— Às vezes. Mas, na verdade, é bem entediante na maioria do tempo, pelo menos quando estamos na base. Nos reunimos de manhã, geralmente por volta das seis, nos certificamos que todos estão lá, então nos dividimos em batalhões para nos exercitarmos. Basquete, corrida, levantamento de peso, o que for. Às vezes tem aula naquele dia, qualquer coisa sobre montar e montar de novo nossas armas, ou uma aula de terreno noturno, ou nós vamos treinar tiros com fuzis, ou qualquer coisa. Se nada estiver planejado nós só voltamos pro quartel e jogamos videogames, lemos, malhamos de novo ou qualquer coisa pelo resto do dia. Depois nos reunimos de novo às quatro horas e resolvemos o que faremos no outro dia. Então acabamos.
— Videogames?
— Eu malho e leio. Mas meus colegas são especialistas nos jogos. E quanto mais violento o jogo for, mais eles gostam.
— O que você lê?
Eu disse a ela, e ela levou em consideração. — E o que acontece quando você é mandada a uma zona de guerra?
— Então, — eu disse, acabando meu frango, — é diferente. Há dever de guarda, e as coisas estão sempre quebrando e precisam ser consertadas, então você fica ocupada, mesmo que não esteja fora em patrulha. Mas a infantaria são as forças que ficam no chão, então nós passamos uma grande parte do nosso tempo longe do campo.
— Você nunca fica com medo?
Procurei pela resposta certa. — Sim. Às vezes. Não é como se você andasse por aí aterrorizada o tempo todo, mesmo quando as coisas estão um inferno ao seu redor. É só que você está... reagindo, tentando ficar viva. As coisas acontecem tão rápido que você não tem tempo para pensar em muita coisa a não ser fazer o seu trabalho e tentar não morrer. Geralmente te afeta mais tarde, quando você está mais tranquila. É aí que você se dá conta o quão perto esteve, e às vezes você tem tremedeiras e vomita ou qualquer coisa.
— Não tenho certeza se conseguiria fazer o que você faz.
Não tenho certeza se ela esperava uma resposta pra isso, então eu mudei de assunto. — Por que educação especial? — perguntei.
— É uma longa história. Tem certeza de que quer escutar? — Quando eu assenti, ela deu um longo suspiro.
— Tem esse garoto em Lenoir chamado Igor, e eu conheço ele por toda a minha vida. Ele é autista e por um bom tempo ninguém sabia o que fazer com ele ou como chegar a ele. Isso me pegou, sabe? Eu me sentia tão mal por ele, até mesmo quando era pequena. Quando perguntei aos meus pais sobre ele, eles disseram que talvez o Senhor tinha planos especiais pra ele. Não fez nenhum sentido no começo, mas Igor tinha uma irmã mais velha que era tão paciente com ele o tempo inteiro. Quero dizer, sempre. Ela nunca se frustrou com ele, e pouco a pouco, ela ajudou Igor. Igor não é perfeito de maneira alguma - ele ainda vive com os pais, e nunca vai poder ficar sozinho - mas ele não é tão perdido como era quando novo, e eu decidi que quero ser capaz de ajudar crianças como Igor.
— Quantos anos você tinha quando decidiu isso?
— Doze.
— E você quer trabalhar com eles em uma escola?
— Não, — ela disse. — Eu quero fazer o que a irmã do Igor fez. Ela usou cavalos. — Ela pausou, juntando os pensamentos. — Com crianças autistas... é como se elas estivessem trancadas no seu próprio mundinho, então geralmente a escola e a terapia são baseadas na rotina. Mas eu quero mostrá-los experiências que podem abrir novas portas a eles. Eu já vi acontecer. Quero dizer, Igor estava aterrorizado com os cavalos de início, mas sua irmã continuou tentando, e depois de um tempo, Igor chegou ao ponto em que podia dar tapinhas neles, afagar seus focinhos, e mais tarde alimentá-los. Depois disso ele começou a montar, e eu lembro de olhar para seu rosto a primeira vez que ele subiu... foi tão incrível, sabe? Quero dizer, ele estava sorrindo, tão feliz como uma criança pode ser. E é isso que eu quero que essas crianças experimentem. Simplesmente... felicidade, mesmo que seja por um pequeno tempo. Foi aí que eu soube exatamente o que queria fazer com a minha vida. Talvez abrir um campo de montaria para crianças autistas, onde nós podemos realmente trabalhar com elas. Então talvez elas possam sentir a mesma felicidade que o Igor sentiu.
Ela pousou seu garfo como se estivesse envergonhada, então deixou o prato ao seu lado.