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Por cima de seus ombros a casa parecia se tornar viva no escuro. Mais pessoas tinham se materializado, o volume da música tinha aumentado, e de vez em quando eu podia ouvir uma risada. Pablo, Nicole e Luis já estavam rodeados por um grupo de jovens bebendo cerveja e parecendo querer mais diversão e a chance de se agarrar com alguém do sexo oposto do que fazer uma boa ação. Ela deve ter notado a minha expressão e seguido o meu olhar.

— Nós só começamos segunda. Eles vão logo descobrir que não se trata só de diversão e jogos.

— Eu não disse nada...

— Não precisou. Mas você está certa. Pra maioria deles é a primeira vez que trabalham com a Habitat, e só estão fazendo pra que tenham alguma coisa diferente para colocar no seu currículo quando se formarem. Não têm ideia de quanto trabalho está envolvido. Mas, no fim, o que importa é que as casas sejam construídas, e elas serão. Elas sempre são.

— Você já fez isso antes?

— Todos os verões desde que eu fiz dezesseis anos. Costumava fazer com a nossa igreja, mas quando fui para Chapel Hill, começamos um grupo lá. Bem, na verdade, A Mari começou. Ela também é de Lenoir. Acabou de se formar e vai começar o mestrado esse outono. Conheço ela desde sempre. Ao invés de passar o verão trabalhando em empregos estranhos em casa ou fazendo estágios, achamos que poderíamos oferecer aos estudantes uma chance de fazer a diferença. Todo mundo racha o dinheiro da casa e paga as próprias despesas pelo mês, e não cobramos nada pelo trabalho que fazemos nas casas. Era por isso que era tão importante eu pegar minha bolsa de volta. Não poderia comer durante todo o mês.

— Tenho certeza que eles não deixariam você morrer de fome.

— Eu sei, mas não seria justo. Eles já estão fazendo algo que vale a pena, e isso é mais que o bastante.

Eu podia sentir meus pés escorregando na areia.

— Por que Wilmington? — Eu perguntei. — Quero dizer, por que vir aqui construir casas ao invés de algum lugar como Lenoir ou Raleigh?

— Por causa da praia. Você sabe como as pessoas são. É muito difícil conseguir que elas cedam seu tempo por um mês, mas é mais fácil se for em um lugar como este. E quanto mais pessoas você tiver, mais você pode fazer. Trinta pessoas se inscreveram esse ano.

Eu assenti consciente de quão perto uma da outra nós caminhávamos. — E você também se formou?

— Não, vou fazer o último ano. E vou me especializar em educação especial, se essa era a sua próxima pergunta.

— Era.

— Eu previ. Quando se está na universidade, é isso que todo mundo te pergunta.

— Todo mundo me pergunta se eu gosto de estar no exército.

— Você gosta?

— Não sei.

Ela riu, e o som foi tão musical que eu sabia que queria ouví-lo novamente.

Alcançamos o fim do píer e eu peguei minha prancha. Joguei a garrafa vazia de cerveja na lixeira, ouvindo-a se chocar com o fundo. As estrelas vinham à tona acima das nossas cabeças, e as luzes das casas alinhadas ao longo das dunas me lembraram luminosas abóboras de Halloween.

— Você se importa se eu perguntar o que te levou a se juntar ao exército? Levando em conta que você não sabe se gosta, quero dizer.

Me levou um segundo pra descobrir como responder àquilo, e eu mudei a prancha de surf pra o outro braço. — Acho que o mais seguro é dizer que, naquele tempo, eu precisei entrar.

Ela esperou eu falar mais, mas quando eu não falei, simplesmente assentiu.

— Aposto que você está contente de estar de volta em casa por um tempo, — ela disse.

— Sem dúvida.

— Aposto que sua mãe está contente também, não é?

— Acho que sim.

— Ela está. Tenho certeza de que tem muito orgulho de você.

— Espero que sim.

— Você fala como se não tivesse certeza.

— Você teria que encontrar minha mãe para entender. Ela não é muito falante.

Eu podia ver a luz da lua refletida em seusolhos escuros, e sua voz era macia quando ela falou. — Ela não precisa falarpara ter orgulho de você. Ela deve ser o tipo de mãe que demonstra isso deoutras maneiras.

QUERIDA LARY (gilary)Onde histórias criam vida. Descubra agora