2.3.9 - PATERNIDADE

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"Well, I'll be damned, here comes your ghost again..." (Joan Baez)

Ally passou o resto daquela noite um pouco silenciosa, mas não era difícil entender. Ele imaginava que ela poderia se fechar na concha. Depois de tantos anos, não era mais tão difícil presumir.

A única coisa que falou foi depois de algum tempo fechada no quarto conversando com a mãe e sair com os olhos inchados e o rosto manchado. Até tentou conversar, brincou com as crianças e as colocou para dormir, não sem antes passar alguns minutos ainda jogando algum joguinho com o Ian. Era um pouco frustrante, mesmo que ele entendesse. Ele havia testemunhado tudo que havia falado, tudo que escutou e abrir mão do orgulho definitivamente nunca havia sido o ponto forte dela. A mão estava dormindo, assim como as crianças, Ally estava tomando banho quando o interfone tocou, por sorte ele estava ao lado, pegando uma cerveja na geladeira (sabendo que assim que saísse, ela iria querer uma e fumar um cigarro na varanda). O nome que o porteiro anunciou era um nome que ele já conhecia, nunca pessoalmente, mas escutou várias vezes.

Era o ex-marido dela.

"O que esse cara quer aqui?" se perguntou depois de dizer que ele desceria, para não deixá-lo subir.

Ainda não estava certo quanto à qualidade de seus conhecimentos no idioma, mas o primeiro pensamento que teve era o mais certo: não deixar aquele homem subir. Não sem saber o que exatamente ele estava fazendo ali.

— Você é o tal do Norman?

— Eu mesmo. Você é o...?

— Você sabe quem eu sou.

— Sei, sim, claro. Então... — levantou as palmas das mãos para cima, esperando ele dizer o que queria.

— Relaxa cara, eu não vim pra causar nenhuma encrenca. Soube por um pessoal que a Ally estava aqui por uns dias, só quero ver o meu filho, como ele está...

— O seu filho...

— Eu nunca disse que não era mais o pai dele.

Norman analisou o homem diante dele por um instante. Não parecia estar mentindo, mas algo no olhar dele foi perturbador, uma característica desagradável. Havia uma espécie de malícia, algo ofídio no olhar, algo que dizia "eu não vou causar encrenca, mas espero que você crie uma para mim".

— Olha, cara... — Norman estava olhando para os lados, coçando o cotovelo, o mesmo tique de sempre quando estava em uma situação desagradável. — Até onde eu soube, você assinou uma emancipação para a Ally levar ele para a minha casa. E desde então, nunca tivemos notícias, você nunca mandou uma mensagem que fosse. Então eu não vejo como você visitá-lo sem deixar a cabeça dele confusa.

— Ele tem que saber quem é o pai verdadeiro dele. — Rosnou com um brilho estranho nos olhos. Estava quase dando para o cara o que ele queria.

— Ele sabe que é seu filho. E perguntou bastante sobre você. O negócio é que....como vou explicar... A Ally sempre fez questão, e eu nunca discordei, que o melhor era nunca mentir pra ele. E ele sabe que não é meu filho, se for isso que você quer saber.

— Olha, muito bom. Fico feliz com isso. Posso subir agora? — Ele subiu os três degraus que davam acesso ao portão, só então Norman percebeu que ele era um pouco mais baixo que ele, mas não muito. Mesmo assim, apesar de não querer nenhum atrito, não parecia certo deixar ele subir, pertubar a Ally que já havia passado por demais por um dia, menos ainda acordar o garoto. Ficou firme onde estava, apenas estendeu um braço impedindo-o de passar ao seu lado.

Problemática- (Sometimes) Bad Can Do You Some Good.Onde histórias criam vida. Descubra agora