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Quebra de tempo.

Eu estava em casa às cinco e embora não me sentisse queimada do sol, aquela pele europeia do sul novamente o queimado ficou óbvio quando tomei banho.

Meu peito e meus ombros arderam quando a água bateu neles, e meu rosto me fez sentir como se eu estivesse com uma febre baixa. Depois vesti uma bermuda limpa e uma das minhas poucas camisas ultrapassadas relativamente boa que eu tinha, azul clara. Fernanda tinha comprado e jurado que a cor era perfeita pra mim. Enrolei as mangas para cima, então vasculhei meu armário à procura de um antigo par de tênis.

Através da rachadura da porta eu podia ver minha mãe na sua mesa, e me ocorreu que pela segunda noite seguida eu tinha feito outros planos para o jantar. E eu nem tinha passado nenhum tempo com ela esse fim de semana. Ela não reclamaria, eu sabia, mas ainda assim senti uma pontada de culpa. Depois de pararmos de falar sobre moedas, o café da manhã e o jantar eram a única coisa que nós compartilhávamos e agora eu a estava privando até mesmo disso. Talvez eu não tivesse mudado tanto quanto pensava. Eu estava na sua casa e comendo da sua comida e estava para perguntá-la se poderia pegar seu carro emprestado. Em outras palavras, levando minha própria vida e usando-a no processo. Perguntei-me o que Giana diria sobre isso, mas eu achava que já sabia a resposta. Giana às vezes parecia muito com a pequena voz que tinha se instalado na minha cabeça mas nunca se importou em pagar aluguel, e nesse momento, ela sussurrava que se eu me sentisse culpada, talvez estivesse fazendo algo errado.

Resolvi que passaria mais tempo com ela (minha mãe). Era uma saída fácil e eu admiti isso, mas não sabia o que mais fazer.

Quando abri a porta, minha mãe pareceu sobressaltada ao me ver. — Oi mãe, — eu disse, me sentando no lugar de sempre.

— Oi, Lary. — Assim que falou, ela olhou sua mesa e passou uma mão sobre o seu cabelo. Quando eu não disse mais nada, ela se deu conta de que deveria me fazer uma pergunta. — Como foi o seu dia? — ela finalmente me perguntou.

Mudei de posição no meu lugar. — Foi ótimo, na verdade. Passei a maior parte do dia com Giana, a garota de que lhe falei ontem à noite.

— Ah. — Seus olhos se viraram para o lado, se recusando a encontrar os meus. — Você não me contou sobre ela.

— Não?

— Não, mas está tudo bem. Era tarde. — Pela primeira vez ela pareceu se dar conta de que eu estava arrumada, ou pelo menos mais arrumada do que ela já tinha me visto, mas ela não conseguiu se obrigar a me perguntar nada.

Eu dei um puxão na minha camisa, tirando ela do aperto. — É, eu sei, tentando impressioná-la, certo? Vou levar ela pra sair hoje à noite, — eu disse. — Tudo bem se eu pegar o carro emprestado?

— Ah... Tudo bem, — ela disse.

— Quer dizer, você vai precisar dele hoje? Posso ligar pra um amigo ou algo assim.

— Não, — ela disse. Enfiou a mão no bolso para pegar as chaves. Nove entre dez pais as teria jogado; a minha as estendeu para mim.

— Você está bem? — perguntei.

— Só cansada, — ela disse.

Levantei-me e peguei as chaves. — Mãe? — Ela ergueu o olhar novamente. — Me desculpe por não jantar com você nessas últimas noites.

— Tudo bem, — ela disse. — Eu entendo.

O sol estava começando a sua lenta descida e quando eu arranquei com o carro, o céu era um redemoinho de cores suaves que contrastavam dramaticamente com o céu da noite que eu tinha conhecido na Alemanha. O trânsito estava horrível, como sempre em noites de domingo e eu levei quase trinta minutos fumacentos para voltar à praia e estacionar.

QUERIDA LARY (gilary)Onde histórias criam vida. Descubra agora