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— É a receita especial da família — disse ela, fingindo estar ofendida. —Mas tenho de ser honesta: foi minha mãe quem fez. Ela trouxe ontem.

— A verdade vem à tona — disse eu.

— Essa é a coisa engraçada sobre a verdade — disse ela. — Ela geralmente aparece. — Ela se levantou, abriu a geladeira e inclinou-se para examinar as prateleiras.

Pensava na aliança em seu dedo e em onde estaria a outra quando ela ergue-se com a tupperware nas mãos. Ela colocou algumas conchas de cozido em uma tigela e colocou no microondas.

— Você quer mais alguma coisa? Que tal pão e manteiga?

— Seria ótimo — eu concordei.

Poucos minutos depois, a refeição foi posta à minha frente e o aroma me fez ter consciência pela primeira vez, do quanto eu estava com fome. Surpreendendo-me, Giana sentou em seu lugar novamente, segurando a taça de vinho.

— Você não vai comer?

— Não estou com fome — disse. — Na verdade, não tenho comido muito recentemente. — Ela tomou um gole enquanto eu dava minha primeira garfada e deixei o comentário passar.

— Você estava certa — disse. — Está delicioso.

Ela sorriu. — Mamãe é uma ótima cozinheira. Seria de imaginar que eu tivesse aprendido também, mas não. Estava sempre muito ocupada. Muito estudo quando era jovem e, ultimamente, muita reforma. — Ela apontou para a sala. — É uma casa velha. Sei que não parece, mas trabalhamos muito aqui nos últimos dois anos.

— Está ótima.

— Você está apenas sendo educada, mas eu agradeço. — Ela sorriu. — Você devia ter visto o lugar quando me mudei. Estava parecido com o celeiro, sabe? Precisava de um telhado novo, mas é engraçado, ninguém pensa no telhado quando está imaginando reformar. É uma daquelas coisas que todo mundo espera ter na casa, mas nunca pensa que um dia terá de trocar. Quase tudo que fizemos entra nessa categoria. As bombas do aquecedor, janelas térmicas, os danos causados por cupins... Foram muitos e longos dias. — Ela tinha uma expressão sonhadora no rosto. — Fizemos a maior parte do trabalho nós mesmos. Como esta cozinha. Sei que precisamos de armários e piso novos, mas, quando nos mudamos, havia poças d’água na sala de estar e nos quartos sempre que chovia. O que podíamos fazer? Tivemos de priorizar, e uma das primeiras coisas foi trocar todas as telhas do telhado. Devia estar quase 40 graus e eu lá em cima com uma pá, arrancando telhas, criando bolhas nas mãos. Mas... Parecia o certo, sabe? Duas pessoas jovens começando a vida, trabalhando juntas para reformar sua casa? Havia uma sensação de... união. Foi a mesma coisa quando fizemos o piso da sala de estar. Deve ter levado duas semanas para lixar e nivelar de novo. Pintamos e envernizamos e, quando finalmente pudemos andar sobre ele, parecia o alicerce para o resto de nossas vidas.

— Você faz parecer quase romântico.

— Foi, de certa forma — ela concordou, colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha. — Mas ultimamente não é tão romântico. Agora, só está ficando velho.

Eu ri inesperadamente, em seguida tossi e procurei um copo que não estava lá.

Ela empurrou a cadeira para trás. — Me deixa pegar um pouco de água para você — ela disse. Ela encheu um copo da torneira e colocou-o diante de mim.

Enquanto bebia, sentia que ela me observava.

— O que foi? — perguntei.

— Não acredito no quanto você está diferente.

— Eu? — achei difícil de acreditar.

— Sim, você — ela insistiu. — Você está... Mais velha.

— Sim, eu sou mais velha.

— Eu sei, mas não é isso. São seus olhos. Eles estão... Mais sérios do que antes. Como se tivessem visto o que não deveriam. Exaustos, por algum motivo.

Não disse nada em resposta, mas quando notou minha expressão, ela abanou a cabeça, envergonhada. — Não deveria ter dito isso. Não imagino o que você passou nos últimos anos.
Dei outra garfada no cozido, pensando em seu comentário.

— Deixei o Iraque — disse. — Estou na Alemanha desde então. Só uma parte do exército fica lá de cada vez, e nos revezamos. Provavelmente vou acabar voltando, mas não sei quando. Esperamos que as coisas se acalmem um pouco ate lá.

— Você já não deveria ter saído do exército?

— Eu me alistei de novo — disse. — Não havia motivo para não fazer isso.

Ambas sabíamos a razão, e ela concordou. — Quanto tempo agora?

— Por mais alguns anos.

— E depois?

— Não tenho certeza. Posso ficar por mais alguns anos. Ou talvez vá para a faculdade. Quem sabe. Posso até me graduar em educação especial. Já ouvi maravilhas sobre a área.

Seu sorriso era estranhamente triste e, por instantes, nenhuma de nós disse nada. — Há quanto tempo você está casada? — perguntei.

Ela ajeitou-se na cadeira. — Vai fazer dois anos em novembro.

— Você se casou aqui?

— Como se eu tivesse escolha. — Ela revirou os olhos. — A minha mãe realmente estava a fim dessa coisa de casamento perfeito. Sei que sou filha única, mas, em retrospecto, teria ficado mais feliz com algo muito menor. Cem convidados teria sido perfeito.

— Você considera isso menor?



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História chegando ao fim....

QUERIDA LARY (gilary)Onde histórias criam vida. Descubra agora