O som do nome dela trouxe tudo de volta e eu desviei o olhar. — Você sabe que somos boas amigas, né? — Ela não esperou por uma resposta. — Noite passada no hospital, conversamos por horas e eu só queria vir aqui para pedir a você pra não ficar com raiva dela pelo que ela fez. Ela sabe que cometeu um erro e que não era tarefa dela diagnosticar sua mãe. Você estava certa sobre isso.
— Então por que ela não está aqui?
— Neste momento, ela está na construção. Alguém tem que ficar responsável enquanto eu me recupero. E ela também não sabe que eu estou aqui.
Sacudi a cabeça. — Não sei por que fiquei tão maluca, pra começar.
— Porque você não queria ouvir, — ela disse, sua voz quieta. — Eu costumava me sentir do mesmo jeito quando ouvia alguém falar do meu irmão, Alan. Ele é autista.
Olhei pra cima. — Alan é seu irmão?
— Sim, por quê? — ela perguntou. — Giana te contou sobre ele?
— Um pouco, — eu disse, lembrando que até mais do que sobre Alan, ela falou da irmã que tinha sido tão paciente com ele, que a tinha inspirado a se especializar em educação especial.
No sofá, Mari se contorceu quando tocou no machucado embaixo do olho. —E só pra você saber, — ela continuou, — eu concordo com você. Não era tarefa dela, eu disse isso a ela. Lembra quando eu disse que ela era ingênua às vezes? Foi isso que eu quis dizer. Ela quer ajudar as pessoas, mas às vezes não acaba desse jeito.
— Não foi só ela, — eu disse. — Fui eu também. Como eu disse, eu exagerei.
O olhar dela era firme. — Você acha que ela pode estar certa?
Juntei minhas mãos. — Não sei. Acho que não, mas...
— Mas você não sabe. E se for verdade, o que importa, certo? — Ela não esperou por resposta. — Eu já estive lá e fiz isso, — ela disse. — Lembro do que eu e meu pai passamos com Alan. Por um tempo não sabíamos o que, ou se alguma coisa, estava errada com ele. E você sabe o que eu decidi depois de todo esse tempo? Não importa. Eu ainda o amo, e cuido dele e sempre irei. Mas... aprender sobre a situação dele ajudou a facilitar as coisas entre nós. Depois que eu soube... acho que só parei de ficar esperando que ele se comportasse de uma certa maneira. E sem expectativas, achei mais fácil aceitá-lo.
Digeri isso. — E se ela não tiver Asperger? — perguntei.
— Ela pode não ter.
— E se eu achar que ela tem?
Ela suspirou. — Não é assim tão simples, especialmente em casos amenos,— ela disse. — Não é como se você pudesse tirar sangue e fazer um teste. Você tem que chegar ao ponto em que acha que é possível e isso é o mais longe que você chegará. Mas você nunca saberá de certeza. E do que Giana disse sobre ela, eu realmente não acho que muita coisa irá mudar. E porque iria? Ela trabalha, ela criou você... o que mais você poderia esperar de uma mãe?
Considerei isso enquanto imagens da minha mãe passaram na minha cabeça.
— Giana te comprou um livro, — ela disse.
— Não sei onde está, — admiti.
— Está comigo, — ela disse. — Trouxe da casa. — Ela me estendeu a bolsa de papel. De alguma forma o livro parecia mais pesado do que estava na noite anterior.
— Obrigado.
Ela se levantou e eu sabia que nossa conversa estava chegando ao fim. Ela se moveu para a porta mas se virou com a mão na maçaneta.
— Sabe que não tem que ler, — ela disse.
— Eu sei.
Ela abriu a porta, então parou. Eu sabia que ela queria acrescentar mais alguma coisa, mas, me surpreendendo, ela não se virou. — Se importa se eu pedir um favor?
— Vá em frente.
— Não parta o coração da Giana, certo? Eu sei que ela te ama e só quero que ela seja feliz.
Aí eu soube que estava certa sobre os sentimentos da Mariana por ela. Enquanto ela caminhava para o carro, a observei da janela, certa de que ela estava apaixonada pela Giana também.
Coloquei o livro ao lado e saí para umacaminhada; quando voltei para a casa, o evitei novamente. Não posso lhe dizerpor que fiz isso, além de que ele me assustava de alguma forma.