Ainda assim, ela hesitou. Depois estendeu a mão para a bolsa e puxou o livro. Quando ela o estendeu para mim, li o título. Á princípio, eu não sabia o que pensar. Era um livro mais como um livro didático, na verdade sobre autismo e Asperger. Eu tinha ouvido sobre os dois distúrbios e supus que eu sabia o que a maioria das pessoas sabiam, o que não era muito. — É de uma das minhas professoras, — ela explicou. — Ela é a melhor professora que eu tive na faculdade. Suas aulas estão sempre cheias e estudantes que não estão matriculados algumas vezes entram pra falar com ela. Ela é uma das mais importantes especialistas em todas as formas de distúrbios de desenvolvimento e é uma dos poucos que focalizou sua pesquisa em adultos.
— Fascinante — eu disse não me incomodando em esconder a minha falta de entusiasmo.
— Acho que você pode aprender alguma coisa, — ela pressionou.
— Tenho certeza, — eu disse. — Parece que tem um bocado de informação aqui.
— Tem mais do que só isso, — ela disse. Sua voz era quieta. — Eu quero que você leia por causa da sua mãe. E o modo como vocês duas se dão.
Pela primeira vez, me senti rígida. — O que isso tem a ver?
— Eu não sou uma especialista, — ela disse, — mas esse livro foi indicado nos dois semestres que eu fiz com ela e eu o devo ter estudado toda noite. Como eu disse, ela entrevistou mais de trezentos adultos com distúrbios.
Eu retirei meu braço. — E?
Eu sabia que ela tinha ouvido a tensão na minha voz e ela me estudou com um traço de apreensão.
— Eu sei que sou só uma estudante, mas eu passo muitas das minhas horas no laboratório com crianças que têm Asperger... eu já vi de perto e eu também tive a oportunidade de encontrar alguns dos adultos que a minha professora entrevistou. — Ela se ajoelhou à minha frente, estendendo a mão para tocar meu braço. — Sua mãe é muito parecida com alguns deles.
Acho que eu já sabia pra onde ela estava indo, mas por alguma razão eu queria que ela dissesse diretamente. — O que isso quer dizer? — eu exigi, me forçando a não sair.
Sua resposta demorou para vir. — Eu acho que a sua mãe pode ter Asperger.
— Minha mãe não é retardada...
— Eu não disse isso, — ela disse. — Asperger é um distúrbio de desenvolvimento.
— Não importa o que é, — eu disse, minha voz se elevando. — Minha mãe não tem. Ela me criou, ela trabalha, ela paga suas contas. Ela já foi casada.
— Você pode ter Asperger e ainda funcionar...
Enquanto ela falava, me lembrei de uma coisa que ela tinha dito mais cedo.
— Espera, — eu disse, tentando lembrar de como ela tinha se expressado e sentindo minha boca ficar seca. — Mais cedo, você disse que achava que minha mãe tinha feito um trabalho maravilhoso me criando.
— Sim, — ela disse, — e eu estava falando sério...
Minha mandíbula se apertou quando eu me dei conta do que ela estava realmente dizendo e eu a encarei como se a estivesse vendo pela primeira vez. — Mas é porque você pensa que ela é como o Rain Man*( É um filme que tem um personagem autista). Que considerando o problema dela, ela fez um bom trabalho.
— Não... você não entende. Há um espectro de Asperger, de ameno a severo.
Eu mal a ouvi. — E você a respeita pela mesma razão. Mas não é como se você realmente gostasse dela.
— Não, espera.
Eu me afastei e levantei. Subitamente precisando de espaço, caminhei para a grade oposta à ela. Pensei nos seus constantes pedidos para visitá-la... não porque ela queria passar algum tempo com minha mãe. Porque ela queria estudá-la.
Meu estômago deu um nó e eu olhei pra ela. — Foi por isso que você apareceu, não foi?
— O que...
— Não porque gostava dela, mas porque você queria saber se estava certa.
— Não.
— Pare de mentir! — eu gritei.