Não Há Cordões em Mim - Pinóquio
O som dos seus próprios passos era agudo e estridente em seus ouvidos; uma agressão aos seus tímpanos, a seu equilíbrio sempre superfluamente elogiado.
Audrey sequer conseguia lembrar porque havia ido até a cantina. Não conseguia. Não depois de vê-lo, não depois de ouvi-lo. As palavras reverberavam sem fazer sentido algum. Sua mente se alternava em blecaute e desordem; escuridão em seus olhos, chiados estridentes em seus ouvidos.
O ar faltou. O corpo gelou.
As lágrimas dominaram seus olhos enquanto seu coração retorcia-se como um trapo, encolhendo-se assim como ela queria se encolher em sua insignificância.
De novo. Humilhada de novo.
Sentiu a pele dele na sua como ácido, uma surpresa dolorosa, uma aflição desenfreada que fez calar mesmo sua mente em surto tamanha a dor; o aperto em seu braço veio como uma violação a mais, ressuscitando um evento similar, outro ser humano, outra agressão, outra decepção.
Sua reação foi imediata. Puxou-se para longe dele agressivamente, não conseguindo evitar os olhos arregalados de medo, muito medo. Jay soltou-a imediatamente e afastou-se um passo; a princesa não viu a dor que sua reação causou.
-Audrey, vamos conversar – mas ela já lhe dera as costas e andava para longe, ignorando completamente o rapaz; de fato quase não o ouvia – Por favor, espere! Audrey! – e colocou-se em frente a ela, correndo e passando a frente para bloquear a passagem; agora cuidadosamente evitando tocá-la.
-Saia – disse apenas; o rosto cabisbaixo, a voz quase inexistente. Ela sentia o coração pulsar de um jeito tão esquisito, tão doloroso que lhe dava um vazio enorme não somente no peito, mas também no estômago.
-Não até que me escute – a firmeza dele a fez dar meia volta e passos rápidos por onde havia seguido. Jay mais uma vez foi mais rápido e mais ágil, voltando a se colocar na frente da garota, bloqueando seu caminho – Escute, por favor!
-Já ouvi o suficiente – disse outra vez lhe dando as costas, recusando-se a olhá-lo. Um turbilhão de sentimentos a sufocava tanto que ela jurava que ouvia a voz dele através de metros e metros debaixo d'água.
Ela daria tudo para se afogar naquele instante.
-Não, não ouviu – insistiu ele, outra vez a frente, agora deixando seu corpo a poucos centímetros do dela. Audrey conseguiu parar antes que colidisse com aquele peito forte onde ela já tinha se apoiado antes, se deixado prender... Precisou abrir a boca para respirar já que sentira que não havia ar em si tamanha angústia – Tenho que explicar o que...
-Eu não quero conversar com você, isto ainda não está claro? – praticamente gritou, pela primeira vez erguendo o olhar até o dele. Duas lágrimas escaparam de seus olhos sem que ela sequer piscasse, mesmo assim o nível de água em seus olhos não baixou, deixando sua vista nebulosa; não viu o recuo do outro atingido como um soco por suas palavras, por suas lágrimas.
Não queria vê-lo. Não queria ouvi-lo. Não queria lidar com ele. Não queria, não conseguia, não aguentaria. Quantas vezes mais ela ainda se exporia ao ridículo de confiar e ser traída? Não queria ouvir mais nada de ninguém.
-Não é o que parece, princesa... Juro que não é o que parece... – insistiu, implorou. E que diferença aquilo poderia fazer na moça que se via em pedaços uma vez mais? Mais lágrimas despencaram dos olhos dela sem que ela piscasse.
-Não mesmo – o humor negro começou a despontar ali em sua voz trêmula; o piscar trouxe outra leva de gotas cristalinas – Foi um erro enorme acreditar que você não seria um manipulador como seus amiguinhos – sua voz falhou de uma forma horrível, num guincho sofrível e choroso.
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Seduzentes
FanficExistem formas diferentes de ser mau. A mais interessante de todas elas é arte da manipulação, sedução... Em todos os sentidos da palavra. "Para que colocar fogo no circo? - pensava Mal - Coloque um isqueiro na mão do macaco..." Claro, é uma delíci...