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Outras vezes, porém, Giana parecia exatamente a mesma pessoa de quem eu me lembrava e demonstrava o quanto ainda gostava de mim. Durante tudo isso, continuei a amá-la com sempre e desejava ardentemente os momentos simples do passado. Eu sabia o que estava acontecendo, claro. Enquanto nos afastávamos, eu ficava cada vez mais desesperada para salvar o que antes havia entre nós; no entanto, como em um círculo vicioso, meu desespero fez com que nos distanciamos ainda mais.

Começamos a discutir. Como na briga que tivemos no apartamento dela durante minha segunda licença, eu não conseguia dizer o que estava sentindo. E, não importava o que ela dissesse, não conseguia deixar de pensar que ela estava me enganando ou nem mesmo tentava diminuir minhas preocupações. Eu odiava esses telefonemas ainda mais do que meu ciúme, mesmo sabendo que ambos estavam interligados.
Apesar de nossas dificuldades, nunca duvidei de que conseguiríamos superar tudo. Eu queria uma vida com Giana mais do que tudo.

Em dezembro, comecei a ligar com mais frequência e fiz de tudo para controlar o ciúme. Forcei-me a ser animada ao telefone, na esperança de que ela gostasse de me ouvir. Pensei que as coisas estivessem melhorando, e aparentemente estavam mesmo. Porém, quatro dias antes do Natal, lembrei a ela que voltaria para casa em pouco menos de um ano. Em vez da resposta animada que eu esperava, ela ficou em silêncio. Ouvia apenas o som de sua respiração.

— Você me ouviu? — perguntei.
— Sim —, disse ela, com voz suave. — É só que já ouvi isso antes.

Era verdade, ambas sabíamos disso, mas eu não dormi direito por quase uma semana.
A lua cheia apareceu na noite de Ano Novo, e embora eu tenha saído para admirá-la e recordar da semana em que nos apaixonamos, essas imagens estavam nebulosas, como se turvas pela tristeza imensa que sentia dentro de mim. No caminho de volta, vi dezenas de homens reunidos em círculos ou apoiados nas paredes dos prédios fumando cigarros, como se não tivessem qualquer preocupação. Gostaria de saber o que pensavam quando me viram passar. Será que perceberam que eu estava perdendo tudo o que importava para mim? Ou que eu desejava mais uma vez poder mudar o passado?
Não sei, e eles não perguntaram. O mundo estava mudando rapidamente. As ordens que esperávamos chegaram na manhã seguinte, e alguns dias depois meu pelotão estava na Turquia onde começamos a nos preparar para invadir o norte do Iraque.

Participamos de reuniões em que nos informaram nossas atribuições, estudamos a topografia, e repassamos planos de batalha. Havia pouco tempo livre, mas quando saímos da base, era difícil ignorar os olhares hostis da população. Ouvimos rumores de que a Turquia planejava negar o acesso às nossas tropas para a invasão e que estavam em andamento as negociações para garantir tal permissão. Há muito tínhamos aprendido a ouvir boatos com desconfiança, mas desta vez os rumores eram preciosos, e meu pelotão e outros foram enviados para o Kuwait para começar tudo de novo.

Desembarcamos no meio da tarde, sob um céu sem nuvens, rodeados de areia por todos os lados. Quase imediatamente fomos para um ônibus e viajamos por horas, acabando no que, essencialmente, era a maior cidade de tendas que já vi. O exército fez o máximo para torná-la confortável. A comida era boa e o posto de trocas tinha tudo o que precisávamos, mas era chato. O correio era ruim, não recebi nenhuma carta e as filas para usar o telefone tinham um quilômetro. Entre treinamentos, meu pessoal e eu nos sentávamos para conversar, tentando adivinhar quando começaria a invasão, ou praticávamos como colocar nossas roupas químicas o mais rápido possível. O plano era que meu pelotão reforçasse outras unidades de diferentes divisões em uma grande ofensiva sobre Bagdá. Em fevereiro, depois do que aprecia um zilhão de anos no deserto, meu esquadrão e eu estávamos a tão prontos com sempre estivemos.

Naquele ponto, muitos soldados estavam no Kuwait desde a metade de novembro e o círculo de rumores estava com toda força. Ninguém sabia o que estava por vir. Eu ouvi sobre armas químicas e biológicas; ouvi que Saddam tinha aprendido sua lição na tempestade do deserto e estava fortificando Guarda Replubicana em Bagdá, na esperança de um último ato de resistência sangrento. Em 17 de março, soube que haveria guerra. Na última noite no Kuwait, escrevi cartas para aqueles que eu amava, para o caso de não sobreviver: uma para minha mãe e uma para Giana. Naquela noite, embarquei em um comboio que se estendia por uma centena de quilômetros até o Iraque.

O combate era esporádico, ao menos inicialmente. Como nossa força aérea dominava os céus, tínhamos pouco a temer enquanto percorríamos, sobre tudo, estradas desertas. O exército iraquiano, em sua maior parte, não estava em lugar algum, o que só aumentava a minha tensão enquanto eu tentava antecipar o que meu pelotão enfrentaria mais tarde durante a campanha. Aqui e ali, ouvíamos falar sobre fogo inimigo, disparados de morteiros, e nós enfiávamos em nossas roupas protetoras apenas para descobrir que era alarme falso. Os soltados estavam tensos. Não dormi por três dias.

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2/3!
Próximo cap vai ser tenso 😬

QUERIDA LARY (gilary)Onde histórias criam vida. Descubra agora