— Comprei uma coisa pra você, — ela disse depois de um tempo. — Espero que você concorde com isso.
— Tenho certeza que está tudo bem, — eu murmurei.
Ela fungou. — Você sabe no que eu estava pensando quando vim aqui? —Ela não esperou por uma resposta. — Estava pensando em nós, — disse. — O modo como nos conhecemos e como nos falamos naquela primeira noite, como você mostrou suas tatuagens e deu o olhar maligno para o Luis. E a sua expressão boba quando fomos surfar pela primeira vez, depois que eu peguei a onda até a costa...
Quando ela parou de falar eu apertei sua cintura. — Tenho certeza que há um elogio aí em algum lugar.
Ela tentou se recuperar com um sorriso trêmulo mas não teve muito sucesso.
— Eu lembro de tudo sobre aqueles primeiros dias, — ela disse. — E o mesmo acontece com o resto da semana. Passar algum tempo com a sua mãe, sair pra tomar sorvete, até mesmo olhar para aquele barco idiota.
— Nós não vamos voltar, — prometi, mas ela ergueu as mãos para me parar.
— Você não está me deixando terminar, — ela disse. — E você não está entendendo. Eu estou dizendo que eu amei cada momento e eu não esperava isso. Eu não vim aqui para isso, assim como não vim aqui para me apaixonar por você. Ou, de uma maneira diferente, pela sua mãe.
Submissa, eu não disse nada.
Ela colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha. — Eu acho sua mãe fantástica. Acho que ela fez um ótimo trabalho criando você e eu sei que você não acha, e...
Quando ela pareceu ficar sem palavras, eu balancei a cabeça, perplexa. — E é por isso que você estava chorando? Por causa de como eu me sinto em relação a minha mãe?
— Não, — ela disse. — Você não estava ouvindo?
Ela pausou como se estivesse tentando organizar seus pensamentos caóticos.
— Eu não queria me apaixonar por ninguém, — ela disse. — Eu não estava pronta para isso. Já passei por isso uma vez e depois eu estava acabada. Eu sei que é diferente, mas você vai partir dentro de poucos dias e tudo isso vai terminar... e eu vou estar acabada novamente.
— Não precisa terminar, — eu protestei.
— Mas vai, — ela disse. — Eu sei que a gente pode escrever e falar ao telefone de vez em quando e podemos nos ver quando você vier para casa de licença. Mas não será a mesma coisa. Eu não vou poder ver suas expressões bobas. Nós não poderemos deitar na praia e observar as estrelas. Não poderemos sentar uma em frente a outra e conversar e dividir segredos. E eu não vou sentir seu braço ao meu redor, como sinto agora.
Desviei o olhar, sentindo um senso crescente de frustração e pânico. Tudo o que ela estava dizendo era verdade.
— Me ocorreu hoje, — ela continuou, — enquanto eu estava olhando as prateleiras na livraria. Fui lá para lhe comprar um livro e quando o encontrei, comecei a imaginar como você reagiria quando eu o entregasse. O negócio era que eu sabia que te veria em poucas horas e então eu saberia e iria ficar tudo bem. Porque mesmo que você estivesse chateada, eu sabia que nós superaríamos porque poderíamos resolver cara a cara. Foi disso que eu me dei conta enquanto estava sentada aqui. Que quando estamos juntas, tudo é possível. — Ela hesitou, então continuou. — Muito cedo isso não vai mais ser possível. Eu soube desde que nos conhecemos que você não ficaria mais de algumas semanas aqui, mas eu não achava que fosse ser tão difícil assim dizer adeus.
— Eu não quero dizer adeus, — eu disse, gentilmente virando seu rosto em direção ao meu.
Abaixo de nós eu podia ouvir as ondas quebrando na madeira.
Um bando de gaivotas passou no céu e eu me inclinei para beijá-la, meus lábios mal roçando os dela. Seu hálito cheirava a canela e menta e eu pensei de novo em voltar pra casa.
Esperando tirar a mente dela de pensamentos tão deprimentes, lhe dei um aperto enérgico e apontei para a bolsa. — Então, que livro você comprou pra mim?
Ela pareceu confusa à princípio, mas depois se lembrou de que tinha mencionado o livro mais cedo. — Ah, sim, acho que é a hora pra isso, né?
Pelo modo como ela disse, eu de repente percebi que ela não tinha me comprado o último Hiaasen(Escritor de estórias de mistério). Esperei, mas quando tentei encontrar seus olhos ela virou.
— Se eu der a você, — ela disse, sua voz séria, — você tem que me prometer que vai ler.
Eu não estava muito certa sobre o que achar disso. — Claro, — eu disse, esticando a palavra. — Eu prometo.