— Você está muito quieta, — a ouvi falar.
— Desculpe, — eu disse. — Só estava pensando sobre hoje à noite.
— Coisas boas, eu espero.
— É, coisas boas, — eu disse.
Ela mudou de posição no assento e eu senti sua perna roçar a minha. — Eu também. Mas eu estava pensando na sua mãe, — ela disse. — Ela sempre foi como hoje? Meio tímida e desviando o olhar quando fala com as pessoas?
— Sim, — eu disse. — Por quê?
— Só curiosidade, — ela disse.
Alguns metros mais longe, a tempestade parecia estar alcançando seu clímax enquanto outra chapa de chuva caía das nuvens. A água caía de todos os lados da casa como cachoeiras. Um clarão de novo, mais perto dessa vez e o trovão estrondou como um canhão. Se tivesse janelas eu imaginei que elas teriam chacoalhado nas suas molduras.
Giana se aproximou e eu coloquei meu braço em volta dela. Ela cruzou as pernas nos tornozelos e se encostou em mim, e eu senti como se pudesse segurá-la assim para sempre.
— Você é diferente da maioria das pessoas que eu conheço, — ela observou, sua voz baixa no meu ouvido. — Mais madura, menos... Irresponsável, eu acho.
Eu sorri, gostando do que ela disse. — E não se esqueça do meu crew cut e das tatuagens.
— Crew cut, sim. Tatuagens... bem, elas meio que vem com o pacote, mas ninguém é perfeito.
Dei uma cotovelada nela e fingi estar magoada. — Bem, se eu soubesse como você se sente, não as teria feito.
— Não acredito em você, — ela disse, se ajeitando. — Mas me desculpe eu não devia ter dito isso. Estava falando mais em como eu me sentiria fazendo uma. Em você, elas tendem a projetar uma certa... imagem e eu acho que encaixa.
— Que imagem é essa?
Ela apontou para as tatuagens, uma por uma, começando com o caractere chinês. — Essa aqui me diz que você vive a vida pelas suas próprias regras e nem sempre se importa com o que as pessoas pensam. A da infantaria mostra que você tem orgulho do que faz. E o arame farpado... bem, combina com quem você foi quando era mais jovem.
— Esse é bem o perfil psicológico. Eu pensei que era só porque eu gostava das figuras.
— Estou pensando em conseguir um diploma secundário em psicologia.
— Acho que você já tem um.
Embora o vento tivesse começado, a chuva começou a diminuir.
— Você já se apaixonou? — ela perguntou, mudando de marcha de repente.
Sua pergunta me surpreendeu. — Isso veio do nada.
— Me disseram que ser imprevisível ajuda a aumentar o mistério feminino.
— Ah, ajuda. Mas para responder a sua pergunta, eu não sei.
— Como você pode não saber?
Eu hesitei, tentando pensar no que dizer. — Namorei uma garota alguns anos atrás, e na época, eu sabia que estava apaixonada. Pelo menos, era o que eu dizia a mim mesma. Mas agora, quando penso novamente, eu só... não tenho mais certeza. Me preocupava com ela e gostava de passar o tempo com ela, mas quando não estávamos juntas, eu mal pensava nela. Estávamos juntas, mas não éramos um casal, se isso faz algum sentido. — Ela considerou minha resposta, mas não disse nada. Depois de um tempo, me virei pra ela. — E você? Já se apaixonou alguma vez?
O rosto dela escureceu. — Não, — ela disse.
— Mas pensou que estava apaixonada. Como eu, certo? — Quando ela inspirou com força, eu prossegui. — No meu esquadrão, tenho que usar um pouco de psicologia também. E meus instintos me dizem que há um namoro sério no seu passado.
Ela sorriu, mas havia algo triste em seu sorriso. — Eu sabia que você descobriria, — ela disse em uma voz abatida. — Mas pra responder sua pergunta, sim, há. Durante o meu primeiro ano na faculdade. E sim, eu pensei que o amava.
— Tem certeza de que você não o amava?
Ela levou um tempo pra responder. — Não, — ela murmurou. — Não tenho certeza.
A encarei. — Você não tem que me contar...