consegui me locomover, ouviam-se tiros, só rajadão frenético. Eu consegui correr junto com a Michele, que me achou, eu estava sendo lambida pelo povo, empurrada...
Eu não sabia se corria em direção de ruas largas ou em direção de algum beco, subida...sei lá, coisa assim. Eu não sabia o que fazer, só sei que correr é a pior solução, povo de favela não aprender isso; virei meu pé torcendo, senti a dor da alma, gemi de dor, percebi que eu não iria conseguir seguir.

Quando cansei encostei na parede em meio ao tiroteio, na minha frente só tinha o escadão e eu estava sem forças para correr e seria suicídio, juro, estava ofegante. Coloquei a mão no rosto, tentando assimilar o que estava acontecendo, o que realmente era, olhei ao redor e já estava tudo quebrado, jogado, sem contar que aqueles troço tudo de preto, touca ninja, fuzil, pistola, armados até o dente já estavam ali. Uma viatura parou muito próximo a mim, alguns daqueles homens pararam na minha direção, e vieram com o fuzil mirados na minha, eu gelei, naquele momento só pensei na minha filha, e muito em Dsus, pedi a ele que cuidasse dos meus, principalmente do meu marido.
— Ué a mulherzinha de traficante ficou pra trás? Teu maridão te deixou foi? –Disse um cara da BOPE.

Fiquei calada porque qualquer reação minha seria meu fim, a covardia está aqui na minha frente ou a própria morte.
Isso que dá, o terror do seu marido somos nós é sempre que entrarmos e ele marcar bobeira vai te deixar pra trás; otária, vadia!

No mesmo momento me deu um negócio por dentro, um sentimento pejorativo sabe?!
Eu não iria pôr isso na minha cabeça, NÃO MESMO!
Eu passo por isso já há mais de 10 anos e eu sei que ele não é capaz de fazer isso. Nessas horas é cada um por si mesmo, ele não pode seguir o mesmo caminho que o meu, nem eu o dele, e eu sei muito bem disso desde a primeira correria, foi explicado para mim muito bem e não vai ser um policial de merda, mais corrupto que o Brasil que vai mudar isso da minha cabeça; algum de nós tem que sobrar.
Deixa ela, o que é dela tá guardado e muito bem. E avisa para aquele marginal de merda que o dele está mais perto do que ele imagina, não foi dessa vez mas a próxima ele vai cair feio e se tu tiver junto vai também. Vocês são dois merdas, traficantezinho cuzão, cuidado com as ruas escuras, numa delas a gente pode bater de frente. –Disse, um segundo, que segurava a mão numa granada, eu já estava pensando em mil e uma coisas.
Sobe lá, cuidado para quando não chegar lá em cima não tombar e cair cá embaixo –Disse, rindo, debochando.
Todos riem.

Fiquei imóvel, sem demostrar medo nem nada, não obtive nenhuma reação. Apenas estava ali refém deles.

Eu permaneci ali e eles foram para dentro da viatura, não saí enquanto eles não foram. O mais catrevoso fez um sinal de 'até logo', para mim e saíram com o carro.

Um certo alívio me deu, respirei fundo e passei a mão na testa, estava suando frio. Uma senhora me chamou para entrar e ficar na casa dela até cessar os tiros que ainda ouvia do outro lado.
– Fica assim não filha, você deu uma sorte tremenda de não terem feito nada com você... Você é muito abençoada! Jesus te ama muito, não liga para o que eles falam, só você sabe o que tu passa e Deus também, você não tem culpa.

Meu coração tava rachado, doendo.
Não importa, os anos passam, as coisas acontecem inúmeras vezes, mas a humilhação dói a cada vez, fere, eles conseguem fazer tocar lá no fundo, conseguem chegar no psicológico.

Não sejam mulher de traficante!
É uma realidade tão difícil e dolorosa. Para você andar no ouro e no luxo, ter uma vida boa e fácil, é complicado demais, são muitas lágrimas derramadas. Dizem que depois do temporal vem a lua cheia, mas nessa vida você não espera só pela lua cheia, você vive em meio aos dois, entre o bom e o ruim ao mesmo tempo, entre o sorriso e o choro, mudam sem você esperar. É tudo muito imprevisível.

Olha só, minutos atrás eu estava tão bem, tão feliz com meu marido e agora tô aqui só...chorando lágrimas de sangue após ser humilhada por policiais, que tem sede de tirar a vida ou a liberdade do meu marido.
Sou obrigada a aceitar e ficar calada, eles são a lei e eu sou apenas uma mulher de traficantezinho.

REALIDADE NA PENHA. 💒💖 CONCLUÍDAOnde histórias criam vida. Descubra agora